Dezenas de milhares de manifestantes pediram nesta terça-feira (3) em várias cidades do Brasil que o Supremo Tribunal Federal (STF) autorize, na sessão desta quarta, a prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a seis meses das eleições presidenciais nas quais ele aparece como favorito.

Só em São Paulo, sete carros de som animavam a multidão concentrada ao longo da Avenida Paulista, no centro da cidade, repetindo “Lula nunca mais” e aclamações ao juiz federal de primeira instância Sérgio Moro, que no ano passado condenou o ex-presidente a nove anos e meio de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A sentença foi confirmada em janeiro pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), uma corte de segunda instância, que elevou a pena a 12 anos e um mês de reclusão.

“Queremos que o Brasil se liberte dessa corrupção vergonhosa, que Lula vá preso, que o Brasil vire a página”, disse, durante a manifestação, a empresária Mara Massa, de 67 anos.

Outras marchas foram celebradas no Rio de Janeiro, em Belo Horizonte e na maioria das capitais de outros estados, a maior parte convocada pelo movimento Vem Pra Rua, que teve um papel ativo nos protestos que acompanharam, em 2016, o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Os partidários de Lula organizaram concentrações em Salvador e um punhado de cidades, mas preparam mobilizações maiores para a quarta-feira, quando o STF decidir se concede ou não a Lula o direito de apelar em liberdade da sentença na terceira instância e, inclusive, no Supremo.

Se o pedido de habeas corpus for aceito pela maioria dos 11 magistrados do STF, o caso pode se arrastar por anos e Lula poderia continuar fazendo pré-campanha. Mas se for rejeitado, o líder do PT, de 72 anos, pode ser preso para começar a cumprir a pena por ter sido beneficiário de um apartamento tríplex no Guarujá, litoral de São Paulo, da empreiteira OAS, envolvida no esquema de propinas da Petrobras.

No clima de hostilidade que se agravou após o disparos efetuados em 27 de março, no Paraná, contra a caravana de Lula pelo sul do país, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) fará desta terça-feira uma vigília em frente à residência de Lula em São Bernardo do Campo, no ABC paulista.

“A condenação do ex-presidente Lula é política, sem nenhuma prova. O presidente é inocente e todos sabem disso. Eles só querem impedir Lula de se candidatar nas eleições deste ano”, declarou o presidente da CUT, Vagner Freitas, em nota, na qual informou que a central fará atos em todo o Brasil.

O comandante do Exército, general Eduardo Villas Boas, escreveu no Twitter que “o Exército Brasileiro julga compartilhar o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade e de respeito à Constituição, à paz social e à Democracia, bem como se mantém atento às suas missões institucionais”.

O general destacou que “nesta situação que vive o Brasil, resta perguntar às instituições e ao povo quem realmente está pensando no bem do País e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais”?

Qualquer que seja a decisão do STF, terá enorme repercussão sobre eleições que se antecipam como as mais indefinidas desde o retorno do país à democracia, em 1985.

“Não é exagero afirmar que este é, provavelmente, um dos julgamentos mais importantes da história do STF porque ele vem na esteira de uma modificação da Constituição brasileira e do novo código de processo civil na expectativa de garantir celeridade ao sistema criminal do Brasil”, afirmou a procuradora-geral da República, Raquel Dodge.

A procuradora-geral se pronunciou pelo respeito à norma que pode levar Lula à prisão. A existência de quatro instâncias de apelação é um “exagero [que] aniquila o sistema de Justiça exatamente porque uma Justiça que tarda é uma Justiça que falha”, disse Dodge durante reunião com juristas em Brasília.

– Pressões –

A sessão do STF começará às 14h desta quarta-feira. A máxima corte terá seu esquema de segurança reforçado. As ruas vizinhas ao prédio serão bloqueadas e serão instaladas cercas e montado um cordão policial para manter os manifestantes separados, informou a Secretaria de Segurança da capital federal.

A pressão sobre os magistrados teve novos capítulos na segunda-feira, quando advogados, juízes e promotores de grupos antagônicos apresentaram ao STF abaixo-assinados separados com milhares de assinaturas defendendo as duas posições contrárias.

Em um ato celebrado na noite de segunda-feira no Rio de Janeiro, Lula mostrou-se confiante. “Não aceitei a ditadura militar e não vou aceitar a ditadura do MP e do Moro”, afirmou.

O aprofundamento dos confrontos levou a presidente do Supremo, ministra Cármen Lúcia, a fazer um incomum apelo pela paz social.

Mas o próprio STF não é alheio à polarização.

O caso confronta juízes “garantistas” e defensores da Operação ‘Lava Jato’, que desvendou a bilionária rede de propinas entre empresários e políticos, que são vistos como mais severos e partidários do uso da prisão preventiva e do cumprimento antecipado das penas.

Divididos, os 11 integrantes do STF debaterão um caso que, embora seja específico, poderá chegar a indicar aos tribunais inferiores uma mudança na interpretação constitucional que permite prender condenados em segunda instância.

A última discussão sobre o tema terminou com um apertado 6 a 5 a favor da jurisprudência em vigor.