Os mexicanos decidem neste domingo (10) se Andrés Manuel López Obrador deixará antecipadamente a presidência ou concluirá seu mandato em 2024, no primeiro referendo da história do país, com previsão de um apoio ao mandatário esquerdista.
“Que ninguém se esqueça de que o povo é quem manda, o povo dá e o povo tira”, disse López Obrador à imprensa antes de votar perto do palácio presidencial.
AMLO, como é conhecido pelas iniciais de seu nome, conseguiu que a consulta fosse incluída na Constituição em 2019, como um antídoto contra “maus governos”.
“Vai nos ajudar a que ninguém em nenhum nível da escala se sinta absoluto”, acrescentou neste domingo o presidente, eleito para um mandato de seis anos.
As urnas abriram às 08h locais (10h de Brasília) e vão fechar às 18h locais (20h de Brasília) na maior parte do país de 126 milhões de habitantes e onde vigoram três fusos horários.
Dezenas de pessoas faziam fila nas seções antes da abertura, constatou a AFP, embora analistas considerem difícil que o referendo alcance o limite de participação para ser vinculante: 37 milhões de eleitores (40% dos habilitados a votar).
Este fato por si só ratificaria no cargo o primeiro presidente de esquerda do país, de 68 anos, e com aprovação de 58%, segundo um consolidado de pesquisas do instituto Oraculus. No México o voto não é obrigatório.
“AMLO, você não está só!”, diziam alguns dos poucos cartazes exibidos na Cidade do México, onde assim como em outras partes do país não há clima de campanha.
“Termine e vá embora!” e “Urnas vazias!”, respondiam nas redes sociais políticos da oposição e usuários que pediam a abstenção, alegando que a consulta é apenas um ato de “propaganda”.
– De olho em 2024 –
Benigno Gasca, matemático e músico de 57 anos, considera que o referendo é uma “oportunidade para mudar o que não vai bem”. “Tem havido presidentes que após serem eleitos pelo povo acabaram servindo a outros interesses”, disse à AFP.
Mas Laura González, professora aposentada de 62 anos, avalia que “é um exercício inútil, dinheiro jogado no lixo”. “Se quem organizou a consulta foi gente dele, que eles vão”, declarou à AFP.
A consultoria em assuntos eleitorais Integralia estima uma participação média de 14,8% dos eleitores. “Prevê-se uma maioria contundente a favor de que López Obrador continue no cargo”, destacou em um relatório.
AMLO acusa o Instituto Nacional Eleitoral (INE) de sabotar o referendo, em cumplicidade com “os conservadores” (como chama a oposição”, razão pela qual anunciou uma reforma para que seus membros e os do tribunal eleitoral sejam eleitos por votação popular e não pela Câmara dos Deputados.
“É categoricamente falso que o INE não tenha cumprido com seu dever de difundir” o referendo, assegurou neste domingo o presidente do organismo, Lorenzo Córdova, que denunciou o “potencial uso de recursos público” por parte da situação para promover a consulta.
O INE instalou 57.500 postos de votação contra os 161.000 de uma eleição federal.
Sem maior risco de abandonar o poder, o presidente poderia aproveitar a consulta para ventilar alguns projetos e “fazer andar a máquina” do partido governista Morena rumo às presidenciais de 2024, avalia a analista política Martha Anaya.
“Será um parâmetro para avaliar a capacidade de mobilização” governista, aposta o Integralia.
No país não há reeleição presidencial, nem ampliação do mandato, e de qualquer forma AMLO tem dito que vai se afastar da política em 2024.
– Horizonte de desafios –
Nos quase três anos que restam de seu mandato, seu projeto de “transformação” tem vários desafios, como a aplicação de uma reforma no setor elétrico, avalizada pela Suprema Corte esta semana, contrariando o desejo de Estados Unidos, Canadá e Espanha, e o dos partidos da oposição PRI, PAN e PRD.
O novo marco, que AMLO espera reforçar com uma reforma constitucional, dá maior peso ao Estado na geração de energia.
Algumas apostas avançam com dificuldade, pois a coalizão do governo – principal força do Congresso – não reúne os votos suficientes para alterar a Constituição e é obrigada a negociar.
López Obrador fundamenta sua aprovação em programas sociais aos quais destina este ano 23 bilhões de dólares (6,4% do orçamento) e políticas como a melhoria do salário mínimo (265 dólares mensais).
Segundo a Coneval, organismo público que avalia as políticas sociais, 44% dos mexicanos vivem na pobreza, um dos males que AMLO se comprometeu a combater, juntamente com a corrupção.
Entre os outros desafios do presidente também estão a persistente violência resultante do crime, que deixou cerca de 340.000 mortos desde 2006, e uma economia impactada pela pandemia, que despencou 8,4% em 2020, recuperou-se 5% em 2021 e que este ano cresceria apenas 3,4%.
A inflação anualizada está em seu maior nível em duas décadas (7,3% em fevereiro).