Em janeiro foi Paul Bocuse, morto aos 91 anos. Era considerado o “cozinheiro do século 20”. Entrou para a história como um dos fundadores da “nouvelle cuisine”, a grande revolução gastronômica protagonizada na década de 1970 por jovens chefs franceses que influenciariam as gerações seguintes, em todo o mundo, ao combinar o rigor da técnica clássica com o uso de ingredientes mais leves, saudáveis e carregados de sabores. Responsável por colocar a cidade de Lyon como referência da alta gastronomia, ele sofria do Mal de Parkinson havia muitos anos. Pouco cozinhava quando sua chama vital finalmente se apagou, mas permanecia como mito das panelas até para seus colegas de ofício — caso do conterrâneo Alain Ducasse, para quem Bocuse não apenas “enobreceu a profissão de cozinheiro” como “pôs um C maiúsculo na palavra Cozinha”. Com Bocuse aprendi que para cozinhar bem é preciso ficar amigo de quem vende a comida que irá para a sua panela, especialmente o peixeiro.
Em junho, o chef americano Anthony Bourdain, então com 61 anos, se enforcou em um hotel em Kaysersberg, na França. Ele havia se tornado mundialmente conhecido por apresentar o programa de televisão “Sem reservas”, para o qual viajava pelo mundo comendo, bebendo e fazendo reportagens fascinantes que retratavam o espírito de cada povo a partir de elementos da cultura gastronômica. Era uma figura encantadora. No Brasil, comeu churrasco, feijoada e pastel de feira, bebeu caipirinha e até surfou no litoral paulista. Era um encanto de pessoa. Com ele aprendi um mantra que desde então tento aplicar no meu trabalho: “planejamento prévio previne performance pobre”.

Na segunda-feira 6, morreu em Genebra o chef francês Joël Roubichon , aos 73 anos. Ele sofria de câncer no pâncreas e passara por uma cirurgia um ano antes. Sua história na gastronomia é incomparável: conquistou o número recorde de 32 estrelas do rigoroso Guia Michelin e o restaurante que leva seu nome foi eleito o melhor do mundo. A fama o levaria a expandir sua marca ao redor do mundo, com filiais de Las Vegas a Tóquio, passando por Nova York, Xangai, Bangcoc. Ao completar 50 anos, Roubichon surpreendeu os admiradores ao fechar as portas do Jamin, onde havia brilhado por mais de uma década. Seu prato mais famoso e celebrado era o purê de batata. Com isso, ensinou ao mundo que elevar o trivial à perfeição pode ser mais trabalhoso — e honesto — que transformar a cozinha em um laboratório de experiências. Mais que receitas, esses chefs deixaram uma lição: cozinhar com alma é acima de tudo um gesto de amor.

Elevar o trivial à perfeição é trabalhoso. Cozinhar com alma é sempre um gesto de amor


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias