Antônio Odivaldo de Souza, o Toninho, começou a praticar a corrida aos 15 anos, em 1977. Era uma espécie de exigência do patrão, um alfaiate que gostava de se exercitar, e requisitava a companhia do jovem funcionário e de um colega de trabalho. Diariamente, o trio se reunia no antigo clube da General Electric, atual Parque Celso Daniel, em Santo André. Mais de quatro décadas se passaram. Toninho iniciou e encerrou uma carreira na indústria de autopeças e continuou se exercitando em provas de 10 quilômetros, meia-maratonas, maratonas e ultramaratonas. Nem mesmo o coronavírus deteve o aposentado.

Desde 21 de março, quando o governador João Doria anunciou que seria decretada quarentena, o ex-metalúrgico praticamente não sai de casa. A tarefa de ir ao supermercado cabe exclusivamente à mulher do aposentado, Patrícia Catissi, que tem 46 anos e não figura em um dos grupos de riscos para o coronavírus.

Bastante ativo, o quase sexagenário, que também pedala e nada, pôde dar continuidade à prática do ioga no interior de sua residência, em Santo André, além de se dedicar a exercícios com cordas, barra, abdominais e flexões. Apesar de manter o tônus muscular em dia, algo começou a incomodá-lo. “Faço parte de diversos grupos de atletas amadores no WhatsApp. Alguns ficavam perguntando se podemos correr na rua, em locais isolados, ou fazer um pedal no meio do mato. Cheguei à conclusão de que essas pessoas não estão entendendo direito a gravidade da situação. Daí quis demonstrar que devemos nos exercitar em casa, evitando o risco. Eu me propus a correr uma maratona em casa, para dar o exemplo. E corri.”

Meticuloso, com o mesmo capricho empregado em seu ofício, de fresador ferramenteiro, montou, aproveitando a garagem e o quintal, um percurso de voltas no formato do número 8, totalizando 60 metros. Calculou que teria de percorrê-lo por 704 vezes. Com a ajuda do aplicativo Strava, que monitora trajetos com auxílio do GPS, cumpriu uma quilometragem até ligeiramente superior à de uma maratona: exatos 42,220km, em 3h47, no sábado de Aleluia.

“Fui aumentando aos poucos a carga de treinos: comecei com 2km diários, subi para 5, 10, 21… Percebi que, por fazer muitas curvas, os joelhos, tornozelo e a coluna lombar eram muito exigidos. Aí fiz diversos exercícios para fortalecer. No dia seguinte à prova, é bem verdade que senti algumas dores, principalmente porque tive de subir dois degraus de 25cm. Mas rapidamente me recuperei.”

A aventura doméstica de Toninho foi filmada pela mulher e narrada pelo filho Rafael Spinelli, que tem no currículo transmissões de eventos esportivos pela Sports Plus, Record News e Rede TV!. Hoje, ele atua como celebrante de casamentos e outros eventos. O vídeo ganhou vida própria nas redes sociais e foi compartilhado até pelo prefeito de Santo André, Paulo Serra (PSDB), atingindo mais de dez mil visualizações.

“Espero, de coração, que as pessoas se conscientizem que não precisam ficar entediadas em casa. Podemos nos exercitar, podemos ler. Tenho a esperança de que as pessoas se cuidem e tenham paciência. Um dia isso vai acabar. Muitos morrerão em decorrência do coronavírus, mas quero que seja o menor número possível. Precisamos levar a sério a necessidade do isolamento social”, diz Toninho, que não se incomoda de ser chamado de maluco. “Gosto de ouvir isso. Significa que estou fazendo algo incomum. Mas maluquice mesmo é se expor ao risco de ser infectado sem necessidade alguma.”