“Se você não botar letra nesta música, ela vai ficar instrumental mesmo”. Foi assim que Milton Nascimento obrigou o amigo Fernando Brant a colocar a letra da canção “Travessia” no início de 1967. Os dois se conheceram no ano anterior no bar que reunia cinéfilos, poetas e músicos no centro de Belo Horizonte. Cabeludo, hippie, leitor de García Lorca e louco por música, Brant (1946-2015) levava a coleção de discos para impressionar a turma, que ficaria conhecida como Clube da Esquina. Iniciou com “Travessia” a parceria com Bituca, apelido de Milton, que resultou em mais de 200 canções. Milton enviava fitas cassete a Brant, que compunha versos afetado pelas melodias. “O resultado eram imagens psicodélicas, surrealistas e cubistas”, diz o músico e produtor Robertinho Brant, sobrinho de Fernando. Para festejar 50 anos de carreira de Fernando, Robertinho produziu o álbum “Vendedor de Sonhos” (Biscoito Fino). O resultado está em 20 clássicos interpretados tanto por jovens como companheiros do letrista. O álbum foi quase todo gravado em Belo Horizonte, com arranjos que evocam o estilo Clube da Esquina, acústico, discreto e simples — modelo que ficou conhecido como MPB.

Em busca da pureza

Robertinho Brant diz que perseguiu a pureza exibida no primeiro disco “Clube da Esquina”, de 1972. Robertinho tinha 5 anos quando viu o movimento explodir —e uma foto dele menino figura nas fotos do álbum duplo. “Eles gravaram com dois canais”, conta. “Hoje temos 80 canais à disposição. Tentei editar o material sonoro com o sabor da época.” Entre os cantores, destacam-se Milton Nascimento (“O medo de amar”), Djavan (“Milagre dos peixes”) e Roberta Sá (“Ponta de Areia”).