André Fernandes (PL) foi derrotado por Evandro Leitão (PT) no segundo turno da eleição para a prefeitura de Fortaleza.

+Vitória de Evandro em Fortaleza faz do Ceará principal base do PT

Mesmo com o revés, o jovem aliado de Jair Bolsonaro (PL) ficou a apenas 10.838 votos do prefeito eleito depois de entrar em uma disputa com forças políticas relevantes da cidade. Neste texto, o site IstoÉ explica porque o embate projetou André como uma liderança da direita para as próximas eleições.

Em reduto inimigo

Fortaleza é governada há duas décadas por partidos de esquerda, com Luizianne Lins (PT, de 2005 a 2013), Roberto Cláudio (PDT, de 2013 a 2020) e, por fim, José Sarto (PDT), derrotado no primeiro turno desta eleição.

A popularidade do campo na cidade tem sido refletida nas eleições presidenciais, com vitórias de Dilma Rousseff (PT) com 67,95% dos votos no segundo turno de 2014, contra Aécio Neves (PSDB), de Fernando Haddad (PT) contra Bolsonaro em 2018, com 55,61%, e do presidente Lula (PT) contra seu antecessor, em 2022, com 58,18% dos votos.

Mesmo com derrota em Fortaleza, André se projeta como líder bolsonarista para próximas eleições
O governador Elmano de Freitas (PT): representante de um forte grupo político do Ceará, agora desafiado pela direita radical

Ao ganhar terreno entre os eleitores, a direita radical aposta na reversão desse favoritismo. Além de candidaturas presidenciais, o grupo busca formar maioria no Senado — caminho para aprovar o impeachment de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) — e conquistar governos estaduais, o que passa diretamente pelo ganho de terreno nas eleições municipais.

Representando o campo, Capitão Wagner (União Brasil) liderou a eleição para governador na capital em 2022, mas viu Elmano de Freitas (PT) vencer em 178 cidades e se eleger ainda em primeiro turno, o que manteve o grupo de Camilo Santana (PT), hoje ministro da Educação de Lula, no poder.

Mesmo sem faturar a capital, a oposição estadual teve vitórias de Roberto Filho (PSDB) em Iguatu e Glêdson Bezerra (Podemos) em Juazeiro do Norte e conta com a projeção de André para consolidar um grupo capaz de fazer frente ao petismo na disputa estadual de 2026.

“Até a década de 1990, havia um predomínio de oligarquias da direita, herdeiras da ditadura militar, em prefeituras do Nordeste. Esse movimento parece estar sendo retomado”, afirmou Renato Dorgan, cientista político e presidente do instituto de pesquisas Travessia, ao site IstoÉ.

Nova liderança

Para além dos planos eleitorais em território cearense, a disputa parelha fortaleceu diretamente André, que tem 26 anos, como uma nova liderança do bolsonarismo, nacionalmente abalado pela inelegibilidade do ex-presidente. Popular nas redes sociais, ele se tornou deputado estadual em 2018 e, no pleito seguinte, foi o deputado federal mais votado do Ceará.

Nos dois cargos, manteve a fidelidade às premissas da direita radical: compartilhou notícias falsas a respeito da pandemia de covid-19, fez discursos vorazes contra o STF (Supremo Tribunal Federal) e virou investigado pela corte por suspeita de incitar os atos criminosos de 8 de janeiro.

Depois de fazer comícios ao lado de Bolsonaro e garantir o voto desse campo no primeiro turno, André não abriu mão da ideologia, mas demonstrou entrada constante nas periferias da cidade, evitou declarações espinhosas e conseguiu ampliar o arco de alianças para além da direita no segundo turno.

Capitão Wagner (União), à esquerda, e Roberto Cláudio (PDT), à direita: apoios relevantes para André Fernandes (PL), no centro | Reprodução/Redes sociais
Capitão Wagner (União), à esquerda, e Roberto Cláudio (PDT), à direita: apoios relevantes para André Fernandes (PL), no centro

Após ganhar o apoio de Capitão Wagner, o político deu palanque ao popular ex-prefeito Roberto Cláudio, que participou de sua propaganda eleitoral e de agendas de rua — à revelia da direção nacional do PDT –, ganhou apoio de seis dos oito vereadores do PDT e de parlamentares de outros seis partidos na capital — sua chapa tinha apenas o PL.

Para a cientista política Monalisa Torres, professora de teoria política da UECE (Universidade Estadual do Ceará), mesmo com a derrota nas urnas, André conseguiu “sinalizar a um eleitor que está além da direita”.

Camila Rocha, cientista política e pesquisadora do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), acrescentou que o político tem potencial para conquistar uma “certa autonomia em relação a Bolsonaro” para “despontar como uma nova liderança do campo”.

Na comparação com a esquerda, a direita radical impõe menos ‘pedágios políticos’, o que permite consolidar uma ascensão mais rápida. Evidentemente, André mobilizou o apoio do ex-presidente e os elementos simbólicos do bolsonarismo, mas construiu marcas próprias na campanha. Não foi um ‘candidato fantasma’ do padrinho”, afirmou a pesquisadora ao site IstoÉ.

“Na prática, os resultados de domingo demonstram que há, na prática, um fortalecimento da direita e um enfraquecimento da esquerda no país. Por sua força popular, Lula e Bolsonaro dividiram a população em 2022, mas não há uma polarização definitiva na preferência do eleitor”, disse Renato Dorgan.