02/12/2021 - 16:59
Cerimônia das Forças Armadas em Berlim marca o fim dos 16 anos da era Merkel. Democrata-cristã é apenas a terceira chanceler federal alemã a receber a homenagem militar, a mais importante concedida a civis no país.Embora ainda permaneça no comando interino da Alemanha até a posse oficial de seu sucessor, o social-democrata Olaf Scholz, a chanceler federal Angela Merkel recebeu honras militares nesta quinta-feira (02/12), em cerimônia de despedida do cargo que ocupou ao longo de 16 anos.
As Forças Armadas alemãs (Bundeswehr) realizaram em Berlim a chamada Großer Zapfenstreich, a cerimônia militar mais importante do país, que inclui uma procissão de soldados com tochas, orquestra e marcha militar e que se tornou uma espécie de ritual de despedida não oficial para ministros da Defesa, presidentes e chanceleres federais da Alemanha.
Em um breve e sincero discurso, Merkel agradeceu aos alemães e pediu-lhes que encarem a vida com o “coração leve” e que sejam otimistas em relação ao futuro do país.
“Dezesseis anos como chanceler federal da Alemanha foram repletos de acontecimentos, muitas vezes bastante desafiadores – como política e como ser humano”, afirmou.
Segundo ela, as múltiplas crises que vivenciou mostraram a importância da cooperação internacional para enfrentar os desafios que o mundo impõe.
A chanceler federal acrescentou que os últimos dois anos de pandemia em particular mostraram “quão importante é realmente a confiança nos líderes políticos, na ciência e no discurso público”.
Ela fez um apelo a favor da defesa da democracia contra o ódio, a violência e a desinformação. Segundo a líder alemã, onde quer que o conhecimento científico seja negado e teorias da conspiração sejam disseminadas, deve haver oposição firme.
“Nossa democracia também vive do fato de que, quando o ódio e a violência são considerados um meio legítimo de impor os próprios interesses, nossa tolerância como democratas deve encontrar seu limite”, disse a chefe de governo.
Além disso, a democracia se baseia também “na solidariedade e na escuta mútua”, afirmou. “Gostaria de encorajá-los a, no futuro, olharem para o mundo a partir da perspectiva de outras pessoas também”, concluiu.
Local histórico
Quando eleita em 2005, Merkel se tornou a primeira chanceler federal do país nascida na antiga República Democrática Alemã (RDA). E agora se torna também a primeira chefe de governo da Alemanha pós-guerra a ter sua cerimônia de despedida em Berlim.
Para o evento, Merkel escolheu o complexo Bendler Block do Ministério da Defesa. É um lugar repleto de história. Construído em 1914 para servir como um escritório para a Marinha Imperial Alemã, o complexo foi ampliado pelos nazistas e se tornou o quartel-general de um grupo de militares alemães que tentou derrubar Adolf Hitler do poder em 20 de julho de 1944.
Os líderes da conspiração acabaram sendo executados no pátio, onde hoje há um memorial à resistência alemã ao regime nazista. Desde 1993, o complexo funciona como sede secundária do Ministério da Defesa da Alemanha.
Terceira chefe de governo a ganhar cerimônia
O ritual militar Großer Zapfenstreich é uma tradição que remonta ao militarismo prussiano no século 16. A cerimônia é realizada diversas vezes todos os anos, majoritariamente na despedida de militares de alta patente. Após a Segunda Guerra, com a criação da República Federal da Alemanha em 1949, os presidentes do país foram incluídos entre os homenageados.
Chanceleres federais passaram a ser honrados somente após a Reunificação da Alemanha, em 1990. Portanto, Merkel é apenas a terceira chefe de governo do país a receber uma Großer Zapfenstreich.
Helmut Kohl, chanceler democrata-cristão de 1982 a 1998, foi o primeiro. Como palco, ele escolheu a Catedral de Speyer, um patrimônio mundial da Unesco localizado no estado da Renânia-Palatinado – e onde também ocorreu seu velório em 2017. O segundo foi o social-democrata Gerhard Schröder, chefe de governo de 1998 a 2005, que optou por ter a cerimônia em sua cidade natal, Hannover.
A cerimônia oferece ao chanceler federal cessante a oportunidade de discursar. Kohl exacerbou a oportunidade ao máximo – o democrata-cristão falou por 13 minutos sobre a história alemã e europeia, o dom da paz e da liberdade e a importância do alistamento obrigatório (abolido em 2010). O social-democrata Schröder recusou a oportunidade de fazer um discurso.
Escolha surpreendente de canções
Desde que o governo e o Parlamento alemão se mudaram em 1999 de Bonn para Berlim, a música – e não os discursos – tornaram-se os elementos mais memoráveis. As personalidades homenageadas podem escolher três músicas a serem tocadas pela banda militar – e não precisam ser marchas. Nos últimos anos, as autoridades alemãs variaram de jazz a rock nas solicitações.
As escolhas de Merkel foram nitidamente germânicas, mas receberam considerável atenção devido à distinção que pareciam fazer da mulher por trás da política. Merkel escolheu três canções: um hino cristão do século 18, provavelmente um aceno à sua legenda, a União Democrata Cristã (CDU); uma canção popular da década de 1960 que fala sobre sonhos e ambições adolescentes; e – surpreendentemente – uma música do ícone punk da Alemanha Oriental Nina Hagen.
A cerimônia militar tem duração de cerca de 20 minutos. Após a execução do hino nacional, os soldados partem ao som de tambores, despedindo-se da chanceler federal e encerrando, assim, mais um capítulo da história alemã.