CRIATIVIDADE A Isa Amaro Joias lançou segunda marca com peças mais lúdicas (Crédito:Divulgação)

As joias sempre foram símbolo de poder econômico e social, independentemente da época. No Egito, faraós enchiam o túmulo de peças de ouro para serem protegidos pelos deuses. Na Europa, padres, reis e burgueses ostentam anéis, cordões e coroas valiosas até hoje. No Brasil, em outro extremo social, até os chefões do tráfico usam pesadíssimas correntes douradas no pescoço. O tempo, as circunstâncias e os personagens mudam, mas as joias continuam objetos de desejo dos consumidores, até mesmo durante a pandemia do coronavírus. Em 2021, o mercado de joias acumulou alta de 20% na receita, segundo dados do Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos. Faturou US$ 4,5 bilhões. As importações também subiram 5%, chegando a US$ 64,5 milhões, de acordo com o Ministério da Economia. Mas especialistas dizem que isso tem a ver principalmente com o encolhimento do turismo. Sem possibilidade de viajar, o dinheiro correu para as joalherias.

ENCOMENDAS Pequenas oficinas, como a de Luciano Xavier, tiveram fila de espera (Crédito:Wanezza Soares)

“O meu maior concorrente são as viagens”, diz Emar Batalhia, proprietária da joalheria homônima. “Quando os clientes comprometem o cartão de crédito para fazer turismo, sobra menos para as joias, o que não ocorreu no último ano.” A grife é conhecida pelas peças coloridas, exóticas e grandes de design. Uma das marcas registradas da joalheria é o trabalho de patchwork com pedras preciosas presente em pulseiras e colares. Ao contrário da roupa, dos acessórios e dos carros, as joias são atemporais. “Elas não perdem o valor, nem saem de moda na próxima temporada”, diz. Enquanto a atividade turística teve um prejuízo de R$ 463,8 bilhões na pandemia, a indústria joalheira teve lucro. Na loja de Emar, o tíquete médio – gasto médio dos clientes nas compras –, subiu de R$ 15 mil para R$ 25 mil.

“Elas não perdem valor e não saem de moda na próxima temporada” Emar Batalhia, proprietária de joalheria

O mercado de luxo continuou a crescer durante a pandemia em geral. O balanço da LVMH, controladora de marcas como Louis Vuitton (roupas e acessórios), Moet & Chandon (champanhe) e Sephora (maquiagem), é um bom exemplo do que acontece nesse mercado. O grupo teve um lucro líquido duas vezes e meia maior em 2021, mas joias e relógios foram responsáveis pela maior parte do aumento da receita, 167%. Há um ano, a LVMH comprou a Tiffany, ícone das joalherias de luxo do mundo, por US$ 15,8 bilhões, um acordo considerado recorde no mercado de luxo, para fortalecer-se no segmento e aumentar o poder de fogo contra concorrentes como Cartier.

Essa movimentação, no entanto, não significa mais consumo necessariamente. “Parte do aumento da receita é um repasse da elevação do preço da grama do ouro, do dólar e da inflação. Por isso, o faturamento cresce e o tíquete médio de compras também”, diz Kelly Amorim, sócia na joalheria que leva o nome da irmã Carla Amorim, há 27 anos no mercado. Com itens mais clássicos e delicados, a joalheria tem uma imensa lista de consumidores famosos, que vai da modelo Gisele Bundchen à atriz Marina Ruy Barbosa. “Não vi um aumento real de clientes e de produtos. Na minha percepção, conseguimos atravessar os dois últimos anos sem perder negócios, o que é diferente”, diz Kelly. Para isso, a grife investiu em novos canais de vendas, em marketing digital e no estreitamento de laços com o consumidor pelas redes sociais. A maior parte do atendimento da loja acontece pelo WhatsApp. Apenas o negócio é fechado pessoalmente.

Com o tíquete médio um pouco mais baixo, R$ 6,5 mil, Isa Amaro Joias, especializada na confecção de peças exclusivas, teve tão bons resultados na pandemia que lançou a segunda marca, a K.Stockler, com menos pedras e mais formas em 2021. “Os resultados foram 27,6% mais altos do que esperávamos”, diz Isa. “Quando começou a pandemia, fiquei preocupada, mas as vendas continuaram em bom ritmo, o que me animou a desenvolver uma grife mais criativa.” Ela explica que durante a pandemia, no ateliê, uma cliente disse que precisava estar rodeadas de coisas mais bonitas e com boa energia para compensar a tristeza provocada pela doença. “Essa consumidora em especial gastou muito mais em joias, como se fosse uma forma de conforto da alma”, conta. Até mesmo oficinas menores e mais simples, do centro de São Paulo, registraram aumento de volume de trabalho. Pequenos ourives, como Luciano Xavier, que atende por encomenda, diz nunca ter trabalhado tanto como em 2021. “No fim do ano, eu tinha fila de espera de clientes, que só comecei a atender agora em fevereiro deste ano”, afirma.