ERNO SCHNEIDER Pelé e Garrincha no aeroporto de Madri: viagem da seleção brasileira, em 1966 (Correio da Manhã/Arquivo Nacional) (Crédito:Divulgação)

Há imagens que valem por mil palavras, mas outras possuem um valor ainda maior: são cenas que traduzem a realidade de maneira poética e contundente.

É o caso de registros feitos por grandes fotojornalistas, profissionais da imprensa cujos olhos enxergam não apenas a beleza estética de uma determinada situação, mas seu contexto histórico.

O Instituto Moreira Salles (IMS) acaba de inaugurar um site dedicado exclusivamente a essa atividade: um acervo gratuito aberto a todos os brasileiros que ajuda a explicar os fatos que marcaram o País nas últimas décadas.

ÍSIS MEDEIROS Mobilização Nacional Indígena: integrante do Acampamento Terra Livre no Congresso Nacional, em 2019 (Crédito:Isis Medeiros)

O portal Testemunha Ocular reúne fotógrafos de diversas gerações e regiões brasileiras. Traz ainda galerias, artigos e depoimentos em vídeo com os bastidores das cenas retratadas. O projeto é criação de Flávio Pinheiro, superintendente-executivo do IMS entre 2008 e 2020. Segundo o jornalista, a ideia surgiu em 2016, quando a entidade adquiriu o acervo fotográfico dos Diários Associados, grupo fundado pelo empresário Assis Chateaubriand e que chegou a ser um dos maiores conglomerados de mídia do País. “Essa área do jornalismo brasileiro merecia um espaço nobre e à altura de sua relevância”, afirma Pinheiro. “É o registro de uma memória que vem do passado e chega ao presente.” A seleção para os nomes da seção Em Foco, que reúne 44 fotógrafos de idades e trajetórias distintas, foi feita a partir de indicações dos próprios profissionais.

“Orlando Brito foi um dos que mais nos ajudaram nessas escolhas.” Brito, que atuou ao longo de mais de cinco décadas revelando os bastidores do poder em Brasília, faleceu esse ano – assim como Erno Schneider, outro homenageado pelo site, famoso pela popular foto de Jânio Quadros com os pés tortos. Outros veteranos, entre eles Reginaldo Manente e Rosa Gauditano, dividem o espaço virtual com jovens em ascensão, caso de Gabriela Biló, Felipe Dana e Victor Moriyama. Segundo Pinheiro, foram os próprios autores quem escolheram as vinte fotos que compõem suas respectivas galerias. “Eles tiveram liberdade total.”

EVANDRO TEIXEIRA João Butão e seus cabritos: registro feito em Canudos, Bahia, em 1994 (Acervo IMS) (Crédito:Divulgação)

Bastidores da profissão

O site será atualizado em datas comemorativas. O próximo especial exibirá imagens da conquista brasileira na Copa do Mundo de 1962, no Chile, que completa 60 anos. Há uma área fixa que deve despertar a atenção do público em geral: entrevistas em vídeo em que os fotógrafos contam os bastidores de seu trabalho. José Francisco Diorio, por exemplo, revela como foi parar na favela do Buraco Quente, onde o registro de um incêndio o levou a vencer o prêmio World Press Photo, em 2005. Fotógrafos IMS traz os acervos de seis lendas brasileiras: José Medeiros, Luciano Carneiro e Henri Ballot, que trabalharam na lendária revista Cruzeiro, além de Evandro Teixeira, Custodio Coimbra e Walter Firmo, cuja obra está em cartaz no IMS Paulista. A última área fixa é batizada simplesmente de Fotos Históricas e contém artigos produzidos por acadêmicos e escritores. A historiadora Ynaê Lopes dos Santos, autora de Racismo Brasileiro: Uma História da Formação do País, assina texto sobre uma foto de Luiz Morier de 1982, quando homens negros foram amarrados pelo pescoço durante uma batida policial no Rio de Janeiro. Essa é a importância do fotojornalismo: ele não nos deixa esquecer os fatos que retratam a realidade em que vivemos.