Depois de o Rio Grande do Sul tentar pressionar o presidente Michel Temer a acelerar o trâmite do plano de recuperação fiscal do Estado, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, deu um recado claro ao governo gaúcho: há o interesse de ajudar e aprovar a adesão, “desde que cumpra a lei”. “A lei da Recuperação Fiscal é clara. Temos que segui-la para evitar questionamentos jurídicos”, alertou o ministro, que participou de dois eventos com a presença do governador do RS, José Ivo Sartori, e do secretário estadual de Fazenda, Giovani Feltes.

Como mostrou o Broadcast, serviço de notícias em tempo real do Grupo Estado, o Rio Grande do Sul pediu a abertura pela Advocacia-Geral da União (AGU) de uma Câmara de Conciliação e Arbitragem, com o objetivo de acelerar sua adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF). A Câmara vai intermediar pontos que são divergência entre o governo estadual e o Tesouro Nacional. O principal desentendimento é a forma de contabilização das despesas com pessoal, hoje subestimadas pelo governo gaúcho, o que ironicamente impede a adesão do Estado ao socorro. Sem aderir, o RS não pode contratar novos empréstimos, necessários para pôr as contas em dia.

Mesmo pagando salários de forma parcelada e tenha mais servidores aposentados do que em atividade, o Rio Grande do Sul não atende a uma das exigências para aderir ao RRF: ultrapassar 70% da Receita Corrente Líquida (RCL) com pagamento de pessoal e serviço da dívida. O Estado só admite de forma oficial um comprometimento de 57,98%, embora técnicos do próprio quadro gaúcho admitam nos bastidores que esse número não reflete sua real situação financeira.

Segundo apurou o Broadcast, o governo gaúcho quer que o Tesouro reconheça que, se não fosse a renegociação da dívida dos Estados feita no ano passado (que reduziu a zero os pagamentos das parcelas até o fim do ano passado), o Estado teria sim ultrapassado os 70% da RCL. Também quer descontar medidas atípicas, como a venda do direito de gestão de sua folha de pagamentos, que inflou a receita corrente líquida de 2016, contribuindo para reduzir o porcentual.

O Rio Grande do Sul quer evitar a todo custo uma revisão nos dados de gastos com pessoal porque isso teria duas implicações. A primeira delas é o acionamento de todas as sanções previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) em caso de ultrapassagem do limite de gasto de 60% da RCL com pessoal, que inclui a redução de despesas com cargos em comissão e funções de confiança, bem como exoneração de servidores não estáveis. A segunda é que o governo gaúcho bateria de frente com o Tribunal de Contas do Estado (TCE).

Pelas contas do Rio Grande do Sul, o gasto com pessoal está em 52,95% da RCL, ou seja, dentro do limite. Na visão do Tesouro Nacional, esse porcentual é bem maior, de 69,38%.

“Nosso interesse é ajudar o Rio Grande do Sul, desde que se cumpra a lei”, avisou Meirelles nesta sexta-feira. Quando questionado sobre a possibilidade de atender ao pedido do governo gaúcho por um “cálculo alternativo” que permitisse sua adesão ao regime, ele ressaltou que a lei que cria o RRF é bastante clara sobre os critérios.

Como mostrou o Broadcast, diante da posição dura do Tesouro Nacional, a pressão política tem crescido do lado do Estado. Na última quarta-feira (8), Sartori viajou a Brasília parar entregar uma proposta de pré-acordo de adesão ao regime nas mãos do presidente Michel Temer. O gesto foi visto como um atropelo sobre a equipe econômica, que vinha até então conduzindo as negociações com o Estado. A percepção na área econômica do governo é de que o Rio Grande do Sul não quer ceder, mas ao mesmo tempo quer levar todos os benefícios do RRF.