Medo venceu a cultura nascente de protestos em Cuba

Medo venceu a cultura nascente de protestos em Cuba

A marcha opositora de 15 de novembro em Cuba foi frustrada pelo temor de uma possível repressão do governo, que isolou muitos ativistas em suas casas. Mas, segundo dissidentes, também se deve a uma cultura muito nova de protestos na ilha.

Manuel Cuesta Morúa, um veterano opositor de 58 anos, saiu de sua casa, na segunda-feira (15), em Havana, para se juntar à marcha, mas não foi muito longe. De imediato, foi detido por policiais que já o esperavam.

Libertado na madrugada de terça, Cuesta considera que houve “certo improviso” no planejamento.

“Por mais difícil, perigoso e incontrolável” que seja uma manifestação pacífica “frente ao poder concentrado da violência no Estado”, a organização exigia “mais planejamento estratégico”, disse o opositor à AFP.

As manifestações maciças contra o governo “têm apenas quatro meses de idade em Cuba, e ainda são muito novas para que se queira chegar ao céu”, lamentou Cuesta Morúa.

A convocação do grupo Archipiélago para exigir a libertação dos presos políticos surgiu após as históricas manifestações de 11 de julho, que deixaram um morto, dezenas de feridos e 1.270 detidos, dos quais 612 seguem presos, segundo a ONG Cubalex.

– ‘Ponto final’ –

A marcha de segunda não contou com o efeito surpresa das manifestações espontâneas de julho, pois vinha sendo convocada desde meados de setembro pelo grupo Archipiélago.

O anúncio antecipado resultou em “pelo menos 100 detenções arbitrárias e 131 pessoas bloqueadas em suas casas pela polícia”, e com manifestações de “repúdio” de simpatizantes do governo contra dissidentes, segundo o grupo opositor Cuba Decide.

O líder do Archipiélago, o dramaturgo Yunior García, foi impedido de fazer uma manifestação solitária no domingo, depois que agentes do Estado sitiaram sua casa. Desde então, não se sabia o seu paradeiro, já que ele não foi mais encontrado em sua casa.

Hoje, veio a confirmação de que Yunior deixou o país. “Confirmamos que chegaram [à Espanha] ele e sua esposa, com vistos de turista”, disseram à AFP fontes do governo espanhol, sem oferecer mais detalhes.

Na segunda-feira, as ruas de Havana amanheceram com um forte dispositivo policial, com agentes posicionados em lugares estratégicos da cidade.

“Ninguém saiu para marchar” porque existe “medo e repressão”, disse Adrián Fonseca, um cabeleireiro de 33 anos.

Ele considera que as sentenças de até 30 anos solicitadas pelos promotores contra os manifestantes detidos nos protestos de julho também “colocaram um ponto final no assunto”.

Já Karla Amanda, uma educadora de 22 anos, afirma que os jovens não aderiram à convocação porque não se identificam com o grupo Archipiélago.

“Quero mudanças também, porque sou jovem e quero algo novo, algo bom para o meu país”, mas eles [do Archipiélago] “não estão propondo nenhuma solução nem têm apoio”, frisou.