Depois do pânico veio a reação. Parlamentares estão se articulando na Câmara dos Deputados e no Senado para limitar a ação da Justiça e das operações policiais contra deputados e senadores, seja em casos de busca e apreensão, seja, sobretudo, quando ocorrerem pedidos de prisão.

A movimentação é reflexo das investigações que a PF desenvolveu contra dois deputados, ambos do PL do Rio de Janeiro: Carlos Jordy e Alexandre Ramagem, este último acusado de comandar um esquema de espionagem ilegal. Os dois deputados bolsonaristas foram alvo de busca e apreensão de documentos e equipamentos eletrônicos em investigações distintas.

• Ramagem é acusado de liderar uma organização criminosa que usava a estrutura da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para espionar adversários políticos e blindar os filhos de Bolsonaro das acusações de corrupção que vinham enfrentando.

• Jordy, líder da oposição na Câmara, foi alvo de busca e apreensão no seu gabinete no Congresso e em sua residência em Niterói, na região metropolitana do Rio, dentro da investigação da Operação Lesa Pátria, por ter envolvimento com os atos antidemocráticos realizados após a derrota de Bolsonaro nas eleições de 2022.

Medo da Justiça acende alerta entre parlamentares; pode vir PEC por aí
(Valter Campanato/Agência Brasil)

Em um primeiro momento, deputados federais de oposição buscam assinaturas para elaborar e votar com urgência uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para limitar ações contra parlamentares.

A proposta mais avançada é a do deputado Rodrigo Valadares (União Brasil-SE), que estabelece que qualquer ação judicial ou policial contra deputados e senadores só pode ocorrer mediante autorização expressa da Mesa Diretora da respectiva Casa, que teria dez dias para analisar o pedido.

“Quaisquer ações judiciais, mandados de busca e apreensão e investigações realizadas contra deputados e senadores a partir da expedição do diploma legal, serão realizados mediante aprovação da Mesa Diretora da respectiva Casa Legislativa, exceto nos casos de flagrante delito”, diz trecho da proposta.

Para que haja a tramitação da PEC, são necessárias 171 assinaturas na Câmara, e Valadares afirma ter conseguido até agora apenas 55.

Mandato protegido

O argumento do deputado sergipano faz eco às queixas de “perseguição política e judicial” dos aliados de Jair Bolsonaro. Nas conversas com os deputados para obter as assinaturas, o parlamentar justificou que a PEC é uma alternativa para “proteger” os parlamentares contra “repetidos abusos cometidos pelo Poder Judiciário”.

Ele tem declarado que é preciso “frear esse desrespeito com o Parlamento, que, por vezes, evidencia perseguição a alguns parlamentares”. Valadares nega que o texto tenha sido feito “sob encomenda” para evitar novas investidas policiais contra o entorno dos Bolsonaros.

Um outro movimento, mais sutil, diz respeito a processos judiciais contra parlamentares e que ainda está em gestação. Segundo articulações parlamentes, também com origem na oposição, a ideia é que haja algum tipo de limite no foro privilegiado concedido a parlamentares, afastando-os dos processos analisados diretamente no Supremo Tribunal Federal (STF).

Os parlamentares pretendem alterar essa lei para que os processos corram primeiro em varas da Justiça Federal nos Estados, ganhando um outro rito judicial. É evidente que nos Estados os processos caminharão mais lentamente e os parlamentares não ficariam expostos ao maior rigor da Suprema Corte.

Já existe um texto que está sendo analisado há algum tempo na Câmara, com a indicação de que pode se transformar em PEC. A chamada “PEC do fim do foro privilegiado” propõe a extinção do foro especial por prerrogativa de função em casos de crimes comuns e já passou pela comissão especial do tema na Casa, em dezembro de 2018. Desde então, não andou mais.

Outro ponto é a abolição do foro privilegiado em caso de crimes comuns cometidos por deputados, senadores, ministros de Estado, governadores, ministros de tribunais superiores, desembargadores, embaixadores, comandantes militares, integrantes de tribunais regionais federais, juízes federais e outras autoridades. Portanto, não seriam julgados de imediato pelo STF, que só analisaria os crimes relacionados ao mandato dos parlamentares.

Dias antes do ano legislativo começar, senadores de oposição se reuniram com o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em busca de apoio para acelerar a tramitação dessa PEC, além de cobrar uma postura mais firme contra as operações da PF nos gabinetes de parlamentares.

Pacheco ouviu as reclamações e ficou de levar o assunto ao conhecimento do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), para a tomada de posições conjuntas. Senadores que estiveram na reunião saíram otimistas com o que consideraram boa receptividade por parte do presidente do Congresso. Entre os governistas, no entanto, predomina a opinião de que projetos como esses não terão apoio da maioria.