Um grupo de médicos cubanos denunciou, em Nova York, à margem da Assembleia Geral da ONU, a “escravidão” durante as missões internacionais do governo. Após desertar, eles hoje vivem nos Estados Unidos, onde começaram uma nova vida, mas não podem exercer sua profissão.

“Me cansei da escravidão, me cansei de mentir”, contou Tatiana Carballo nesta quinta-feira, durante uma conferência organizada pelo Departamento de Estado americano.

Carballo decidiu se unir ao Cuban Medical Professional Parole, um programa americano finalizado em 2017 que permitia aos médicos enviados por Havana para trabalhar em outros países solicitar a entrada nos Estados Unidos.

Mais de 600 mil cubanos prestaram serviços médicos em cerca de 160 países nos últimos 55 anos, de acordo com o governo cubano, que defende a solidariedade de sua “diplomacia dos jalecos”.

Carballo trabalhou em Belize, Venezuela e depois no Brasil, mas denuncia que não era algo voluntário, nem humanitário. Hoje, trabalha em um armazém da Amazon no Kentucky, pois não pode exercer sua profissão.

Na Venezuela, ela conta que vivia “sob um assédio e um estresse constantes”, com movimentos restritos e impedida de se relacionar com venezuelanos.

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Há quase 20 anos, Caracas é o principal aliado político e provedor de petróleo de Cuba, que retribuiu com milhares de médicos, treinadores esportivos e assessores militares.

A médica conta que o que mais lhe incomodou foi ter que falsificar estatísticas sobre quantos pacientes atendia, além dos pedidos de influenciar a população a votar no já falecido Hugo Chávez ou no atual presidente, Nicolás Maduro.

Carrie Filipetti, subsecretária adjunta do Departamento de Estado para Cuba e Venezuela, disse que o programa médico “não é destinado a dar apoio aos países que necessitam”, mas seu objetivo é “aumentar as receitas para o regime cubano, encobertas de ajuda humanitária”.

Filipetti afirmou que os médicos tiveram seu dinheiro roubado, enquanto Havana recebia 7,2 bilhões de dólares em um ano.

“Aqui na ONU nossa missão é nos juntar à comunidade internacional para chamar atenção sobre os abusos”, disse a diplomata.

Agora, os médicos desertores estão proibidos por oito anos de voltar a Cuba.

– Processo contra a Opas pelo Mais Médicos –

Cruz, Matos e outros dois médicos apresentaram um processo em uma corte federal de Miami contra funcionários da Organização Panamericana de Saúde (Opas) por seu papel no programa Mais Médicos, de enviar médicos cubanos ao Brasil.

Seu advogado, Samuel J. Dubbin, explicou à AFP que como as leis brasileiras não permitiam trazê-los diretamente, Brasília usou o intermédio da Opas, em Washington.

“A cada dólar que o Brasil pagava pelos serviços dos médicos, a Opas enviava 85% a Cuba, entre 5% e 10% aos médicos e a Opas ficava com os 5% restantes”, denunciou Dubbin, estimando que isto representa cerca de 100 milhões de dólares.

Havana deixou o programa no fim do ano passado, quando o então presidente eleito Jair Bolsonaro denunciou a retenção de parte dos salários dos médicos.


Cruz espera que o processo leve “o governo de Cuba a deixar de mandar os médicos” sob estas condições.

Agora, ele estuda enfermagem e sonha em revalidar seu título de médico em algum dia “distante”.

– ‘Nossa carreira acabou’ –

Ramona Matos, de 50 anos, esteve no Brasil e na Bolívia, onde teve seus documentos retidos.

Agora, tem um trabalho industrial e não pode exercer a medicina porque as autoridades cubanas retêm seus documentos necessários para revalidar o diploma.

“Nossa carreira acabou no momento em que você decide vir”, disse Matos.

“Não temos um programa específico” para lhes ajudar a trabalhar nos Estados Unidos, respondeu Filipetti.


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