A surfista Maya Gabeira disse que se sentiu pressionada pelo ex-mentor Carlos Burle antes do acidente que quase tirou sua vida em Nazaré, em Portugal. A declaração foi dada durante entrevista ao jornalista norte-americano Graham Bensinger.

Surfista de ondas gigantes, a brasileira ainda acrescentou que o surfista também errou no resgate dela. Ao UOL, a assessoria de Maya disse que ela não vai mais falar sobre o caso.

“Enquanto o Carlos estava me puxando [na motonáutica], eu disse que estava um pouco insegura e ele me pressionou, com um pouco de encorajamento, mas também com: ‘Você precisa ir, tem que decidir’. Eu senti essa pressão… Eu perguntei a ele: ‘Você acha que eu consigo?’, e ele disse: ‘Mas é claro que consegue!'”, questionou Maya.

Gabeira revelou que se fosse hoje não aceitaria surfar a mesma onda e acrescenta que a dupla não tinha tanta experiência na modalidade.

“Acho que eu não escolheria aquela onda nos dias de hoje, teria escolhido uma onda melhor, mas a gente não tinha tanta experiência. Então ele me colocou naquela onda, e eu acabei caindo e quebrando meu tornozelo. Carlos não tinha muita experiência em resgates e nem tínhamos uma equipe de auxílio, como há nos dias de hoje. E o Carlos estava sem comunicação, tinha perdido o rádio, e nós continuamos mesmo assim… Foi um erro grave”, cita ela.

No acidente em uma onda gigante na praia portuguesa de Nazaré, Maya foi resgatada por Burle quando já tinha perdido a consciência depois de sofrer uma queda grave. Contando apenas com o então mentor, a surfista precisou ser levada até a orla e precisou ser reanimada.

O resgate

“Quando tomei a segunda onda na cabeça, ainda perdi meu colete salva-vidas. Aí tomei algumas ondas pesadas na cabeça e tudo ficou preto, fiquei sem ar e comecei a pensar que ia morrer… O cenário era o pior possível. Depois de mais ou menos um minuto, eu o vi vindo em minha direção. Então ele fez uma aproximação terrível achando que eu estaria bem, e hoje tenho certeza que ele aprendeu que depois de dez minutos sem ver um corpo, naquelas condições, eu não estaria bem.”, detalha.

“Ele se aproximou pela primeira vez e jogou o ‘sled’ [tipo de trenó para reboque] para eu segurar, nem me deu a mão nem nada… Eu basicamente estava apagada naquele momento, não estava vendo, estava com muitas limitações… A única sensação que ainda tinha era ouvir, pois essa é a última que você perde antes de morrer. Então ele se aproximou de novo e gritou ‘Maya, segura a cordinha’, e eu, mesmo inconsciente, consegui pegar a cordinha e ele me levou pra mais perto da praia. Então ele conseguiu pular na água e me carregar para fora da água. Tudo ficou preto, não sei se era o ‘outro lado’…”, completa.

Sem seguir os protocolos de segurança, Maya relatou que outros problemas potencializaram a dificuldade para o resgate.

“A comunicação pelo rádio falhou. O segundo jet-ski de resgate falhou. Os coletes salva-vidas que usamos hoje inflam sozinhos, o que não era muito comum para os surfistas naquela época”, disse, antes de ser questionada sobre o que teria acontecido caso todos esses itens tivessem funcionado: “Não teria acontecido nada”.

“Para Carlos, é tudo tão simples. Não acredito que hoje ele ache que errou em algo. Acredito que ache que não cometemos nenhum erro”, finaliza.

Fim da parceria

O acidente fez com que Maya precisasse passar por duas cirurgias na coluna e uma no nariz, além da dificuldade para andar. Além disso, Maya diz ter recebido do mentor o conselho para ela se aposentar.

“O jeito que nossa parceria terminou foi muito difícil para mim. Eu estava indo da segunda para a terceira cirurgia após o acidente, e eu precisava muito de um apoio emocional. Estava traumatizada, com muito medo, com uma dor que nunca tinha sentido na vida… E ele olhou pra mim e disse: ‘Você não precisa mais fazer isso’. Eu era tão ingênua e estava tão confusa na hora que concordei [risos]. ‘Você tem razão, isso é muito estressante’. Ele estava me aposentando [risos]. E eu estava concordando porque ele era meu mentor, por dez anos. Ele estava me abandonando…”, relatou.

O que diz Carlos Burle?

Questionado pelo UOL, o ex-mentor e surfista preferiu não polemizar as declarações de Maya e disse ter muita gratidão pela surfista.

“Honestamente, não achei nada demais. Ela está colocando o ponto de vista dela. Olhar para trás e aprender com os erros é muito bom. Tenho muito respeito e gratidão por tudo que vivemos juntos. Se ela vê tudo isso desse jeito, que bom que ela está botando para fora, para se curar. Fico feliz que ela está bem. Que bom, parabéns! Achei supernatural”, disse.

“O mais importante aqui é respeitar. Tem uma pessoa que está precisando falar algo, justificar algo, é um ser humano. Deixa ela falar o que ela quer. O que eu penso não é importante. O importante é o que eu sinto. Deixa ela fazer o que quiser. Tenho muito gratidão. Vivemos momentos incríveis. Escrevemos a história do surfe juntos. Quando a gente começou, existia um preconceito enorme em relação às mulheres pegando onda grande. E, lógico que aconteceram coisas e hoje o protocolo é outro, mas a vida é assim mesmo”, acrescentou.