Mateus Solano, 44 anos, mostrou seu lado mais irreverente, divertido e multifacetado no quadro do “IstoÉ Gente como a Gente” — projeto do site IstoÉ Gente, que aborda o lado pessoal e espontâneo de personalidades brasileiras —, desta semana.
O ator, que está em cartaz até junho no Teatro Renaissance, em São Paulo, com o seu primeiro monólogo, a comédia dramática “O Figurante”, analisou os bastidores de gravações, falou sobre a sua trajetória até os dias atuais, comentou a respeito da família que construiu ao lado de Paula Braum – os dois são pais de Flora e Benjamin -, e refletiu sobre a fama, um lugar onde ele nunca quis se encaixar.
“O fato de as pessoas acharem que eu não sou ‘gente como a gente’ me machucou durante muito tempo […] Não, gente, pelo amor de Deus. Eu sou matéria humana. Se eu ficar em uma ilusão de que eu sou mais do que esse mundo, eu me perco”, declara.
Sem fugir de nenhuma pergunta, aliás, o artista contou até como as pessoas ao redor lidaram com a sua decisão de assumir a calvície em frente às telas.
“[…] Eu falo: ‘gente, que bobagem, pelo amor de Deus. Vocês estão preocupados com isso mesmo?’ Quando eu botei minha careca para jogo, na novela ‘Elas por Elas’ [2023], surgiu um monte de convites, eu recebia shampoos em casa, as pessoas preocupadas e tal. E eu, ‘caramba, que loucura, as pessoas acham mesmo que tem um jeito errado [de parecer]’. É meu, entendeu? Como é que pode ser errado, sabe? Enfim, eu me divirto um pouco, tento me divertir”, completa.
Defensor da causa ambiental juntamente com uma série de influenciadores, jornalistas e ativistas, Solano fala não só do impacto de levar para todos os povos a discussão sobre a importância da preservação da natureza, mas também, a retomada da criatividade da sociedade — que ele tenta despertar no público que o assiste em “O Figurante”.
“[…] Fico muito feliz com essa peça, que tem como componente principal a imaginação de quem assiste. É muito fascinante para mim o teatro entreter nesse lugar. Vamos imaginar o que tem aí, em uma era em que a gente tem tudo aqui [mexendo no celular]. E que a imaginação parece que está em ‘bet, bet, moedinha, moedinha, moedinha'”, diz ele referindo-se aos jogos de aposta.
“Você esquece que é criativo, humano. Tem uma frase da Fernanda Cortez, que é uma grande ecologista amiga minha, que não sai da minha cabeça: a gente não está vivendo uma crise ambiental, mas sim, uma crise de criatividade. Eu acho fantástico isso. Uma amorosidade”, completa.
Confira a entrevista na íntegra abaixo:
IstoÉ Gente: Como tem sido subir aos palcos com seu primeiro monólogo?
Mateus Solano: Eu estou muito feliz de estar com essa peça, o meu primeiro monólogo, “O Figurante”, aqui em São Paulo, prorrogando a temporada até final de junho, sextas às 21h, sábados às 19h e domingos às 17h horas da tarde no Teatro Renaissance, ali na Alameda Santos, com a Haddock Lobo.
Eu não poderia estar fazendo ele em outro momento, porque ele dependeu realmente de toda a minha trajetória, tem a ver com a minha maturidade em cena e fora dela. São temas que são muito caros para mim e que eu estou levando com muito humor.
É uma peça que atira um pouco para todos os lados. Tem humor, tem um trabalho de corpo que é diferente de quem me conhece pela televisão, tem reflexões que as pessoas são pegas de surpresa por elas, então é um teatro que eu gosto de fazer e de assistir. Estou bem satisfeito com o retorno das pessoas, porque é uma peça que saiu de improvisações minhas, de questões que eu queria botar em cena, e às vezes eu não sabia se era uma pira do Mateus Solano ou se era alguma coisa realmente humana, alguma coisa que tocava todo mundo.
Eu acho que estou falando de uma coisa que é comum a toda a gente. Quem nunca se sentiu automatizado, numa vida um pouco sem sentido? Quem nunca se sentiu que estava vivendo uma vida que foi escrita para outra pessoa viver? Quem nunca se sentiu figurante na sua própria história?
E cada vez mais eu acho que a humanidade vai se sentindo e se incomodando em se perceber como figurante do universo, como alguma coisa que vai passar e que não vai ter tanta importância e vai criando ilusões de importância, de protagonismo e tal, e nisso a gente destrói o planeta, nisso a gente vai criando… Então, é uma peça que começa com um tema jocoso e engraçado, mas que pode levar para todos esses lugares, dependendo da forma como cada um aprender.
Mas, cortando em miúdos a história, conta a rotina do Augusto, que é um figurante profissional muito talentoso, que ensaia os seus personagens todos os dias, antes de ir fazer o porteiro da escola ou o garçom na festa ou qualquer outra figuração.
Chegando no trabalho, ele percebe que o que é pedido dele é muito aquém do que ele tem de potencial. E aos poucos ele vai se sentindo figurante na sua própria história e vai se rebelando contra isso e essa é um pouco o que vai se questionando na peça, se a gente é protagonista ou figurante.
Você se sente protagonista da sua vida?
MS: Estou me tornando. Eu acho que a peça, justamente, ela acontece, ela surge no momento que eu estou questionando isso, que eu estou buscando isso. Porque todos nós vivemos e somos obrigados a isso enquanto estamos crescendo também, a nossa carreira e tal, a viver para o outro, viver para uma sociedade, viver para o que o professor quer, o que o patrão quer, muitas vezes num relacionamento, para o que o outro quer.
E tomando esse protagonismo é uma segunda fase, digamos assim. Primeiro você precisa mostrar a que veio, depois você conquista a si próprio. E eu agora com 44, acho que depois dos 40 a gente meio que fala ‘e agora? O que eu faço com isso?’ Enfim, a peça nasce desse momento da minha idade também.
E o que mudou depois dos 40?
MS: Depois dos 40 a impressão é de que nada do que eu fui acumulando durante esses anos todos me serve daqui para frente.
O que por um lado é desesperador, por outro lado é muito legal porque você vê uma folha de papel em branco na sua frente e uma calma muito maior porque você não precisa, como eu disse anteriormente, provar nada para ninguém e tal.
Então, é um momento muito excitante de construção, de saber o artista que eu sou, o que eu quero botar em cena. O que eu quero fazer também com esse carinho, esse amor que eu conquistei do público brasileiro para levar no teatro, para levar para pensar em cena.
É muito importante. É um momento de criatividade excitante e também de muita responsabilidade.

Mateus Solano posou para fotos nos bastidores do “IstoÉ Gente como a Gente” – Leonardo Monteiro/IstoÉ
Após tantos anos de carreira, você ainda sente nervosismo antes de subir no palco?
MS: Se eu não tiver nervosismo eu não estou fazendo teatro. Você está sozinho em cena, no caso eu sozinho no monólogo, mas mesmo em uma peça com muita gente você está em cima de um tablado com as pessoas que pagaram e estão ali. Que história é essa que você vai me contar? Você tem que fazer aquilo direito e contar aquilo como se fosse a primeira vez.
Como se fosse não pela primeira vez, porque o rio nunca é o mesmo nem os pés que entram nele. É muito bonito, muito efêmero e se você perde o contato com isso e entra numa música e numa coisa que você repete todos os dias da mesma forma e fica protegido naquilo, sem contato com o presente, com o que está acontecendo, com o que está acontecendo dentro e fora de você aí você já não é mais artista, na minha opinião.
Esse friozinho da barriga é fundamental. E é o primeiro monólogo também. Eu tinha muito medo da solidão, mas estou muito bem com ela.
Como você tem lidado com essa solidão?
MS: Estou acompanhando de mim e se a gente está falando de eu procurar o meu protagonismo eu estou falando de parar de olhar para o que o outro quer de mim e começar a entender o que eu quero.
Então, estar em um monólogo, estar sozinho em cena tem a ver com… espera aí, agora eu quero entrar aqui dentro e entender um pouco o que eu quero. Estar em cena eu estou aprendendo como nunca aprendi antes. Isso o Clayton Nascimento me falou, porque eu liguei para ele, liguei para alguns atores que fazem monólogos de sucesso. Eu falei: ‘vou fazer um monólogo’. Ele falou: ‘daqui a três anos você me liga. Você nunca, amigo, você nunca vai aprender tanto’, com aquela voz maravilhosa dele, ‘nunca vai aprender tanto’.
E realmente, eu não tenho para onde fugir. Sou eu e as minhas limitações. Eu não posso descansar que tem outro falando. Eu estou o tempo todo em cena.
São 70 minutos suando, vociferando e vivendo aquele personagem. Então, tem sido muito bonito. Tem sido um momento de muita concentração. Enfim, tem tudo a ver com o momento que eu estou vivendo realmente. De rever as coisas, de parar. Tem sido muito legal.
A que se deve essa irreverência do Mateus Solano como artista de teatro e TV?
MS: Acho que tem a ver com esse Mateus Solano buscando a aprovação do outro até os 40 anos. Agora eu estou indo para um momento talvez mais concentrado. Um pouco mais… “agora não”.
E o nervosismo nos palcos se repete nos bastidores das gravações da TV?
MS: É diferente. Existe o nervosismo, porque você traz um trabalho de casa e o seu colega traz outro. E o diretor tem a visão dele. Quando é que você ensaia mais? É em casa. Você tem que ter uma porosidade e um jogo de cintura para deixar. Não é nada disso que eu tinha pensado, mas a atriz quer. Nem o diretor tem ingerência. Então vai ser do jeito que a atriz quer. Então, vamos lá, vamos junto. E vamos entender o que é a cena. Porque a cena só vai acontecer quando as pessoas que estudaram o texto em casa se encontrarem ali para fazer aquela cena.
Não tem ensaio como no teatro. A gente ensaia uma ou duas vezes e tem que gravar, porque “time is money” (“tempo é dinheiro”) e televisão é muito rápido. Mas então por isso eu acho que tem a ver com essa rapidez. Tem a ver com ter que a rapidez e não se acostumar com a rapidez.
Porque aí você acha um monte de muletas e fatalmente em uma novela, que tem tantos capítulos, em algum momento você vai estar encostado nessas muletas, porque cansa, porque entra no automatismo e tal.
Mas é importante você ser artista com a maiúscula e tentar sempre pular fora disso. E por isso que sempre que depois de uma novela… Claro, isso dentro da novela, mas sempre que eu termino uma novela eu tento voltar para o teatro porque é um lugar de esgarçamento desses lugares que a TV vai te… [colocando em caixinhas].
No teatro vocês vão me ver do dedinho do pé até o fio do cão suando e cuspindo o povo da primeira fila, eu peço desculpas.
Sua última novela até agora foi há dois anos. Tem vontade de voltar para a TV?
MS: É engraçado que quando eu estou fazendo TV as pessoas falam: “você não vai voltar para o teatro?” E quando eu estou no teatro… Eu não quero sair de nada. Eu estou aí, os projetos aparecem e tal.
Muita gente, os fãs principalmente, perguntam: “Mas você não vai fazer novela?” Como se fosse eu que escrevesse e chamasse as pessoas e fizesse quem faz a novela, quem cria a novela, é todo um corpo que aí vai chamar os atores. Adoro fazer televisão, adoro fazer novela, adoro fazer bons personagens. Adoro.
Como foi para você ser indicado a quatro categorias do Prêmio de Humor?
MS: Ah, demais, demais. O Prêmio de Humor, um prêmio criado pelo Fábio Porchat em 2017, então está no seu nono ano. Um prêmio dedicado ao humor, que eu acho importante, porque o humor é uma sacada do Fábio, porque o humor sempre, historicamente, é delegado para uma segunda prateleira, como se fosse um gênero menor.
Quando, na verdade, tudo que todo mundo quer é rir e hoje o drama está tendo que pedir comédia emprestada para fazer pensar. Porque se você não faz o cara rir, ele não abre o peito. Ele vai ver a peça assim [com os braços estreitados rente ao corpo]. Desmontar ele pela emoção é muito mais difícil, cada vez mais difícil, porque as pessoas não querem sofrer, não querem se emocionar, as pessoas querem rir, querem se entreter.
A gente está na sociedade do entretenimento, do espetáculo. Então, a comédia é super importante, mas desde o início, eu lembro de um livro que eu li sobre o início da comédia no Brasil. Desde o início, a comédia era uma coisa escondida, meio como o samba. Uma coisa menor, um gênero menor que, na verdade, é a grande expressão do nosso povo.
Nós somos um povo que samba e que ri, e que se diverte muito também. Voltando ao Prêmio do Humor do Fábio, foi o décimo… Não, foi o nono. E aí nós tivemos quatro indicações.
Eu fiquei muito feliz, porque não saí vamos fazer uma comédia. Eu saí, vamos fazer uma peça sobre coisas que são importantes para mim. O uso da comédia é uma comédia dramática, ou como disse já uma pessoa da plateia, é uma comédia do desespero. Achei lindo. Mas tem o desespero, tem o drama e tal. Então não é exatamente alguma coisa que eu acharia que ia ganhar.
Quatro indicações no Prêmio do Humor, fiquei muito feliz. E levamos o prêmio especial pelo trabalho de corpo, conduzido pelo Tony.
E que eu venho desenvolvendo com o Miguel vários espetáculos, que é o trabalho da mímica. E que as pessoas ficam bem impressionadas. Ninguém imagina que eu faço mímica. Nem eu imaginava.
É muito difícil?
MS: Não, eu tenho facilidade. Eu tenho facilidade com o ponto fixo, com… Sabe? Eu tenho o Marcel Marceauzinho aqui que me ajuda a estabelecer. E aí eu estabeleço o que tem aqui. E aí na peça eu faço tudo. Vou abrir a geladeira, a geladeira ela emperra.
Então, todos esses detalhes vão fazendo que eu fico muito feliz com essa peça, que é uma peça que tem como componente principal a imaginação de quem assiste.
Então, as pessoas que assistem às vezes falam: ‘nossa, eu vi aquele copo, eu vi aquele…’ Eu falo: ‘não viu, você imaginou. Esse é o copo diferente da pessoa que estava do seu lado’.
E isso é muito fascinante para mim, o teatro entreter nesse lugar. Vamos imaginar o que tem aí. Em uma era em que a gente tem tudo aqui [no celular].
E que a imaginação parece que está… Não, não imagina não. Oh, Bet, Bet, moedinha, moedinha, moedinha. Esquece que você é criativo, esquece que você é humano, esquece que… Eu, como como ativista, defensor do meio ambiente, tem uma frase da Fernanda Cortez, que é uma grande ecologista amiga minha, que não sai da minha cabeça.
Que o que a gente está vivendo não é uma crise ambiental, mas uma crise de criatividade. Eu acho fantástico isso. Uma amorosidade.
Está tudo errado. Faz tudo errado também. É horrível, né? Ninguém se levanta, ninguém está… E está tudo aí. As oportunidades para se fazer diferente, para se enxugar as mãos, para se juntar, para sair na rua. Mas a gente está realmente… E eu acho que o teatro, a arte, a cultura é um lugar para chacoalhar. E como eu disse no post do Fábio Porchat voltando ao pleito do humor, o humor chacoalha através da gargalhada.
A facilidade com a mímica o ajudou na composição dos gestos do Félix e do Zé Bonitinho?
MS: Eu tenho uma coisa com gestos muito preciosa, mas isso é completamente diferente da mímica. A mímica é realmente um campo específico, assim como um trabalho de clown, mas eu, como ator, eu gosto sempre de emprestar uma assinatura gestual para o personagem.
O Miguel tinha uma coisa assim, tinha o Jorge que tinha uma coisa assim, aí o Félix vem aqui, e o Zé Bonitinho já tinha várias coisas que o Loredo tinha inventado, e aí eu fui pegando. E o Félix com trejeitos, eu sempre fui desmunhecado, sempre fui muito feminino. Então, tudo isso eu empresto para os personagens.
O que te motivou a buscar defender a causa ambiental?
MS: Eu acho que eu sempre fui, volto a falar, minha mãe me criou como um filho da natureza, não como dono da natureza, e isso me coloca realmente já num caminho tão diferente do que a gente está indo como sociedade, como humanidade.
E aí, um belo dia, essa história de seguidores, de rede social, quanta gente me seguindo, o que eu faço com isso? E todo dia uma hashtag, todo dia você podia lutar por uma coisa, e aí de repente eu falei, não, mas aí eu estou pulverizando, se não é interessante nem para a causa e nem para mim.
Espera aí, vamos escolher uma coisa? Óbvio que eu ia escolher a seara ambiental, porque para mim é a questão das questões. Ah, porque a posição política, porque a cor, porque não sei o que, tem ar para respirar? Tem água para beber? Se não tiver, não tem nada mais importante.
Você é um bicho que precisa sobreviver, que tem um equilíbrio muito delicado nesse planeta, e que você, bicho, por achar que não é bicho, está destruindo a sua própria chance de sobreviver num planeta que não precisa da gente.
Então, esses sonhos de grandeza da humanidade que me deixam apavorado e, ao mesmo tempo, é o que me interessa como artista, o teatro que a gente inventou para viver.
É isso que eu quero botar em cena sempre, eu quero botar um espelho para a humanidade ver o ridículo e entender que não, que a humanidade tem escolha, que o indivíduo tem escolha, que a sociedade tem escolha e que a gente precisa ser chacoalhado para sair da inércia.
O que faz o Mateus Solano ser gente como a gente?
MS: Eu acho que essa entrevista responde. Não, gente. Inclusive, eu tive muita dificuldade quando as pessoas achavam que eu não era gente como a gente. Isso foi uma grande dificuldade.
O meu sentir me sentir figurante vem daí, das pessoas me tratando como alguma coisa mais do que gente como a gente. Não, gente, eu sou gente como vocês, como gente como a gente. Então, o fato das pessoas acharem que eu não sou gente como a gente foi uma coisa que me machucou durante muito tempo.
Ao invés de eu… Fiquem [embaixo de mim] vocês, velhos mortais. Não, gente, pelo amor de Deus. Eu sou matéria humana. É isso. Pelo contrário. Pelo contrário também não é legal.
Mas, por*, sou do mundo porque eu sou artista, eu tenho que representar esse mundo. Se eu ficar numa ilusão de que eu sou mais do que esse mundo, eu me perco. Aquele Michael Jackson parou de sair, parou de sair na rua, parou de frequentar… O Michael Jackson ia lá na boate lá, Estúdio 54, tinha de tudo. Tinha um cavalo no meio da boate, pessoas, enfim, todas as maluquices de uma década de 1970. Tem fotos do Michael Jackson com o David Bowie. Dali surgiu “Off The Wall”, surgiu o “Thriller”, veio o “Bad”, veio o “Dangerous”, veio “History”, “Invincible”.
Esse cara está se perdendo. porque não sai mais de casa, porque não tem mais contato, porque ele virou o rei, o super, o pop. Começou a fazer aqueles clipes como se fosse um ditador ou alguma coisa. Uma coisa de acreditar e, vamos dizer, incentivar essa coisa.
Foi a pira dele. Foi o que acabou matando ele, no fim das contas. É o que mata, eu acho, os artistas que caem nessa de não ser gente como a gente.

Mateus Solano posou para fotos nos bastidores do “IstoÉ Gente como a Gente” – Leonardo Monteiro/IstoÉ
Nos últimos trabalhos você mostrou sua calvície, o que gerou diversos comentários. Como você lida com essa exposição?
MS: Bom, sendo gente como a gente, do jeito que você vê que eu respondo as coisas, que eu tento me mostrar, isso tudo me parece… Isso tudo fica lá embaixo. Isso tudo eu falo: “gente, que bobagem, pelo amor de Deus. Vocês estão preocupados com isso mesmo?”
Eu recebi um monte… Quando eu botei minha careca para jogo, na novela “Elas por Elas”, surgiu um monte de convites, eu recebia shampoos em casa e coisas, pessoas preocupadas e tal. E eu, caramba, que loucura, as pessoas acham mesmo que tem um jeito errado. E como é que pode ser… É meu, entendeu? Como é que pode ser errado, sabe?
Enfim, eu me divirto um pouco, tento me divertir. Eu sou um pouco ácido, às vezes, com essas coisas. Mas a minha careca é uma coisa que eu estava tentando emplacar em umas três novelas, porque já estavam deixando meu cabelo crescer. Aí botava por cima, aí bota aquele pozinho, uma coisa ridícula. E eu falei: ‘vocês querem um cara com crise de meia-idade? Ok, é isso. A característica dele é que ele tem crise de meia-idade. Ele vai ficar ridículo, é isso’.
Tem uns preconceitos também dos quais a televisão também vive. Eu lembro que quem deixou eu ficar com a careca foi a Amora Maltner, maravilhosa. E aí um dia ela falou: “vamos abrir na careca do Mateus, já que ele quis essa careca, a gente ganha em comédia”.
E aí você vê a careca é identificada com a comédia. Eu lembro quando eu fui fazer o Félix, que veio um repórter dizer: “você fez vários galãs…”, – que era uma coisa que me incomodava muito. Galã? O que é isso? Galã quer dizer que eu não sou outras coisas? Então eu não quero ser galã.
… “Você fez vários galãs e agora vai fazer um homossexual. Como é que é isso para você?” Então, o homossexual não pode ser galã? Aí a pessoa foi pega. Então tem umas convenções teatrais desse teatrão que a gente inventa para viver todo dia, que tem que ganhar dinheiro, que tem que trabalhar, que tem que botar roupa, que… Enfim, são convenções. Então, quando você mostra e você percebe, você vê o ridículo disso. Eu acho que o teatro serve para isso também.
Como é o Mateus Solano pai e marido, fora dos holofotes?
MS: Eu vou tentando melhorar. Tenho meus defeitos, que eu vou me esforçando assim como em cena, sozinho, no monólogo, como indivíduo também, como pai, como marido, como dono de casa, como profissional. São campos que eu vou tentando tomar as rédeas.
Sou um pai muito carinhoso, amo meus filhos. Flora, Benjamin, um beijo. Meu amor, Paula, 17 anos juntos. É uma vida. Muitos altos e baixos. Realmente é um elo, é um companheirismo.
Você teme pelo que seus filhos possam sofrer no futuro em relação às questões ambientais?
MS: Eu vou tentando ser exemplo na medida do possível, porque eu não sou vegano, por exemplo, nem vegetariano. A ignorância é uma benção. Quanto mais a gente sabe, mais a gente se preocupa.
Eu já sofri, digamos assim, de ansiedade ambiental, mas agora eu resolvi abraçar a história do beija-flor. Vou fazer que nem o beija-flor, que naquele incêndio, que o leão estava lá paradinho, incêndio de um lado, um lago do outro, o beija-flor ia lá, pegava uma coisinha no bico, jogava, voltava, pegava, o leão na quinta vez falou que o beija-flor se acha que não vai apagar o incêndio. Não, não, não, leão, estou só fazendo a minha parte.
E a minha parte reverbera, é uma gotinha no oceano, mas reverbera, faz onda, porque sou famoso, porque tenho seguidor, não sei o que, então vou tentando fazer a minha parte no meu entorno, nas minhas redes sociais, tentando que isso. E eu acho que isso tem um poder hoje em dia.
Hoje mesmo o André Trigueiro me falou, eu falei com ele sobre algumas questões ambientais e tal, ele falou assim, você não tem noção de como incomoda quando vocês falam, então fale, fale. Que bom ter esse retorno às vezes, porque parece que você está ali e nada acontece, é desgraça atrás de desgraça e o algoritmo vai te mostrar mais desgraça, porque acho que você gosta de ver desgraça.
Então, é claro, que eu temo pelo futuro, mas eu estou fazendo por onde, não tudo que eu podia fazer, mas mais do que muita gente e sendo exemplo, tentando ser exemplo para os meus filhos também poderem fazer isso, e é uma outra geração, enfim. Vamos ver como é que isso se desenvolve, está tudo muito rápido.
Você mudaria alguma coisa na sua vida se você pudesse?
MS: Eu acho que não. Eu acho que tudo foi uma construção. Eu ia falar sobre essa história de ser para o outro, não sei o que, mas se eu não tivesse sido para o outro eu não estava agora discutindo de ser para o outro e mudando, então quer dizer.
Tudo me construiu, eu sou grato por cada cicatriz, por cada dor na lombar e só os quarenta anos te trazem isso.
É bom mesmo?
MS: É bom, você vai ver.
Mas por que é bom?
MS: Porque você para de tentar provar, você para de falar, ai me machuquei, e agora? Não, você vai morrer, cara. Isso é seu, essa dor é sua. O outro tem uma dor diferente, todo mundo tem dor.
Aí você vai ficando, vai vendo as coisas, dissolve um monte de problema, um monte de nozinho, dissolve, porque você fala, cara, isso não é teu poder. Não, isso é questão do outro. Não, é o outro que está com raiva, não é você que está errado.