A declaração de Bruna Marquezine, 30 anos, sobre estar passando por avaliação para TDAH e autismo, durante o programa “Angélica ao Vivo” (GNT), trouxe luz a um tema que tem se tornado cada vez mais urgente: o número crescente de mulheres adultas que estão, pela primeira vez, investigando sinais de neurodivergência que sempre fizeram parte de suas vidas, mas jamais foram reconhecidos.
Com bom humor, a atriz relatou que perdeu os formulários enviados por sua médica. “Eu tô naquele processo de fazer teste de TDAH e de autismo também. Do teste de TDAH, eu recebi uma papelada, fiz todos os testes, a médica falou que eu precisava entregar para as pessoas que convivem comigo para elas preencherem. Não só esqueci, como perdi o papel. Acho que o diagnóstico tá aí”, brincou ela.
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A fala virou meme, mas também ecoou profundamente em milhares de mulheres que se enxergaram na dificuldade crônica de organização, atenção e memória.
Para o médico psiquiatra *Dr. Iago Fernandes, o movimento de mulheres adultas buscando diagnóstico não é uma moda, mas uma consequência natural da maior compreensão sobre neurodesenvolvimento feminino. “O diagnóstico não funciona como etiqueta, mas como bússola. Ele dá sentido a comportamentos e dificuldades que antes eram vistos como falhas pessoais”, afirma ele.
O especialista explica que entender o próprio funcionamento reduz culpa e abre espaço para uma vida mais organizada emocionalmente. “Quando a pessoa descobre o que acontece com ela, deixa de se culpar por não se encaixar em um padrão que nunca foi feito para ela. É libertador”, completa.
A fonoaudióloga **Letícia Sena destaca que muitas mulheres autistas passam a vida dominando a arte da camuflagem social. “A mulher autista aprendeu a se adaptar para sobreviver. Mas essa adaptação cobra um preço emocional altíssimo”, explica. Segundo ela, crises emocionais que aparecem na vida adulta não são sinal de fragilidade, e sim de sobrecarga. “A crise não é um ataque. É o corpo dizendo que não dá mais. O papel de quem está ao lado não é corrigir, é acolher”, destaca.
A psicóloga ***Anastácia Barbosa, especialista em comportamento feminino e neurodesenvolvimento, reforça que o atraso no diagnóstico é consequência direta de décadas de pesquisa focada quase exclusivamente em meninos. “As mulheres sempre sentiram os sintomas, mas aprenderam a mascarar. Agora elas finalmente têm permissão para investigar o que sempre esteve ali”, afirma.
A profissional explica que sinais de TDAH nas mulheres tendem a ser internos, o que dificulta a identificação. “Muitas crescem ouvindo que são distraídas, desorganizadas ou intensas. Não é falta de esforço, é TDAH não reconhecido.”
Entre os sintomas mais comuns em mulheres com TDAH, a psicóloga cita mente acelerada, ciclos de organização caótica, dificuldade de iniciar tarefas, hiperfoco seletivo e intensa sensibilidade emocional. Já em mulheres autistas, ela destaca hipersensibilidades sensoriais, exaustão após interações sociais, dificuldade com mudanças e a sensação persistente de não pertencer a lugar algum. “Mulheres autistas costumam ser diagnosticadas só depois dos 25, 30 ou até 40 anos porque se adaptaram para sobreviver socialmente”, explica.
A psiquiatra ****Dra. Jessica Martani, presidente do Instituto TDAH e coordenadora de pós-graduação em TDAH, acrescenta um ponto crucial. “É extremamente comum que as pessoas descubram TDAH na vida adulta por causa do que chamamos de camuflagem social. A pessoa aprende técnicas para se adaptar aos comportamentos esperados, mas isso desgasta profundamente”, afirma. Ela destaca sinais típicos na vida adulta como procrastinação, esquecimento, dificuldade de organizar a rotina, explosões emocionais, impulsividade e sensibilidade intensa à rejeição. “São sintomas que interferem no trabalho, nos relacionamentos e na autoestima, mas que muitas mulheres passam décadas tentando justificar como falhas pessoais”, explica.
O caso de Bruna Marquezine, embora particular, funciona como espelho para uma geração de mulheres que agora revisitam a própria história com mais clareza e compaixão. Para os especialistas, o diagnóstico correto abre portas para tratamentos eficientes, autoconhecimento e, principalmente, alívio. Como resume Anastácia Barbosa, “quando a mulher recebe o diagnóstico, ela não descobre um problema. Ela descobre uma explicação”.