Mais que fadista, Mariza se considera uma “cantadeira de fado”. O fato é que a estrela portuguesa Mariza dos Reis Nunes, de 45 anos, 19 de carreira e sete discos, se apresenta a partir de quinta-feira no Brasil, dentro de uma excursão mundial que se encerra em dezembro. Na entrevista à IstoÉ, fala de seu pai e da ligação com o Brasil. Ela aponta pontos em comum e diferenças entre os cantos brasileiro e português. “Vocês choram sorrindo e a gente sorri chorando”, diz.

 

Você diz que já perdeu a conta de quantas vezes veio ao Brasil. Por que o Brasil é importante para sua carreira, sem mencionar a óbvia ligação com a língua portuguesa?

Olha, meu pai viveu no Brasil, meu nome veio de uma cantora brasileira, a Marisa Gata Mansa,  tenho uma ligação muito forte com o seu país, é como se estivesse em casa. O Brasil é extremamente importante, eu sinto que é uma parte da minha vida. Eu cantava num navio de cruzeiro que fazia a costa do Nordeste e que todos os domingos atracava na Bahia, isso aos 21 anos, por isso, de certa forma, o Brasil é parte da minha cultura como cantora. Poder fazer parte desse universo de alguma maneira – porque sou portuguesa e a minha música não abrange tanto as massas -, para mim é bastante importante. É importante respirar o ar daqui.

Que pontos em comum você ouve entre as músicas brasileira e portuguesa, além da língua, obviamente?

Além da língua, há uma melancolia gigante quando você ouve o chorinho, por exemplo. Nós somos mais duros, temos uma forma de escrever mais dura. A mim me encanta essa maneira de escrever daqui, de dizer muitas coisas em poucas palavras, dessa forma mais amorosa, mais romântica, menos dura.

Em termos puramente melódicos, o parentesco não parece maior que o que temos com a música italiana, que nos trouxe a concertina e as melodias líricas. Ou a música portuguesa é também influenciada pela napolitana? Parece que sim.

Acho que não. A música que eu canto e que tento apresentar em cima do palco – atenção porque não estou pondo um rótulo no fado – é um triangulo que une África, Brasil e Portugal . Não vejo a música napolitana tão próxima assim., talvez a melancolia e por estarem perto do mar as aproxime, mas a razão dessa música que eu faço vem da lusofonia formada por essas três pontas: Brasil, África e Portugal.

A parceria entre músicos portugueses e brasileiros nunca me parece muito espontânea. Há um sentimento de constrangimento ou a impressão é minha? As duas músicas simplesmente me soam como água e azeite, não se misturam. Será por razões históricas? .

A razão é porque vocês choram sorrindo e a gente sorri chorando. Essa é a grande diferença. Vocês têm calor e a gente tem frio, tudo isso sem querer nos afastar, mas a música é um ponto de ligação como eu nunca vi igual. Eu já estive em teatros com pessoas de visões políticas diferentes, de religiões diferentes, de opiniões sobre a vida completamente diferentes,  e naquelas duas horas em que estão juntas, estão em completa conexão. A música não tem gênero, não tem língua, é de todos.

Seu último trabalho é mais uma vez fundado no fado. O fado está vivo? Em que medida ele se renovou e em que medida ele vive mais quanto mais ele conserva as características originais?

Olha, eu acho que todas as músicas urbanas, que é o caso do fado,  precisam se renovar. O mesmo acontece com o tango, com o flamenco, todos se renovam conforme o espaço em que elas vivem,  conforme a sociedade se movimenta e respira. Não tem sentido eu cantar uma música do século XIX pra falar de coisas que aconteceram naquela época – essa é uma música que vem das classes trabalhadoras, dos ladrões, das prostitutas, pessoas que não sabiam ler ou escrever  e através desta música, tratavam de saber o que se passava na corte, na sociedade daquela altura . Hoje em dia, o fado que se canta reflete o nosso tempo – eu sei que sou muito culpada de trazer  percussões, de trazer novas musicalidades, mas tem a ver com a nossa forma de estar, com a minha africanidade, com isso tudo. Eu canto um Portugal de hoje.

Você poderia descrever em que consiste seu novo espetáculo e álbum?

Os discos representam sempre fases da minha vida, este disco representa-me hoje, como eu sou hoje. Busquei reunir amigos, alguns compositores me acompanham a muitos anos, outros a menos tempo. Alguns são mais do fado tradicional, outros não. Essa mistura reflete precisamente o meu momento de agora, assim como a turnê internacional que termina em dezembro. Há canções novas e as que são já tradicionais do meu repertório.

São 18 anos de uma carreira internacional de sucesso. Que balanço você faz dela? Há coisas que você gostaria de ter feito? Quais as vitórias e fracassos? Um músico pode estabelecer uma meta olímpica: você fez isso?

Na verdade são 19 anos de um percurso maravilhoso, que aconteceu tão rápido! Eu não me dei conta que já tinha esse tempo. Olha, o ser humano é assim. Quando ele atinge um degrau, já pensa no próximo. Eu nunca esperei que isso acontecesse, mas já que é um fato, eu só posso ficar a espera de mais e mais. Agora, eu também dou mais e mais de mim, porque acho que as pessoas merecem. Há uma noção e uma consciência da responsabilidade que eu não tinha há 20 anos atrás. Hoje, quando eu entro em palco, há uma noção de responsabilidade, de querer fazer o melhor que eu sei e dar tudo o que posso, mas meta olímpica, não. Eu gostaria de cantar até os 70 anos. Mais não, porque aí, acho que está demais (risos).

Quais são seus planos depois da excursão atual?

Provavelmente meus planos seriam tentar entrar em um estúdio, tentar gravar, mas resta saber se terei cabeça para isso, porque essas coisas, para mim, não são superficiais, frívolas, são um ato de amor. E tudo que é feito com amor tem que ter o seu tempo.

 

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