SÃO PAULO E FRANKFURT, 28 OUT (ANSA) – “O BCE está pronto para fazer o que for preciso para preservar o euro e, acreditem em mim, isso será o bastante”. Essa frase, dita em 26 de julho de 2012, é um símbolo da gestão de Mario Draghi à frente do Banco Central Europeu. Nesta segunda-feira (28), aos 72 anos, o italiano encerra seu mandato na instituição e deixa Frankfurt como o homem que salvou o euro.   

Há sete anos, Draghi enfrentava a crescente desconfiança de investidores em relação ao futuro do maior projeto de integração monetária do planeta. Com Estados endividados empurrando o euro para o abismo, o presidente do BCE resolveu deixar claro que não mediria esforços para evitar o colapso da moeda.   

Uma semana depois, com a oposição da poderosa Alemanha, o Banco Central Europeu anunciou um programa chamado “Transações Monetárias Definitivas” (OMT, na sigla em inglês), que previa a aquisição no mercado secundário de títulos soberanos emitidos pelos membros da zona do euro.   

O instrumento nunca precisou ser usado, mas foi o suficiente para dar uma injeção de confiança nos investidores. No início de 2015, Draghi anunciaria uma nova arma, ainda mais potente: a “flexibilização quantitativa” (QE).   

Com esse programa, o BCE injetou até 80 bilhões de euros por mês nos países da zona do euro, por meio da compra direta de títulos de instituições financeiras, com o objetivo de derrubar as taxas de juros, evitar o risco de deflação e impulsionar o crescimento econômico na União Europeia.   

Em outras palavras, o Banco Central Europeu imprimiu trilhões de euros em moeda para aumentar a liquidez do sistema bancário no bloco, um instrumento que foi crucial para a recuperação – ainda que discreta – de muitos países da região, como a Itália.   

Encerrado em dezembro de 2018, o programa será retomado pelo BCE em novembro devido à desaceleração econômica e prevê a injeção de pelo menos 20 bilhões de euros por mês, “pelo tempo que for necessário”.   

“Em 2011, o impacto da crise financeira impunha à união e ao banco, em primeiro lugar, uma mudança de passo. O desafio havia se tornado existencial: derrotar a percepção da possibilidade – até mesmo do risco – de dissolução do próprio sistema europeu.   

Uma possibilidade que hoje podemos considerar superada”, disse o presidente da Itália, Sergio Mattarella, nesta segunda-feira, em um discurso em Frankfurt na cerimônia de despedida de Draghi.   

Já a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, sempre a favor de uma política econômica mais austera, reconheceu que o italiano foi “crucial” para a estabilidade da zona do euro, ao ter evitado o “colapso” da moeda comum.   

Defensor do euro – Para Arnaldo Francisco Cardoso, professor de relações internacionais da Universidade Presbiteriana Mackenzie Alphaville, na Grande São Paulo, Draghi deixa o BCE como um “enfático defensor do euro”.   

Apesar disso, o especialista acredita que os instrumentos usados pelo italiano não foram suficientes para estimular as economias europeias. “O Banco Central Europeu está enfraquecido em relação à política dos bancos privados internacionais, que não estão aguardando sua orientação e conduzem suas próprias políticas de crédito”, afirma Cardoso.   

Draghi será substituído pela francesa Christine Lagarde, ex-diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI) e que assume o cargo oficialmente em 1º de novembro. Segundo o professor do Mackenzie, sua tarefa será administrar uma política que preserve a estabilidade do euro e identifique caminhos para estimular a economia.   

Em seu discurso de despedida, Draghi afirmou que o Banco Central Europeu estará “em boas mãos” com Lagarde, mas relembrou o “whatever it takes” de sete anos atrás. “O BCE demonstrou que não aceitará nenhuma ameaça à estabilidade monetária, causada por temores infundados sobre o futuro”, disse o italiano, que fez o que foi preciso para preservar a moeda comum. (ANSA)