“Se conselho fosse bom, ninguém dava de graça.” O velho ditado ganha novos significados no Brasil de hoje, quando descobrimos que o principal conselheiro do presidente Jair Bolsonaro é o pastor Silas Malafaia. A confissão foi feita pelo filho zero um do presidente, Flávio, durante a CPI da Covid. Em mais uma tentativa de “lacração”, tática frequente do bolsonarismo, o homem da mansão de R$ 6 milhões acreditava que a simples menção ao pastor evangélico colocaria os integrantes da comissão em maus lençóis – não porque ele teria qualquer credibilidade para se opor à CPI, mas apenas porque ele tem sob sua influência milhões de fiéis que acreditam no que ele fala.

Em primeiro lugar, é difícil compreender por que um presidente – qualquer um – teria um pastor como conselheiro durante uma pandemia. Isso daria para entender se ainda vivêssemos na era das cavernas, quando as orientações sobre saúde eram feitas pelo líder religioso da tribo, geralmente um curandeiro charlatão. De certa forma, é essa a função de Malafaia na tribo que virou o Brasil: ele pode ser um excelente orientador religioso, uma pessoa boa e temente a Deus. Mas entende tanto de medicina quanto eu entendo de física quântica: porcaria nenhuma. O pastor é especialista, sim, em outro assunto: ganhar dinheiro. Segundo ranking da revista Forbes, ele tem R$ 400 milhões na conta. Nada mal para quem comanda uma igreja com milhões de seguidores que, devido à pandemia, mal têm o que comer.

O único conhecimento que Silas Malafaia tem sobre a Covid-19 é o fato de ter sido diagnosticado com a doença em março. Desde então, defende o “tratamento precoce”, aquele que o mundo inteiro sabe que não funciona. Na cabeça dele, porém, o poder da auto-sugestão é enorme – isso explica seu sucesso como pastor. Afirmou que o kit Covid “não cura, mas ameniza o impacto desta enfermidade”. Malafaia não é médico. Não é cientista. Não tem a menor ideia do que está falando. Se for convocado para a CPI, vai falar o quê?

Falar a verdade não parece importar muito no Brasil de hoje, onde testemunhas mentem na CPI e saem de lá em seus carros blindados, quando deveriam sair em camburões. O apoio de Malafaia a Bolsonaro tem uma simples razão: a Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo e a editora Central Gospel, dirigidas por ele, devem R$ 4,6 milhões em impostos. Os dados são da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. O pastor alega que os valores ainda são questionados na Justiça e na Receita. Depois de ver o tamanho da dívida do pastor, fica fácil entender por que ele é o principal conselheiro de Bolsonaro – se conselho fosse bom ninguém daria de graça.