“Falaram que precisavam de mim porque eu era mulher e precisavam de uma quantidade de mulheres. Agora fico até envergonhada, porque amigos vêm me perguntar e tenho que explicar o que ocorreu.” A pedagoga Ana Cláudia de Sá, de 30 anos, foi candidata a deputado estadual pelo PTC do Amapá e uma das 24 pessoas que não receberam nem mesmo o próprio voto nas eleições deste ano. Destas, 21 são mulheres.

A moradora de Santana, a 20 quilômetros de Macapá, disse que o partido prometeu apoiar a candidatura de seu marido para a Assembleia Legislativa do Estado se a sigla também pudesse registrá-la na disputa como postulante a uma vaga na Assembleia. “O partido não me ajudou em nada. No final, votei no meu marido”, afirmou.

Com exceção de quatro das 21 candidatas, todas não arrecadaram nem gastaram nada – inclusive Ana Cláudia. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), candidaturas que “não receberam qualquer apoio das legendas partidárias, com aporte insignificante de recursos ou com votação ínfima ou não existente,” podem indicar o que o tribunal considera como “candidaturas laranjas”.

Se por votação ínfima forem consideradas as candidatas com até 5 votos e sem arrecadação, o patamar sobe para 95 nomes – ante 36 homens.

Apesar disso, o número de mulheres sem voto neste ano caiu consideravelmente. Na avaliação da pesquisadora do Grupo de Estudos de Gênero e Política da USP Hannah Maruci, quando o Supremo Tribunal Federal determinou que os partidos deveriam não apenas reservar, mas preencher 30% das vagas com candidatas, em 2012, as legendas perceberam que poderiam ser punidas. “(Há) casos em que a chapa caiu por conta desse tipo de fraude. O Ministério Público teve papel muito importante nesse processo”, disse a pesquisadora.

Apesar de as “candidaturas laranjas” não serem novidade no cenário eleitoral, a Justiça ainda não criou uma jurisprudência de punição. Desde junho está pronto para julgamento no plenário do TSE parecer do Ministério Público Eleitoral a respeito de três casos recursais de fraudes na cota para mulheres nas eleições de 2016.

O procurador-geral eleitoral, Humberto Jacques de Medeiros, disse que, após a eleição, o Ministério Público Eleitoral deve analisar todos os casos suspeitos. “Existe uma metodologia usual de verificar isso, zero voto, se os recursos foram repassados, mas tem que olhar os casos concretos. A pessoa pode ter morrido, adoecido, desistido. Vamos passar um pente-fino.”

No entanto, nem todas as candidatas com zero voto foram lançadas para cumprir cota. O jornal O Estado de S. Paulo conseguiu contato com outras duas mulheres que disseram ter desistido por falta de apoio da sigla. “Cheguei a fazer campanha com as pessoas mais próximas, mas percebi que não teria força para me eleger e resolvi apoiar outro deputado estadual”, disse Débora Melo (PTC-RO). Ela não recebeu repasses da legenda.

Partidos

Além do PTC, o Podemos e o Democracia Cristã (DC) tiveram o maior número de candidatas sem votos. O presidente do PTC no Amapá, Guaraci Silveira Júnior, negou irregularidade na candidatura de Ana Cláudia. Segundo ele, essa situação ocorre quando um candidato desiste da campanha depois de registrado. “Nunca tivemos problema para cumprir cota de mulheres.”

O diretório regional do Podemos no Acre disse que a candidata que não recebeu votos desistiu da campanha por problemas pessoais. A reportagem não conseguiu contato com os diretórios do Amapá, Roraima e Rondônia. A reportagem procurou o PTC de Rondônia e o DC, mas não obteve resposta. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.