Maioria do Supremo apoia juiz de garantias

Nelson Jr./SCO/STF
Foto: Nelson Jr./SCO/STF

A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) apoia a criação do juiz de garantias, prevista na lei anticrime sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no dia 25. Seis integrantes da Corte ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo indicaram concordar com a medida, que divide a condução e o julgamento dos processos entre dois juízes.

Prevista para entrar em vigor no dia 23 de janeiro em todo o País, a implantação do juiz de garantias já foi contestada pelo Podemos e por associações de classe, como a dos Magistrados Brasileiros (AMB) e dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), que recorreram ao Supremo para suspender o dispositivo. Esses grupos criticam a possibilidade de aumentar custos do Legislativo e de atrapalhar investigações em andamento.

Entre quem defende a nova regra está a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que se manifestou pela constitucionalidade da lei. Um dos principais argumentos a favor da medida é a preservação da imparcialidade dos julgamentos. Na Operação Lava Jato, alguns advogados questionaram a proximidade entre a acusação e o então juiz Sérgio Moro, hoje ministro da Justiça e da Segurança Pública.

Atualmente, o juiz que analisa pedidos da polícia e do Ministério Público na investigação é o mesmo que pode condenar ou absolver o réu. De acordo com a nova lei, o juiz de garantias deverá conduzir a investigação criminal e tomar medidas necessárias para o andamento do caso, como autorizar busca e apreensão e quebra de sigilo telefônico e bancário, até o momento em que a denúncia é recebida. A partir daí, outro magistrado vai ouvir o réu e as demais partes e dar sua sentença.

A discussão provocou polêmica no governo. A aprovação da lei no Congresso foi vista como uma derrota de Moro, que orientou Bolsonaro a vetar o novo dispositivo, mas não foi seguido. Como revelou o O Estado de S. Paulo, Bolsonaro recebeu aval do presidente do STF, Dias Toffoli, para sancionar a medida.

O ministro Ricardo Lewandowski, crítico do que considera excessos cometidos pelo Ministério Público em investigações, afirmou para a reportagem que “o juiz de garantias é um avanço civilizatório”. Para Gilmar Mendes, também crítico da Lava Jato, o pacote anticrime e a lei de abuso de autoridade foram os “dois projetos mais importantes da década” no Judiciário.

Segundo o ministro Marco Aurélio Mello, a proposta é uma “opção política-normativa interessante”. “É aguardar a experiência. Vejo com bons olhos.”

O relator no STF das ações contrárias ao juiz de garantias é o ministro Luiz Fux, que assumirá o plantão de 19 a 29 de janeiro. O gabinete de Fux informou que o ministro está fora do Brasil e não se manifestaria.

Integrantes da Corte avaliam que, se Fux der uma liminar para suspender a medida, seria um “enfrentamento” a Toffoli, que criou um grupo de trabalho no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para discutir o tema e propor, até 15 de janeiro, uma norma para sua aplicação.

Na visão de Toffoli, a medida deve ser aplicada em processos futuros, sem retroagir a ações em andamento, e só valer para a primeira instância. “Já há experiências exitosas que garantem maior imparcialidade do magistrado que vai julgar a causa sem estar contaminado pela coleta das provas”, afirmou Toffoli, que prevê um regime de transição de seis meses.

Em nota, o ministro Celso de Mello disse que a criação do juiz de garantias é uma “inestimável conquista da cidadania”. “Além de assegurar a necessária imparcialidade do magistrado, representa a certeza de fortalecimento dos direitos e garantias fundamentais da pessoa sob investigação criminal.”

O ministro Alexandre de Moraes considera uma “opção legítima” feita pelo Congresso. “Haverá, como em vários países, uma divisão de competências entre juízes, ambos serão independentes e com as garantias da magistratura”, afirmou Moraes ao Estado no domingo, 29.

Procurados, os demais ministros não se posicionaram.

Um parecer do último dia 17, elaborado pela equipe de Moro e assinado em conjunto com a Advocacia-Geral da União (AGU), observa que em crimes complexos, como corrupção e lavagem de dinheiro, a investigação se desenrola por anos e se divide em fases ou operações. “Nesses casos, o juiz, durante a fase investigativa, tem fundamental importância, haja vista que acompanha todo o desenrolar da atuação policial e do Ministério Público. Ao cindir as atribuições, contudo, todo este trabalho árduo de anos seria ‘perdido'”, alerta o texto.

Para o presidente da Ajufe, Fernando Mendes, “a questão é saber se a maneira como a lei foi criada será considerada correta.” (Colaboraram Amanda Pupo e Pepita Ortega). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.