O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para reconhecer que o porte de maconha não é crime no País, se for para consumo próprio. Os ministros continuam debatendo critérios objetivos para diferenciar usuários e traficantes, como, por exemplo, quantidade de droga.

+ STF forma maioria para descriminalizar porte de maconha para uso pessoal
+ Entenda voto de Toffoli que formou maioria no STF para descriminalizar maconha para uso pessoal

Maconha foi liberada?

Não. Isso não quer dizer que a maconha foi liberada no País, nem que haverá comércio legalizado da planta ou das flores prontas para consumo. A decisão do Supremo abarca somente o porte da substância, em quantidades que ainda serão decididas. A decisão só passará a ter efeitos práticos quando o julgamento for encerrado e o acórdão publicado.

Lei das drogas

A Lei de Drogas, aprovada em 2006, não pune o porte da substância com pena de prisão. Com isso, os ministros declararam que esse não é um delito criminal, mas um ilícito administrativo. Assim, quem for pego com maconha para uso pessoal não passaria a ter antecedentes criminais.

Na tarde desta terça-feira, 25, o ministro Dias Toffoli complementou seu voto da semana passada, que havia causado confusão de entendimento. Ele admitiu que não foi claro em seu voto e fez a retificação no julgamento, que foi retomado nesta terça.

Saiba como foram os votos dos ministros até agora:

Gilmar Mendes

O relator do caso, ministro Gilmar Mendes, abriu o julgamento em agosto de 2015 defendendo a descriminalização do porte de qualquer tipo de droga para consumo próprio. Posteriormente, após o voto de Edson Fachin, ele reajustou o entendimento para restringir a medida apenas para o porte de maconha e pela fixação de parâmetros que possam diferenciar o tráfico do uso pessoal.

“Despenalizar sim, mas mais do que isso: emprestar o tratamento da questão no âmbito da saúde pública e não no âmbito da segurança pública”, afirmou.

Edson Fachin

Atual vice-presidente da Corte, o ministro Edson Fachin defendeu que o artigo nº 28 da Lei de Drogas é inconstitucional exclusivamente em relação à maconha. Segundo o magistrado, é necessário que o Congresso Nacional fixe parâmetros para diferenciar traficantes de usuários.

“O dependente é vitima e não criminoso germinal. O usuário em situação de dependência deve ser tratado como doente”, disse.

Luís Roberto Barroso

O ministro Luís Roberto Barroso, atual presidente do STF, votou pela descriminalização do porte de maconha para uso pessoal e propôs como parâmetro para a diferenciação do crime de tráfico para o uso pessoal a posse de 25 gramas da substância ou a plantação de até seis plantas fêmeas da cannabis sativa.

“O que nós queremos é evitar a discriminação entre ricos e pobres, entre brancos e negros. Nós queremos uma regra que seja a mesma para todos. E fixar uma qualidade impede esse tipo de tratamento discriminatório. Ninguém está legalizando droga.”

Alexandre de Moraes

O ministro Alexandre de Moraes sugeriu que as pessoas flagradas com até 60g de maconha, ou que tenham seis plantas fêmeas, sejam presumidamente declaradas como usuárias pela Justiça. O magistrado explicou que chegou a esses números a partir de um estudo sobre o volume médio de apreensão de drogas no Estado de São Paulo, entre 2006 e 2017.

“Quem conhece o Direito Penal, sabe que só é crime o que é apenado com reclusão e detenção e só é contravenção o que é apenado com prisão simples”, afirmou Moraes.

Posteriormente, o relator Gilmar Mendes incluiu os parâmetros sugeridos por Moraes no voto dele.

Rosa Weber

Quando ainda estava na Corte, a ministra aposentada Rosa Weber também deu um parecer favorável à liberação do porte de maconha, declarando que a criminalização da conduta é desproporcional, por atingir de forma veemente a autonomia privada.

A ministra também observou que a mera tipificação como crime do porte para consumo pessoal potencializa um preconceito que recai sobre o usuário, dificultando o tratamento e a reinserção dos dependentes químicos na sociedade.

“Essa incongruência normativa, alinhada à ausência de objetividade para diferenciar usuário de traficante, fomenta a condenação de usuários como se traficantes fossem”, disse. O novo ministro do STF, Flávio Dino, que assumiu a cadeira de Rosa Weber em fevereiro, está impedido e não vota no caso.

Cristiano Zanin

Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ministro Cristiano Zanin abriu a divergência no julgamento ao ser o primeiro a negar a descriminalização da maconha para uso pessoal. O ministro considerou que a descriminalização somente seria possível se fossem definidas regras sobre como seria a oferta da droga legalizada. Ele também entende que a medida pode agravar problemas de saúde e segurança da população.

De acordo com o magistrado, a alteração do artigo 28 da Lei de Drogas foi feito com para despenalizar e não para descriminalizar o porte de drogas. Com isso, segundo ele, não seria possível, pela via judicial, alterar a determinação feita pelo Congresso Nacional.

“Não tenho dúvida de que os usuários de drogas são vítimas do tráfico e das organizações criminosas, mas se o Estado tem o dever de zelar pela saúde de todos, tal como previsto na Constituição, a descriminalização, ainda que parcial das drogas, poderá contribuir ainda mais para o agravamento desse problema de saúde”, declarou Zanin.

André Mendonça

O primeiro a votar em março deste ano, André Mendonça adiantou, logo no início da sua análise, que acompanharia a interpretação de Zanin. O ministro observou que há uma falsa consideração no senso comum de que a maconha não faz mal. Para o ministro, o uso do entorpecente é o “primeiro passo para o precipício”.

Mendonça também sustentou que a descriminalização do uso pessoal da droga deve ser feito pelo Legislativo. O magistrado indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sugeriu que a Corte proponha um prazo de 180 dias para fixar critérios objetivos para diferenciar o dependente químico do traficante e que, em caso de falta de uma resposta, seja fixada a quantidade de 10 gramas para tal.

“O legislador definiu que portar drogas é crime. Transformar isso em ilícito administrativo é ultrapassar a vontade do legislador. Nenhum país do mundo fez isso por decisão judicial”, disse Mendonça.

Kassio Nunes Marques

Acompanhando Zanin e Mendonça, Nunes Marques também endossou que a decisão deveria caber ao Legislativo. O ministro também observou que a maconha não afeta apenas o dependente químico, como também os familiares e a sociedade em geral.

Para ele, o objetivo do Congresso em criar o artigo nº 28 da Lei de Drogas foi a de afastar o perigo das drogas do ambiente social brasileiro.

“A grande preocupação da maioria das famílias brasileiras não é se o filho vai preso ou não. A preocupação é que a droga não entre na sua residência. Para isso, a lei tem hoje um fator inibitório. A sociedade brasileira precisa de instrumentos para se defender”, afirmou.

Dias Toffoli

O ministro já tinha votado na quinta-feira, 20, mas apresentou complemento e esclareceu que “há seis votos pela descriminalização”. Toffoli, porém, defendeu a não criminalização de qualquer droga, e não apenas a maconha.

Segundo Toffoli, a criminalização das drogas tem base em preconceito e xenofobia e, portanto, não é a “melhor política pública adotada por um Estado social democrático de direito”.