Muita gente ficou surpresa com o sucesso de Lupin, a maior audiência do primeiro semestre segundo a Netflix e a primeira série francesa a debutar no Top 10 do serviço de streaming nos Estados Unidos. Afinal, os livros de Maurice Leblanc sobre Arsène Lupin, publicados no começo do século 20, não são tão conhecidos fora da França. Mas é fácil de entender assistindo aos cinco primeiros episódios – e à Parte 2, com outros cinco capítulos, que estreia nesta sexta, 11, na plataforma. Há o carisma e o talento de Omar Sy, as locações parisienses, o ladrão elegante e esperto, sempre um passo adiante da polícia e dos seus adversários e que também é um homem de família, e comentários sobre racismo, preconceito e disparidade social espalhados pela história ágil.

Quem, afinal, nos dias de hoje, não gosta de ver uns ricos se dando mal? “Eu acho que esse já era um dos motivos do sucesso dos livros, eram pessoas comuns contra o sistema”, disse ao Estadão Omar Sy, que faz o personagem principal, Assane Diop, filho de imigrante senegalês que se inspira em Lupin. “E hoje sentimos muito, obviamente, a desigualdade. Foi por isso que decidimos fazer a série. Dá para se divertir muito, porque é uma coisa de Davi contra Golias.” Para o showrunner George Kay, o fato de Assane roubar dos ricos faz com que seus crimes não tenham vítimas. “Ele tira de quem pode perder dinheiro ou tem seguro. Assim, o espectador não se sente mal de torcer por ele.”

Assane começou a série sedento de vingança pela prisão injusta e o consequente suicídio de seu pai, um imigrante senegalês acusado de roubar um colar de Anne (Nicole Garcia), mulher do poderoso Hubert Pellegrini (Hervé Pierre). Ele planejava a vingança enquanto equilibrava a vida familiar com Claire (Ludivine Sagnier), de quem está separado, e o filho do casal, Raoul (Etan Simon). Na Parte 2, há mais ação e mais drama, porque ele precisa salvar sua família. “Então ele está numa situação de conflito: continuo buscando vingança pelo meu pai ou foco em ser um bom pai?”, explicou George Kay, que descreveu os novos episódios como intensos, complicados e surpreendentes.

O personagem continua se valendo de sua astúcia, mas também da habilidade de passar despercebido, sendo um homem negro que se disfarça de faxineiro, cozinheiro, segurança, a que ninguém presta muita atenção. Ao mesmo tempo, ele sofre racismo e preconceito por ser filho de imigrante, algo especialmente explorado nas cenas de flashback. Kay, que é inglês e escreve os roteiros na sua língua, posteriormente traduzidos para o francês, desejava dar essa perspectiva de fora. “Eu vejo esses problemas e quero falar sobre eles. Eu não me importo se isso vai causar incômodos, porque é a coisa certa a fazer. E talvez ser do Reino Unido me dê um tanto de distanciamento para fazer isso”, disse ele, que conta com o apoio de Sy. “Mas não falamos só de racismo, e sim de outras injustiças da sociedade também, como gênero e idade.”

Para ele, muito avanço ainda é necessário, mas ter Omar Sy como a cara dessa versão moderna das histórias de Arsène Lupin mostra que alguma coisa mudou. “Se vamos representar a França contemporânea, não há ninguém melhor do que Omar Sy”, disse Kay. “E é maravilhoso que as pessoas de todo o mundo o vejam representando a França, porque esta é a realidade.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.