Lula deixou para a última semana do ano a tarefa de completar as peças mais difíceis de seu governo: incorporar o centro democrático e o Centrão. Difíceis para ele, é bom dizer. Deixar para a reta final o anúncio de Marina Silva e de Simone Tebet indica que o seu governo, petista em todos os aspectos, relegou aos setores mais moderados da sociedade um papel coadjuvante, acessório. Sem contar que essas duas líderes já sofrem a fritura dos pretensos aliados, algo tradicional nos governos petistas.

Já o Centrão está sendo acomodado em negociações que têm o único objetivo de garantir o apoio do Congresso. Ministérios com orçamento polpudo e os tradicionais alvos do grupo fisiológico, como Codevasf, Fundeb, Dnit, Funasa etc. devem cair no colo dos líderes do Centrão que até recentemente abraçavam Bolsonaro, independentemente do ministro à frente das respectivas pastas.

Lula não montou um ministério “para o futuro”, ou seja, um corpo técnico alinhado com as melhores práticas. Talvez isso seja possível nas áreas sociais: Meio Ambiente, Saúde e Educação, que exibirão nomes respeitáveis e comprometidos com políticas públicas. Fora desses setores, a gestão será apenas de petistas ou de seus antigos satélites. Chama a atenção que os nomes mais próximos de Lula em sua provação em Curitiba sejam os mais poderosos, na linha de frente ou nos bastidores, como Gleisi Hoffmann.

São escolhas compreensíveis e legítimas, já que o novo presidente tem o direito de se cercar da equipe em que mais confia. Mas 2023 será muito diferente de 2003. O benefício da dúvida não existe mais. A lua-de-mel já está acabando, e a sociedade parece mais aliviada com a despedida de Bolsonaro do que com a posse da nova equipe. Isso é verdade especialmente na Economia, já que Lula se cercou praticamente do mesmo time que levou ao desastre a gestão Dilma Rousseff.

O novo ministro dos Portos, Márcio França, já decretou o fim da privatização do porto de Santos. Ou seja, a porta de saída das exportações permanecerá travada e sucateada, como um gargalo a serviço do balcão de negócios da baixa política. Novas privatizações já foram descartadas pelo próprio presidente. E a “política industrial” que fracassou em toda a era petista deverá ser ressuscitada com dinheiro público farto e subsidiado, apesar das promessas em contrário. A marcha da desindustrialização deve prosseguir sem qualquer preocupação com o aumento da produtividade e a diminuição do custo Brasil. De prático, apenas a expansão da máquina pública, o fim do teto de gastos e a volta da ocupação política das estatais, a começar da Petrobras. O pessimismo com a economia, que cresce, reflete essas opções.

Ao apostar em fórmulas que já deram errado, Lula queima capital político precioso. Esperava-se que montasse um governo de conciliação nacional para diminuir a polarização. Ao contrário, parece ter dobrado a aposta no petismo. O momento político e econômico no País e no mundo são totalmente distintos de 20 anos atrás. No dia 1°, a sociedade pode respirar aliviada por ter garantido que a democracia triunfasse. Mas a celebração ainda é cercada de temor: o que se espera é um novo tempo de prosperidade, e não mais um capítulo de um lamentável ciclo.