A aposentadoria antecipada do ministro Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal, anunciada em 9 de outubro, coloca nas mãos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a tarefa de indicar um substituto para o magistrado na corte.
Os mais cotados são Jorge Messias, ministro-chefe da AGU (Advocacia-Geral da União), o ex-presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e Bruno Dantas, ministro do TCU (Tribunal de Contas da União). Sem prazo definido para o anúncio, o escolhido será sabatinado pelo Senado e, caso obtenha maioria de votos favoráveis, empossado ministro.
Neste texto, a IstoÉ mostra o que o histórico de indicações do petista prenuncia para sua próxima decisão.
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Quem Lula já indicou
Ao longo de seus mandatos na Presidência da República, entre 2003 e 2010, e novamente desde janeiro de 2023, Lula escolheu 10 nomes para o STF. Foram eles:
— Cezar Peluso, em 2003 (aposentado em 2012);
— Ayres Britto, em 2003 (aposentado em 2012);
— Joaquim Barbosa, em 2003 (aposentado em 2014);
— Eros Grau, em 2004 (aposentado em 2010);
— Ricardo Lewandowski, em 2006 (aposentado em 2023);
— Cármen Lúcia, em 2006;
— Carlos Alberto Menezes Direito, em 2007 (morto em 2009);
— Dias Toffoli, em 2009;
— Cristiano Zanin, em 2023;
— Flávio Dino, em 2024.
A chegada de Lula ao Palácio do Planalto foi antecedida em seis meses pela chegada de Gilmar Mendes ao Supremo. Hoje decano, ele havia chefiado a Advocacia-Geral da União sob Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e ungido pelo próprio à corte.
O movimento contrariou um histórico que, como descreveu o ministro aposentado Cezar Peluso, colocava a cadeira como o “máximo da consagração da carreira” de um jurista. “Embora o cargo não seja de carreira, é o máximo que se pode aspirar no direito”, afirmou, lembrando que, no geral, a indicação sucedia atuação longa e reconhecida no mundo jurídico, em uma lógica de progressão profissional.
O próprio Peluso, escolha inaugural do petista, havia sido desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entre 1986 e sua nomeação, em 2003. A atuação prolongada no Tribunal de Justiça paulista também precedeu a indicação de Roberto Lewandowski para a corte.
Ayres Britto, Joaquim Barbosa e Cármen Lúcia tiveram carreiras extensas como Procuradores de Justiça nos estados de Sergipe, Rio de Janeiro e Minas Gerais, respectivamente. Por sua vez, Menezes Direito foi por uma década ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), enquanto Eros Grau construiu uma trajetória reconhecida na Academia, lecionando em instituições como a Universidade de Sorbonne, em Paris, e a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), antes de vestir a toga.

Dias Toffoli chegou ao STF após chefiar Advocacia-Geral da União sob Lula: cenário pode se repetir
Lula viria a escolher um advogado-geral da União, como fez seu antecessor, apenas em 2009. Antes mesmo do cargo no Palácio do Planalto, Toffoli foi advogado do petista nas campanhas eleitorais de 1998, 2002 e 2006, assessor da liderança do PT na Câmara dos Deputados e de José Dirceu no Ministério da Casa Civil antes de assegurar o posto na corte. Na época, a escolha foi retratada pela imprensa como da “cota pessoal” do mandatário.
Às vésperas de ter Dilma Rousseff (PT) representando-o nas eleições de 2010, Lula teve a gestão fragilizada pelo “Mensalão”, esquema de corrupção que levou lideranças petistas — como o próprio Dirceu — para a cadeia e tinha no Judiciário um eventual ponto de problemas futuros. No STF, Toffoli é um dos magistrados que mais se opõem à Operação Lava Jato, mas também ficou no alvo do PT ao proibir o petista, na prisão, de ir ao velório do próprio irmão, Genival Inácio da Silva, em 2019.
De volta ao poder, Lula fez escolhas ainda mais próximas para as duas vagas que se abriram na corte. Em abril de 2023, com a aposentadoria de Ricardo Lewandowski, indicou Cristiano Zanin, seu advogado pessoal na própria Lava Jato, quando acabou preso por corrupção ativa e lavagem de dinheiro — condenação depois revogada pelo STF.
“Eu acho que todo mundo esperava que eu fosse indicar o Zanin, não só pelo papel que ele teve na minha defesa, mas simplesmente porque eu acho que o Zanin se transformará num grande ministro da Suprema Corte desse país”, disse o presidente na ocasião.

Cristiano Zanin: ministro do STF depois de advogar para Lula na Lava Jato
Meses depois, com a aposentadoria de Rosa Weber, o petista tirou do Ministério da Justiça Flávio Dino para ungi-lo à sucessão da ministra. Antes do cargo na Esplanada, Dino teve Lula e o PT ao seu lado nos oito anos como governador do Maranhão, ainda filiado ao PCdoB, e se elegeu senador em 2022 também em relação de apoio mútuo.
Além da proximidade política, a escolha foi duramente criticada mesmo por setores alinhados ao governo pela troca de uma ministra por um ministro, tornando Cármen Lúcia a única mulher no STF — ao longo da história, apenas três ocuparam uma cadeira na corte. Ao anunciar a aposentadoria, Barroso defendeu que sua substituta fosse mulher.
O próximo capítulo
No entorno do presidente e na visão de analistas, no entanto, há certo consenso de expectativa por outra escolha movida pela proximidade política, mesmo que cumprindo os requisitos para o cargo. Para Álvaro Jorge, professor da FGV-RJ (Fundação Getulio Vargas) e autor de “Supremo Interesse: a Evolução do Processo de Escolha dos Ministros do STF” (Synergia, 2020), esta cálculo leva em conta o apoio no Senado, onde um candidato sabatinado não é reprovado desde 1894, no governo do marechal Floriano Peixoto.
“A vontade do presidente precisa ser complementada pela dos senadores. Para definir a indicação, há uma avaliação prévia de qual é o nome mais palatável, com chances efetivas de aprovação. Muitos nomes são cogitados e nem sequer chegam a público porque há uma consciência da dificuldade de serem aprovados”, disse à IstoÉ.

Ministro cumprimenta senadores ao final da sabatina: desde 1894, nenhuma indicação presidencial foi barrada na Casa
Para o professor, as escolhas de ex-advogados-gerais da União — além de Mendes e Toffoli, o ministro André Mendonça ocupou o cargo antes de ser levado à corte por Jair Bolsonaro (PL) — e ministros da Justiça — Nelson Jobim, com Fernando Henrique Cardoso, e Alexandre de Moraes, com Michel Temer (MDB), antes de Dino — refletem uma mudança na própria dinâmica do Supremo.
“Nos últimos anos, o cargo ficou sob o crivo constante do Legislativo e da própria sociedade, como anteriormente não ocorria, porque há um poder mais duradouro e impactante do que em cargos eletivos. Os últimos presidentes têm tentado evitar indicar pessoas cujo pensamento eles não conheçam bem”, disse. “O que não se confunde com subserviência ou vinculação à vontade de quem indica. O próprio ministro Barroso, escolhido por Dilma Rousseff, contrariou claramente seus interesses ao votar pela prisão de Lula”.