Chega a ser um alívio nos dias de hoje a simples ideia de que o presidente da República, líder maior da Nação pela natureza do cargo, esteja completamente engajado nos esforços por soluções para a mais recente tragédia que se abateu sobre os brasileiros devido às chuvas. Lula, de pronto, suspendeu a sua folga dos dias de Momo, voou para o epicentro do drama em São Paulo, organizou os trabalhos das equipes de resgate, estruturou a logística do salvamento, deliberou medidas de urgência, concedeu benefícios aos desassistidos, foi diretamente vivenciar a situação de quem sofria com as perdas (humanas e materiais). Tudo que, normalmente, deveria ser esperado de alguém que senta na cadeira do Planalto para comandar o País. O fato é que tornou-
se mister enaltecer essa que “deveria” ser a postura previsível de um mandatário, após os tenebrosos anos do descaso bolsonarista, nos quais o antecessor de Lula simplesmente ignorava o papel a exercer nas tragédias, andava de jet ski e falava em manter a sua curtição enquanto o caos tomava conta. Ocorreu exatamente assim, mais ou menos no mesmo período, em 2021, quando a Bahia foi tomada por temporais e dezenas de pessoas morreram. Em tom de deboche e enfado com os eventos que se sucediam, a reação do capitão à época foi a de um simples: “espero não ter de retornar antes”, como alegou em alto e bom som para quem quisesse ouvir, enquanto dava seus mergulhos midiáticos. Exatamente assim, nessas palavras. Depois da afronta, seguiu na diversão pelas praias do litoral catarinense. Nem pensou em interromper o descanso. Imagina! Virou recorrente no seu comportamento o princípio de “que se danem os problemas dos outros!”. Parte dos seguidores mais fanáticos, por incrível que pareça, acabou até se acostumando com tamanha aberração. Algo que, na essência, era resumida na expressão, tantas vezes repetida por ele, “e daí?”, recebida sempre com risos pelos convivas bajuladores. A cada cobrança que surgia em virtude da negligência sistemática, o “mito” tratava de tirar o corpo fora. Com Jair Messias Bolsonaro o Brasil decerto conheceu o horror da insensatez em pessoa. Talvez movido por uma psicopatia que o deixava absolutamente insensível às aflições humanas, aquele capitão nunca percebeu a responsabilidade que lhe era devida nos quatro anos de poder. Jamais! Quando, do Oiapoque ao Chuí, milhões mergulharam no terrível desespero da pandemia da Covid – todos viram! –, ele tripudiou sobre a doença, inclusive dos contaminados, chamando-os de “maricas”, exigindo que deixassem de “frescura”, anunciando o “não sou coveiro” e ficando completamente alheio à calamidade social. É bom lembrar daquele pesadelo monstruoso, que fique bem registrado, para que jamais volte a ocorrer de novo. Bolsonaro minou a dignidade dos brasileiros, corroeu o fundamento da moralidade pública, a tal ponto que, no seu modo de ver, existiam dois segmentos a serem tratados de maneira distinta: o dos merecedores de sua compaixão e auxílio – agrupados como aliados que diziam amém aos seus desígnios – e o daqueles para quem qualquer desgraça era pouca. No caso, os opositores, deixados à míngua e relegados à própria sorte. Os mesmos paulistas, em outra ocasião, quando governados por João Doria, vivenciando mais uma temporada de catástrofes climáticas, não foram dignos de receber um centavo sequer dos cofres federais porque o “mito” alegava que não ajudaria Estados dirigidos por seus adversários. Com Doria, Bolsonaro travou uma guerra abjeta contra as vacinas. Protelou até quando pôde a compra dos imunizantes da Covid e somente a fez para reagir à iniciativa do governador paulista que, de maneira pioneira e determinada, conseguiu trazer as primeiras doses salvadoras ao País. Somente depois disso o presidente negacionista correu atrás. O estrago de Bolsonaro no campo da Saúde é notório e pode ser medido em números e por meio de infindáveis episódios de menosprezo tácito. O ex-mandatário, na prática, desmontou a estrutura de prevenção nacional de desastres. Na área da Defesa Civil, o orçamento para obras de contenção de encostas foi reduzido a quase zero. O atual ministro do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes, disse ter encontrado em caixa apenas R$ 25 mil para tal destinação. O número é esse mesmo. Em 2022, durante o último ano de desgoverno Bolsonaro, 457 pessoas morreram vítimas dos estragos promovidos pelas chuvas. E a resposta dele foi passar a lâmina nos recursos, cortando 94% da verba existente. O sucessor Lula, de pronto, virou a chave. Já estabeleceu a antecipação do pagamento dos valores do Bolsa Família para as comunidades carentes mais atingidas. Também abriu o saque do FGTS e está buscando parcerias com o empresariado para a reconstrução de vias e localidades destruídas. Não é mero proselitismo, nem jogo de cena político. Sinaliza, antes de tudo, prioridades. A presença de autoridades nas regiões afetadas por calamidades como essa última transmite segurança maior aos necessitados, sensação de acolhimento, demonstração de que há alguém preocupado com eles. E nisso, ficou evidente, mais uma vez, existe mesmo uma larga distância entre Lula e Bolsonaro.