As Edições Sesc SP lançam o novo volume da série Mutações, organizada por Adauto Novaes, trazendo uma coletânea de 18 ensaios que exploram a coragem como virtude essencial em um contexto de declínio político e moral. A obra traz contribuições de intelectuais como Francis Wolff, Eugênio Bucci, Jorge Coli, Lilia Moritz Schwarcz, Maria Rita Kehl, Olgária Matos, Oswaldo Giacoia Junior, Vladmir Safatle, entre outros, que analisam a relação entre coragem, medo e verdade, e como esses elementos moldam ações e comportamentos em tempos de crise.

Com uma abordagem filosófica, os autores discutem a coragem não apenas como bravura, mas como um imperativo moral para enfrentar as adversidades e redefinir o nosso entendimento de virtude na contemporaneidade. Os ensaios foram escritos para o ciclo de conferências Mutações: sobre a coragem e outras virtudes, concebido pelo Centro de Estudos Artepensamento e realizado pelo Centro de Pesquisa e Formação do Sesc São Paulo, entre 6 de junho e 2 de agosto de 2022. Em seu texto de apresentação do ciclo, Novaes afirma que a iniciativa buscou responder a uma questão fundamental para a existência da democracia hoje: “como repensar a teoria da coragem em meio ao declínio de uma época, momento que o filósofo italiano Giorgio Agamben chamou de ‘tempo de trevas’? Ou seja, como repensar a teoria da coragem hoje?”.

Em seu texto de apresentação, o diretor do Sesc São Paulo, Luiz Deoclecio Massaro Galina, fala que, neste livro, conjugam-se as dimensões moral e política dessa virtude, para que se indague o medo, seu principal obstáculo, mediante os expedientes da justiça, da prudência e, no limite, da sapiência. Segundo ele, conceber o processo social de forma crítica, para o Sesc, inclui o fomento às investigações de fôlego, de cunho filosófico, sobre emoções mobilizadoras dos nossos modos de viver junto, em meio a pressões estruturais que atravessam e impactam – quando não corrompem – essas investigações.

No texto da orelha, o filósofo Eugênio Mattioli Gonçalves lembra que “conservamos em nosso imaginário comum a representação da coragem na figura do herói, encarnada no homem que, movido por um ideal, se dispõe a enfrentar as forças que lhe são superiores”. Nessa narrativa, que vem das epopeias gregas, o herói “se vê inserido em um universo maniqueísta, simples e finito, em geral dividido entre uma massa de pessoas comuns, alheias aos grandes acontecimentos, e o corajoso, que por meio de sua virtude se destaca dos demais”. Gonçalves afirma que não é esse tipo de coragem que Mutações busca, mas a coragem da resistência ao sistema escravocrata, do “ideal de uma coragem feminina, marcada não pelo medo da morte, mas pelo amor à vida”, em oposição ao padrão que ensina que ser corajoso é “ser homem”.

Reflexões contemporâneas

Em seu ensaio Sobre coragem e outras virtudes, que abre o volume, Adauto Novaes parte da opinião de Albert Camus – de que o século XX foi “o século do medo” – para refletir sobre o processo em que o medo dos deuses se converte no medo do tirano e, enfim, no medo de si. “Vemos assim uma guerra particular – a luta do medo interior contra o medo –, que tanto pode atrofiar o trabalho do espírito quanto resultar em cólera, violência contra si e contra o outro”.

Para ele, a coragem hoje tende a desaparecer, em um mundo no qual o homem foi destronado pela técnica. Sua reflexão passa por Paul Valéry, Friedrich Nietzsche, Hannah Arendt e outros pensadores que abordaram a questão da coragem para entender por que a política atual é dominada pelo medo e a coragem está em extinção.

No ensaio seguinte, Frédéric Gros aborda a “coragem da verdade”, defendida por Michel Foucault, para contar uma história da coragem desde a antiguidade. Os demais textos trazem diversos recortes e perspectivas sobre o tema da coragem e suas relações com patriarcado, antirracismo, ideologia, política e democracia, de autores como Denis Diderot, Francis Wolff, Eugênio Bucci, Jorge Coli, Lilia Moritz Schwarcz, Maria Rita Kehl, Olgária Matos, Oswaldo Giacoia Junior e Vladmir Safatle. Em conjunto, os ensaios formam um amplo panorama sobre como formulações filosóficas clássicas acerca da coragem, em seus diversos aspectos, ajudam a compreender nossos dilemas contemporâneos.

O organizador

Adauto Novaes é jornalista e professor; foi por 20 anos diretor do Centro de Estudos e Pesquisas da Fundação Nacional de Arte do Ministério da Cultura. Em 2000, fundou a empresa de produção cultural Artepensamento. 

Os ciclos de conferências que organizou resultaram nos livros de ensaios: Os sentidos da paixão; O olhar; O Desejo; Ética; Tempo e História (Prêmio Jabuti); Rede Imaginária: televisão e democracia; Artepensamento; A crise da razão; Libertinos/ libertários; A descoberta do homem e do mundo; A outra margem do Ocidente; O avesso da liberdade; Poetas que pensaram o mundo; O homem-máquina; Civilização e barbárie; O silêncio dos intelectuais; todos editados pela Companhia das Letras. Publicou ainda A crise do Estado-nação (Record, 2003), Muito além do espetáculo (Senac São Paulo, 2000), Oito visões da América Latina (Senac São Paulo, 2006), Ensaios sobre o medo (Senac São Paulo, 2007), O esquecimento da política (Agir, 2007), Mutações: ensaios sobre as novas configurações do mundo (Agir/ Edições Sesc SP, 2008), e A condição humana (Agir/ Edições Sesc SP, 2009).

Ficha técnica:

Mutações: sobre a coragem e outras virtudes
Organização
: Adauto Novaes
Edições Sesc São Paulo, 2024
Número de páginas: 368
ISBN: 978-85-9493-295-2
Preço de capa: R$ 75,00

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