Na quarentena, jovens que querem concorrer ao cargo de vereador têm apostado na organização de “encontros virtuais” para que possam se apresentar a potenciais eleitores. As reuniões acontecem em pequenos grupos, por meio de plataformas como o Zoom, e cumprem também o papel de angariar voluntários para a campanha. Nesse cenário, até clubes do livro viraram palco do debate político, e algumas reuniões chegam a propor aulas de dança para quebrar o gelo e motivar a discussão.

“A impressão que todo mundo tem é de que essa é a campanha mais estranha da face da Terra”, disse o pré-candidato a vereador em São Paulo Matheus Hector (Novo). “Com a pandemia, o Zoom surgiu meio no desespero, e vem da decadência das lives (transmissões ao vivo) do Instagram”, afirmou ele, que tem trabalhado semanalmente na organização desses encontros virtuais.

“É uma reunião em que o pré-candidato dá a cara a tapa e fala o que pensa e o que quer para a cidade”, relatou o estudante Gabriel dos Santos, um dos convidados para o encontro da última quinta-feira. Estudante de Administração Pública, Santos é entusiasta do formato, que considera ser capaz de abrir espaço para a participação dos cidadãos no processo eleitoral. “Como eu tenho um conhecimento do ponto de vista de renda que meus amigos não têm, falo coisas diferentes, então sinto a importância de eu estar nesse processo.”

Para a cientista política e pesquisadora do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Carolina de Paula, esse tipo de encontro “funciona como aquele velho trabalho de corpo a corpo, tão forte nas campanhas municipais”. “As campanhas locais têm essa proximidade, que o Zoom tenta trazer. Você pode até realizar, por exemplo, reuniões com temas específicos”, afirmou Carolina.

Pré-candidato a vereador em Maceió, Anísio Lima (PSDB) tem lançado mão dessa estratégia. “Eu falo para meus amigos que sou pré-candidato e que gostaria de me apresentar para amigos deles”, disse. “No início, para ficar mais rápido, a gente também segmentava essas reuniões: ‘Hoje vou conversar com o pessoal da empresa júnior, hoje com gente de projetos sociais, hoje com jovens de movimento estudantil e da igreja’, e assim a gente vai fazendo.”

Além da segmentação, ganham força outras estratégias de diálogo com o eleitorado. Caso da pré-campanha de Vivian Mendes (PT), que quer concorrer à Câmara Municipal de São Paulo. Vivian tem organizado um “clube do livro feminista” virtual, no qual cerca de 40 mulheres se encontram semanalmente para discutir a leitura de uma obra – o livro Presas que Menstruam, de Nana Queiroz, por exemplo, pautou alguns dos encontros, que também possibilitam que a pré-candidata apresente suas bandeiras.

“Tem bastante gente que acabou entrando na nossa pré-campanha por conta do clube, gente que participou e se interessou”, disse ela. “A eleição, principalmente de vereador, tem uma relação de muita proximidade. A gente tem que usar este momento, que as pessoas estão antenadas com a política, para formatar espaços que depois possam ter continuidade.”

Aproximação

Colega de partido de Vivian, a pré-candidata a vereador em São Paulo Luna Brandão tem buscado formas de dialogar com uma parcela mais ampla da população, e chegou a propor aulas de dança em encontros que organizou. Para ela, “atividades lúdicas e culturais” aproximam as pessoas do debate. “Você traz uma quebra para o ambiente da política, que é muito engessado.”

O repertório musical inclui faixas da cantora Ludmilla e de outros artistas. Só dança e aparece na tela quem se sentir à vontade, afirmou o militante petista Marco Aurélio Purini, um dos que organizam os encontros. A atividade, disse, ajuda a “quebrar o gelo, debater preconceitos contra o corpo e ter um tema gerador para organizar o debate”.

Para especialistas, iniciativas como essas estão de acordo com o que prevê a legislação eleitoral. “Não vejo qualquer violação nessas iniciativas”, afirmou o advogado e presidente da comissão de Direito Eleitoral do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), Fernando Neisser. Segundo ele, além das restrições típicas da campanha, o que o político não pode fazer, na pré-campanha, é pedir voto expressamente ou arrecadar doações que não venham por meio das vaquinhas virtuais, já regulamentadas pela Justiça.

Secretária-geral da Comissão de Direito Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB-SP), Maíra Recchia concorda. “Não vejo muita diferença disso em relação ao que eram os encontros privados nas residências, por exemplo, em pequenas reuniões.”

Maíra ressaltou ainda que, com o curto tempo de propaganda eleitoral permitido – 45 dias -, iniciativas como essas são importantes para que pré-candidaturas “sejam minimamente conhecidas pela sociedade”. “Senão, você gera uma disparidade muito grande entre os concorrentes, com uma grande vantagem para aqueles que já estão no poder, que têm uma visibilidade natural do cargo que ocupam.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.