O vigilante José Lopes levou 40 anos para pisar pela primeira vez em uma praia. Cercado de familiares, ele ainda tentava formar uma opinião sobre a nova experiência quando foi questionado: ” E aí, gostou?” De máscara, assim como todos os parentes, Lopes foi honesto: “Não sei. Acho que não sou muito de mar. A máscara atrapalhou, talvez. Não sei bem o que pode ou não fazer aqui. Foi estranho”.

Lopes deve dar uma segunda chance ao mar. A experiência dele foi a mais corriqueira em tempos pandêmicos. De modo geral, apesar dos visíveis esforços de comunicação, os banhistas do litoral sul vivem as mesmas incertezas do estreante: Pode armar o guarda-sol? E sentar na canga? Futebolzinho é liberado? Pode surfe, mas não pode dar um mergulho?

Na dúvida, a sensação é de que se pode tudo. Não à toa, fiscais da prefeitura do Guarujá percorrem grande extensão da Praia de Pitangueiras com a missão de orientar frequentadores sobre o que ainda está proibido. A abordagem quase sempre é seguida de alguma discussão (mesmo que civilizada) ou de alfinetadas irônicas por parte dos banhistas. Cadeiras e guarda-sóis eram retirados por um segundo, mas logo voltavam aos seus pontos. Partidas de futebol ou futevôlei eram interrompidas momentaneamente – para recomeçarem assim que a fiscalização tivesse ido embora.

Um dos fiscais relatou que o trabalho tem sido complicado: “Não é só juiz que tenta dar carteirada, não (referindo-se ao caso do desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira que, sem a proteção facial, destratou um guarda municipal)”, disse. “Tem gente que vem pra cima mesmo e quase parte para a agressão”, continuou.

Um dos salva-vidas da Praia do Guaiuba, no Guarujá, também relatou o quanto sua função tem sido ingrata. “O esporte no mar está liberado, mas o banho de mar ainda não. Não tenho autoridade, não posso, tirar as pessoas da água. Eu apelo para a consciência delas, mas é muito difícil.”

Fiscais, salva-vidas e moradores do litoral esperam ainda mais incompreensão e desobediência para este fim de semana do feriado de 7 de setembro. “Vai ser bruto, uma loucura. Estamos chamando a faixa de areia de faixa de Gaza”, disse uma fiscal da prefeitura do Guarujá. “No fim de semana, isso aqui vai ficar incontrolável”, comentou o banhista Weslen Jhonni, de 23 anos.

Mesmo os comerciantes estão assustados com as previsões de aglomeração. Elson de Oliveira, de 67 anos, dono do quiosque Céu e Mar, em Guaiuba, teme que seja impossível seguir as normas de distanciamento. “Vamos fazer o impossível, mas as pessoas também precisam colaborar e ter educação”, disse. Já na barraca de batidas em Santos, na pontinha da praia, Richard Moura, de 19 anos, decidiu não ir trabalhar neste fim de semana. “Com a covid, o risco não vale a pena.”

Na última quarta-feira, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciou que irá reforçar a fiscalização para evitar aglomerações no litoral durante o feriado. Os prefeitos solicitaram ao governo do Estado a realização de uma operação especial na orla das nove cidades da região, com o envio de policiais militares de outras regiões para apoiar o efetivo local e as guardas municipais.

Esperança

Mais otimista está o gerente do Parque Balneário Hotel, Reginaldo Cunha. Segundo ele, o hotel de Santos terá a ocupação máxima permitida (60% dos quartos). Por isso, todo o processo de higienização dos quartos vem sendo feito com afinco nos últimos dias. “Para evitar riscos, as camareiras podem arrumar um quarto ocupado apenas a cada três dias. Além disso, o processo de limpeza é feito com todos os equipamentos de segurança.”

As praias também estão sendo ocupadas com consciência. A aposentada Erotildes Medeiros, de 67 anos, não chega perto do calçadão sem levar um kit de proteção: álcool em gel, álcool líquido e cândida. “Ao ar livre, eu me sinto mais segura. Acho menos perigoso. Mas, ainda assim, todo o cuidado é pouco. Saio de casa com tudo o que eu posso para me proteger.”

Bom exemplo era o cuidado do vendedor de sorvete Dominiciano Antônio, de 35 anos. Além de manter o distanciamento e usar todos os equipamentos de segurança, ele também colocava álcool em gel na mão de cada cliente, principalmente crianças. “É o jeito que a gente tem de continuar trabalhando com segurança”, disse.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.