Lito Sousa, especialista em segurança aérea e autor do canal Aviões e Músicas, afirmou à IstoÉ que as irregularidades descobertas pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) na operação da Voepass não indicam um cenário geral de insegurança na aviação comercial brasileira.
“Posso afirmar que o padrão de segurança das três maiores empresas aéreas brasileiras é muito alto. Portanto, considero que o que ocorreu [com a Voepass] foi um caso isolado”, disse, mencionando o trabalho que realiza na formação de profissionais aeronáuticos.
“Não há indicação de um processo generalizado de
falta de segurança na aviação brasileira“
Ver essa foto no Instagram
Tragédia de Vinhedo
Em 9 de agosto de 2024, um ATR 72-500 operado pela Voepass ia de Cascavel (PR) a Guarulhos (SP) quando caiu em Vinhedo, no interior de São Paulo, depois enfrentar uma condição severa de formação de gelo e girar em parafuso chato. No trajeto, o sistema de degelo da aeronave foi acionado e desligado repetidamente.
Os 58 passageiros e quatro tripulantes a bordo morreram na maior tragédia da aviação brasileira desde a colisão do TAM 3054 no aeroporto de Congonhas (SP), em julho de 2007.
A Anac realizou uma operação assistida e descobriu que a companhia fez 2.687 voos sem manutenção adequada após esse episódio. Em março de 2025, o COA (Certificado de Operador Aéreo) da Passaredo — principal empresa do grupo — foi suspenso e, em 24 de junho, cassado por um período de dois anos.
Na decisão, a agência afirmou que a empresa cometeu falhas graves e persistentes nos sistemas de gestão de segurança e deixou de oferecer confiabilidade aos passageiros. Para o advogado da Voepass, a pena foi “praticamente perpétua”.

Galpão da Voepass em Ribeirão Preto (SP), um ano após a tragédia de Vinhedo: poucos funcionários e aeronaves
Assista a ‘Voepass 2283: Sem Controle’
Conforme revelamos na primeira edição do IstoÉ Docs, a Voepass foi alvo de diversas multas nos anos anteriores, e os problemas técnicos eram reportados por funcionários à chefia, mas não havia resposta efetiva.
Luiz Almeida, copiloto da empresa de setembro de 2019 até a cassação do COA, relatou que os tripulantes que relatavam inadequações eram retaliados pelos empregadores.
“Por várias vezes, neguei o prosseguimento de voos. Aviões eram parados no aeroporto porque indicavam itens ‘no go’, estavam irregulares“, disse. “[Em reação] eles colocavam você de stand-by, empobreciam a escala. Tive problemas com comandantes porque me recusava a seguir com um voo”.

Precariedade na área interna de aviões foi relatada à IstoÉ, com imagens, por fontes
Sob condição de anonimato, um ex-mecânico da companhia disse que a manutenção era “feita na gambiarra, para garantir a liberação dos aviões no horário“. Segundo ele, ao reportar a falta de equipamentos, os funcionários do setor eram ameaçados de demissão.
Em nota, a Voepass afirmou ter cumprido as “exigências rigorosas que garantem a segurança das operações aéreas” e que a frota “sempre esteve aeronavegável e apta a realizar voos” até o encerramento de suas atividades.
Este conteúdo faz parte da primeira edição do IstoÉ Docs.