O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), quis mandar mais um recado de insatisfação ao Palácio do Planalto quando disse a líderes da Casa que pretende destravar cinco Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs). Na prática, porém, a intenção de Lira é expor a fragilidade do governo e mostrar que a articulação política do Planalto precisa “cumprir acordos”, se quiser ter votos no plenário.

O Estadão apurou que Lira disse a Moraes não ter intenção de estimular confronto com o Supremo nem de criar uma CPI para investigar abuso de autoridade e atos de censura de ministros da Corte e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), como propõe a oposição. Moraes preside o TSE.

‘Vocês acham que sou eu que tenho de organizar a base?’

Em conversa com líderes da Câmara, no entanto, Lira desabafou e reclamou até mesmo da equipe econômica pelo atraso no envio dos projetos de lei complementar da reforma tributária.

“Vocês acham que sou eu que tenho de organizar a base?”, perguntou o presidente da Câmara. O governo entendeu o sinal e já começou a liberar uma nova leva de emendas parlamentares.

Da semana passada para cá, por exemplo, o Ministério da Saúde autorizou o pagamento R$ 4,8 bilhões em emendas. Deste total, R$ 2,5 bilhões saíram nesta quarta-feira, 17. A ministra da Saúde, Nísia Trindade, está na mira do Centrão, que é comandado por Lira.

Aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva disseram ao Estadão que crises com Lira são “sazonais”. E ninguém acredita que cinco CPIs vão funcionar simultaneamente na Câmara, em um ano eleitoral. Em primeiro lugar, porque o Congresso começa a ficar esvaziado em meados de junho, mês de festa junina, quando os parlamentares viajam para seus redutos eleitorais, sobretudo os do Nordeste.

Além disso, após o recesso de julho, há uma espécie de “recesso branco”. Nesse período, deputados e senadores fazem algumas semanas de “esforço concentrado” para votações e, depois, partem para a campanha. As eleições para prefeituras e Câmaras Municipais estão marcadas para outubro.

O alvo de Lira é o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, a quem ele chamou de “incompetente” e “desafeto pessoal”, na semana passada. Tudo piorou, no entanto, depois que o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, demitiu o superintendente do Incra em Alagoas, Wilson Cesar Santos, que é primo de Lira.

“Eu falei com o presidente da Câmara e avisei que o nosso tempo político requeria essa medida agora. Mas ele tem a prerrogativa de apresentar um nome para esse lugar e nós estamos aguardando”, disse Teixeira ao Estadão. A demissão ocorreu após pressão do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e de outras cinco entidades, que não se entendiam com Santos. Os movimentos prometiam invadir novamente a superintendência do Incra em Alagoas, que chegou a ser ocupada no ano passado, neste mês do Abril Vermelho.

Lira quer mostrar força ao Planalto e fazer o sucessor na Câmara, em fevereiro de 2025. O seu pré-candidato favorito é o deputado Elmar Nascimento (BA), líder do União Brasil, mas a campanha dele enfrenta dificuldades. Em busca de apoio, o presidente da Câmara acena agora para a oposição e já avisou que vai pautar o pacote de maldades apresentado por deputados contrários a Lula.

Na semana passada, o fator detonador da crise foi a atuação do governo e de ministros do Supremo para que a Câmara mantivesse a prisão do deputado Chiquinho Brazão, acusado pela Polícia Federal de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco. Irritado, Lira disse a deputados que Padilha “vazou” informações erradas sobre uma manobra fracassada conduzida pelo Centrão para soltar o deputado preso. Pela sua interpretação, o articulador político do governo queria provar que ele estava enfraquecido.

Depois disso, Lira reclamou de Padilha e da “descoordenação” do Planalto com o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, durante voo para Salvador, na sexta-feira, 12, como mostrou o Estadão. Mesmo assim, prometeu não atrapalhar a agenda econômica do governo porque considera a reforma tributária como um “legado” de sua gestão.