Enquanto criticam a polarização, líderes dos maiores partidos de oposição trabalham sem disfarces para impedir uma candidatura de centro e fortalecer os dois extremos. O sinal mais didático ocorreu na segunda-feira, 11, quando caciques do MDB jantaram com Lula em Brasília e rifaram a pré-candidata medebista à Presidência, Simone Tebet. O encontro para detonar a própria presidenciável da legenda foi preparada para gerar manchetes na imprensa e abafar a débil articulação de partidos de centro (MDB, União Brasil, PSDB e Cidadania).

De nada adiantou o presidente do MDB, Baleia Rossi, reafirmar no dia seguinte o projeto presidencial do partido e tentar mobilizar os diretórios estaduais. Os velhos líderes do partido, que acumulam dezenas de processos no STF, mostraram quem manda de fato. São os mesmos que diziam ser urgente “estancar a sangria” no auge da Lava Jato. Lula é preferência deles para continuar lucrando com suas capitanias. Mas também se satisfazem com Bolsonaro, que garantiu o fim das investigações. Parte do Centrão que apoiava Dilma, como Ciro Nogueira, hoje é Bolsonaro de carteirinha. Não importa. Depois de outubro, todos vão se reagrupar com o novo presidente, que esperam vir dos dois polos que se retroalimentam, o PT e o bolsonarismo.

No caso do MDB, essa história não é nova. O partido já é um consórcio de caciques regionais há tempos. A fragmentação é útil para negociar apoio com o presidente de plantão sem se comprometer com um projeto nacional. É a lógica do Centrão, grupo fisiológico que hoje abriga também o antigo PMDB. A surpresa é que o PSDB também esteja rapidamente ingressando no Centrão. O presidente da legenda, Bruno Araújo, está ativamente torpedeando a única seção do partido que ainda é forte e resiste, São Paulo.

O presidente tucano luta dia e noite para implodir a candidatura de João Doria, que venceu as últimas eleições no estado e na capital, e também venceu as próprias prévias da legenda para a Presidência. Mais de 40 mil filiados apontaram que o PSDB deveria ter Doria concorrendo ao Planalto, num processo que custou R$ 12 milhões. Foi o primeiro partido brasileiro a introduzir a escolha antecipada, como acontece nos EUA. Araújo jogou o processo no lixo para embarcar em negociatas de bastidores com Aécio Neves, aquele que não tem votos e levou a seção mineira do PSDB à irrelevância (conseguiu uma votação expressiva à Presidência em 2014 apenas pela força do PSDB paulista, mas retribuiu a confiança rifando Geraldo Alckmin em 2018).

Os coronéis do MDB e os derrotados do PSDB querem impedir a todo custo que o País tenha um projeto de poder alternativo ao que Bolsonaro e Lula ofereceram nos últimos 20 anos. Defendem a política miúda sem a vigilância da Justiça (em termos de corrupção, o País retrocedeu ao pré-Mensalão). A criação de fundos bilionários com dinheiro público para distribuir livremente aos políticos e o orçamento secreto que transformou o Petrolão em brincadeira de amadores são muito mais lucrativos do que apontar os riscos institucionais de Bolsonaro ou as políticas equivocadas do petismo que levaram o País à maior recessão da história. Hoje, o retrocesso está normalizado. Até a volta da inflação já parece útil, pois permitiu maquiar o rombo nas contas públicas.

Junto às duas agremiações está o PSD, que fingiu buscar um presidenciável, mas na realidade já está fechado com o PT. Gilberto Kassab, guru do Centrão que criou o PSD, deu uma mãozinha ao retrocesso ao tentar atrair o gaúcho Eduardo Leite para seu partido. Mas o tucano concluiu que era mais útil ao novo Centrão implodindo o seu próprio partido. Leite prepara-se para entregar o Rio Grande do Sul ao bolsonarismo. Jair Bolsonaro conseguiu subverter a política quebrando o Estado e comemora a sua recuperação eleitoral. Está perto de conseguir a reeleição. Lula, que também deu uma força para acabar com a oposição ao cooptar Alckmin, escantear Ciro Gomes e desidratar o PSB, ainda espera levar o País de volta “à normalidade”.  Os dois provam a lógica de Lampedusa: é preciso mudar para que tudo continue como sempre.