A lisura do profissional médico começa antes de sua atuação prática. Inicia-se ao término do curso universitário com o Juramento de Hipócrates. “Aplicarei os regimes para o bem do doente, nunca para causar dano ou mal a alguém”, disse o grego. Ocorre, no entanto, que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, não faz a mínima ideia do significado dessas palavras. Ele demonstra não ter noção da relevância do cargo que ocupa. Em suas declarações públicas, não se dá ao trabalho de explicar claramente qual é a estratégia da pasta para conter a possível chegada da variante Ômicron ao País. Ao contrário, o ministro prefere prestar-se ao papel de sabujo do presidente Jair Bolsonaro, repetindo as fanfarronices de seu chefe sem levar em consideração os efeitos de suas decisões.

CIÊNCIA Barra Torres, diretor-geral da Anvisa: ignorado por Bolsonaro e por seu ministro (Crédito:Pedro Ladeira)

Tanto assim que, em sua última fala, terça-feira, 7, ele disse que é “melhor perder a vida que a liberdade”. Estimulou com velocidade de rastilho de pólvora, já na quarta-feira, a agressividade de um grupo antivacina, no Rio de Janeiro. Aos gritos, uma turma de bolsonaristas invadiu a Assembleia Legislativa (Alerj) e causou tumulto para atrapalhar a votação de um projeto de Lei que proibiria a aplicação do passaporte da vacina no Estado. O curioso é que eles eram a favor do projeto, mas atrapalharam sua tramitação mesmo assim. A proposta acabou saindo da pauta, mas vidraças foram quebradas e houve confusão com os seguranças. “Causa espécie que nesse momento, o ministro diga uma coisa dessas”, critica Gonzalo Vecina Neto, médico sanitarista.

“Há uma clara necessidade de se adotar o passaporte da vacina” afirma Raquel Stucchi, Infectologista da Unicamp e  Consultora da Sociedade Brasileira de Infectologia. Ela entende que cientificamente seria uma medida justa, dado que a quantidade de mutações que essa nova cepa apresenta pode torná-la preponderante no Brasil. Como respeitar a ciência não é uma característica do governo, coube à Anvisa fazer o alerta de que é necessário exigir das pessoas que chegarem ao País a obediência a regras rígidas de controle, como a apresentação do comprovante de vacinação e teste de detecção do patógeno. Mas o Ministério da Saúde preferiu ser coerente com a gestão e mudou as regras para pior. Agora, quem vier ao Brasil e não estiver vacinado será obrigado a permanecer em quarentena por apenas cinco dias. Prevendo o pior, o governador de São Paulo, João Doria, disse que se o governo federal não exigir o passaporte vacinal, o estado o fará. Se depender da ética médica de Queiroga, devemos temer o pior.