Às vezes, mais um dia de trabalho não é somente mais um dia de trabalho. Assim se sentiu na segunda-feira 30 o delegado de polícia Luiz Eduardo Maturano. Ele declarou que, ao sair da delegacia, após colher um depoimento, sentiu “um profundo vazio”. Em se tratando de um policial experiente como é, dá para se imaginar a gravidade daquilo que ouviu. É preciso, no entanto, forçar ainda mais a imaginação para vivenciar o seu sentimento. Maturano teve diante de si um menino de doze anos de idade a lhe relatar, em detalhes e sem nenhum sinal de remorso nos olhos ou de nervosismo nas mãos, como judiou e assassinou por enforcamento uma de suas vizinhas de quarteirão em um bairro da zona norte de São Paulo. O espanto não se esgota na idade do garoto. Olhemos a vítima! Nove anos de idade! Somente nove anos de idade.

Terrível para ambos

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Ela se chamava Raíssa Eloá Capareli Dadona. O garoto contou que caminhou até um parque de mãos dadas com a amiguinha, segurando um lençol rosa. Uma vez no parque, primeiro brincou, depois desferiu-lhe golpes no rosto com um pedaço de madeira e, na sequência, amarrou-a em uma árvore e a enforcou — era para isso o lençol rosa. A frieza emocional do pré-adolescente leva especialistas à hipótese diagnóstica de ser ele portador de transtorno de conduta, um dos indicadores de transtorno da personalidade antissocial na vida adulta (conhecido antigamente como psicopatia). Aponta para isso a Classificação Internacional das Doenças (CID 11) e também o “Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders” (DSM 5), da Associação de Psiquiatria dos EUA. Assim, para proteger o menino de si próprio e, sobretudo, a sociedade, a Justiça determinou a sua internação por tempo indeterminado — ele já foi apreendido e encaminhado à Fundação Casa, instituição do Estado destinada a menores que cometem crimes.

A frieza emocional do menino aponta na psiquiatria
para transtorno
de conduta, um dos indicadores
de psicopatia na vida adulta

O fato é tão doloroso que a polícia continuará investigando para ter certeza de que não houve participação de adulto no crime (com o assassinato seguindo a estupro, por exemplo) ou se o garoto não inventou tal história horrivel acometido por alguma enfermidade mental. Raíssa, que recebia acompanhamento médico por apresentar transtorno do espectro autista, desconfiava de deus e o mundo. Pobre menina. Quando deu a sua mão à outra mão, a entregou a uma mãozinha assassina.