Investimentos em infraestrutura são vultosos e de longo prazo por definição. Por isso, é vital que os países garantam segurança jurídica e previsibilidade para os projetos. Além disso, há uma disputa entre as nações em desenvolvimento para atrair recursos. Nessa guerra, o Brasil está perdendo de lavada, e tudo se deve à instabilidade provocada pelo governo, inclusive a deterioração dos indicadores econômicos. Há inflação galopante, desemprego recorde, queda na renda e, consequentemente, no consumo. O presidente virou pária na comunidade internacional e seu principal assessor econômico já perdeu a credibilidade entre os pares. Para completar, há a insegurança pela proximidade das eleições. A tradução desse cenário se deu nas concessões de 2021: um fiasco.

Segundo o Ministério da Infraestrutura, apenas oito entre os 33 ativos ofertados até agora foram parar nas mãos de clientes internacionais. Todos já operavam no Brasil. É o caso da Shell, que adquiriu cinco blocos de exploração de petróleo na Bacia de Santos, leiloados pela Agência Nacional de Petróleo (ANP) na semana passada. A rodada foi a pior da história, não apenas por ter tido o menor número de inscritos, mas também porque outras 87 áreas colocadas à venda não atraíram interesse de ninguém. Empresas estrangeiras que também estavam registradas, como a americana Chevron e a australiana Karoon, nem fizeram lances, preocupadas com o excesso de riscos ambientais. O governo saiu do leilão com apenas R$ 37,1 milhões. “O Brasil é um dos países mais atraentes para investidores, mas o que está acontecendo aqui é simplesmente incompreensível para eles”, conta Cláudio Frischtak, sócio-diretor da consultoria Inter.B. “Os leilões deveriam estar lotados de novos entrantes. No entanto, os certames estão cada vez mais esvaziados”, completa.

Esse quadro pode se repetir em breve. Em dezembro, áreas cedidas à Petrobras no começo da década passada vão à venda, mas o temor geral é que se reviva o fracasso de 2019, quando o que vinha sendo chamado de “megaleilão” pelo governo Bolsonaro se transformou no maior revés do programa de privatizações desde que o mercado de petróleo foi aberto. O certame acabou rendendo 65% do dinheiro que se esperava — e quase tudo para a própria petrolífera brasileira.

Vários fatores têm contaminado a decisão de empresas de fora em entrar no mercado brasileiro. O principal deles é o ambiental, área em que a gestão Bolsonaro vai exemplarmente mal. Depois disso, as ameaças institucionais protagonizadas pelo presidente nos últimos meses lançaram dúvidas no exterior sobre a estabilidade do país no curto prazo. Soma-se a isso o péssimo momento econômico e, em meio a esse caos, os sinais de irresponsabilidade fiscal do governo. “A frase que eu mais tenho ouvido dos investidores é “vamos esperar”, diz Frischtak.

Essa incerteza generalizada pode ser medida de diversas formas. Uma delas é o volume de contratos de CDS (Credit Default Swap) negociados no mercado internacional. Como são seguros financeiros contra maus pagadores, ficam mais caros à medida que o temor de calote se torna maior. É o indicador básico do risco país. No caso do Brasil, a alta em 2021 já é de 24%.

Risco em alta

Esse cenário negativo interfere nas concessões previstas para este ano e para 2022 — muitas delas chamadas de “joias da coroa” pela atratividade, como o aeroporto de Congonhas, em São Paulo, as rodovias Presidente Dutra e Rio-Santos e o terminal Santos Dumont, na capital fluminense. “Os investimentos caíram globalmente na pandemia. No Brasil, o ambiente ruim é um impeditivo a mais”, diz o economista Paulo Nogueira Batista, que foi diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI). “O fato de estarmos na contramão do tema ambiental e de termos uma economia estagnada são elementos que também esvaziam os leilões”, analisa.

Um bom termômetro, segundo o mercado, será o resultado do leilão da Dutra, marcado para o fim deste mês. Teoricamente, ele deveria atrair muitos potenciais investidores. Não é o que está acontecendo, porém. “Se tiver mais do que dois players, ficarei surpreso”, afirma Frischtak. Pior ainda é a concessão da BR-381, que liga os estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Sem interessados, o governo estuda adiá-la para o ano que vem. Se isso acontecer, as negociações dos aeroportos em São Paulo e no Rio podem se contaminar pela maré negativa. Sintoma inequívoco de como o mundo tem olhado para o País.