IIuminação pública inexistente, montes de lixo, casas inacabadas… a poucos quilômetros do Centro Espacial da Guiana Francesa, em Saramaca, no município de Kourou, palco de um grande protesto popular, “o foguete decola, mas não há luz”, reclama um habitante.
Não é por acaso que o bloqueio de um lançamento do foguete Ariane 5, previsto para 20 de março passado com o objetivo de colocar em órbita um Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas, do Brasil, e um satélite sul-coreano, constitui um dos principais pontos da mobilização de greve.
Em Kourou, quem não trabalha no Centro Espacial vive na miséria, comenta Lason Koutou Agassi, que mora com sua esposa e seus cinco filhos em uma casa de três andares e paredes externas sem pintura.
O bairro de Saramaca encarna a situação denunciada por um grupo de guianenses que há mais de duas semanas realiza um movimento social sem precedentes, em meio a alegações de falta de segurança, saúde e educação, além das denúncias de falta de investimento por parte de Paris nas últimas décadas.
Martin Marsi, um pintor de 23 anos, fuma calmamente enquanto recorda a infância vivida no “bairro”, que outrora foi uma favela que passou por uma revitalização.
Segundo ele, os moradores que alugam as casas têm a opção de compra e todas as construções, uma mistura de madeira e concreto, possuem água e eletricidade.
Segundo outro morador, o progresso é real na antiga favela graças, em parte, ao incêndio que a atingiu em 2006.
Mas buracos marcam as vias de acesso, a grama invadiu as áreas de lazer, como a quadra de esportes, e a iluminação pública não funciona há anos, lamenta.
– ‘País subdesnvolvido –
“Kourou é um sucesso político, tecnológico e financeiro. É o carro-chefe da tecnologia europeia”, resume Youri Antoinette, engenheiro e porta-voz do Centro Nacional de Estudos Espaciais
“Mas quando saímos do Centro Espacial, nos encontramos em um país subdesenvolvido”, acrescenta.
Nesta terça-feira, uma manifestação foi organizada para protestar contra as declarações do primeiro-ministro francês primeiro-ministro Bernard Cazeneuve, que disse “rejeitar a demagogia de pessoas que reclamam bilhões” de Paris.
Efetivamente, o grupo exigiu no domingo o repasse de 2,5 bilhões de euros quando o governo francês prometeu apenas um bilhão em ajuda de emergência.
Enquanto a imagem dos foguetes, símbolos de progresso e tecnologia de ponta, é onipresente em Kourou, o bairro vizinho sequer tem telefone ou internet, reclama Lason Koutou Agassi.
Mas nos bairros onde os engenheiros aeroespaciais vivem, há iluminação pública e os gramados são aparados. Muros altos cercam as propriedades e a polícia e uma segurança privada fazem rondas regulares”, diz Atoune, 43 anos.
O hospital municipal de Kourou também está em crise, como todo o sistema de saúde desse departamento ultramarino da França situado na costa atlântica da América do Sul.
Por fim, em Kourou, os empregos são escassos. Na Guiana, de acordo com a empresa Insee, a taxa de desemprego é de 22%, frente aos 10% na França metropolitana, e “até mesmo os estágios são difíceis de encontrar”, lamenta Gabrielle, uma estudante do ensino médio.
E ela reproduz uma reclamação coletiva: “O foguete decola, e ainda estamos aqui.” No chão.