‘O Agente Secreto’: Kleber Mendonça analisa corrida pelo Oscar e responde críticas

Em entrevista exclusiva à IstoÉ Gente, diretor do longa-metragem nacional fala de expectativa para maior premiação internacional

Kristy Sparow
Kleber Mendonça Filho: “Não brigo com o tempo, ele passa e as cidades mudam” (Crédito:Kristy Sparow) Foto: Kristy Sparow

“Um quebra-cabeça”. É assim que o cineasta recifense Kleber Mendonça Filho define sua atual contribuição para o cinema nacional, o filme “O Agente Secreto”, do qual participou de todos os detalhes de direção, montagem e roteiro, e que estreou há uma semana nas telas de todo o Brasil – e com sucesso de bilheteria, em três dias da estreia, no dia 6, já foram arrecadados R$ 6,6 milhões. Aos 56 anos de idade, o diretor tem viajado o mundo para fazer campanha do longa-metragem escolhido para representar o Brasil no Oscar 2026, maior premiação cinematográfica internacional.

Se com “Ainda Estou Aqui”, filme de Walter Salles protagonizado por Fernanda Torres, o Brasil abraçou o cinema nacional como se fosse a Copa do Mundo, com “O Agente Secreto”, estrelado por Wagner Moura, o país volta a viver esse clima, na expectativa de repeteco. Os sonhos, porém, vão além da estatueta de Melhor Filme Internacional (o Oscar que “Ainda Estou Aqui” amealhou, em março). Nos corredores de Hollywood, fala-se até em indicação para Melhor Filme, Direção e Melhor Ator.

Se essas especulações vão virar realidade, isso só poderá ser descoberto no dia 22 de janeiro, quando saem os indicados. Na categoria Melhor Filme Internacional, ainda há mais uma etapa a vencer: no dia 16 de dezembro sai a lista dos 15 filmes pré-selecionados para concorrer a esse prêmio.

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Em meio às prateleiras preenchidas do teto ao chão de livros e DVDs, que compõem um cenário inspirador para as dezenas de chamadas de vídeo das quais tem participado nos últimos meses, o cineasta se coloca, mais uma vez, no lugar de “operário” de seu filme — como ele mesmo se intitula, e fala das expectativas, comparações e críticas que a sequência protagonizada por Wagner Moura tem recebido.

A respeito do primeiro tópico, a expectativa, Kleber não esconde o entusiasmo com a obra, que já ganhou inúmeros prêmios, dentre eles Melhor Ator e Melhor Direção no Festival de Cannes, na França, em maio de 2025.

“É um filme brasileiro que está se comunicando muito bem com o Brasil, com o nosso jeito de falar. Evidenciou-se a polifonia brasileira de sotaques. É muito importante a gente se ouvir no audiovisual brasileiro, seja na televisão, nas séries ou no cinema. Essa multiplicidade de sotaques […] bate forte. É algo que não tinha surgido, é claro, nas reações do público fora do Brasil”, recorda.

Em relação às comparações, Mendonça Filho analisa os aspectos semelhantes e díspares entre “O Agente Secreto” e “Bacurau”, filme do qual também foi diretor e ganhou o Prêmio do Júri em Cannes em 2019.

Kleber Mendonça Filho – foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

“’Bacurau’ é um western [Velho Oeste americano]. Aos poucos, o filme diz que não há mais regras, existe um ato de genocídio, em algum momento ele se transforma em um filme de guerra, mas sem dizer isso filme [para o público]. As situações de invasão, de extermínio dizem por si só […] E ‘O Agente Secreto’ se passa em uma realidade muito mais palpável, que é o Brasil dos poderes, das perseguições. Algumas delas têm cunho pessoal. E a violência já é falha por si só, mas quando alguém tenta tirar vantagem, tem dois personagens que vêm de fora, contratados para terceirizar um serviço, que se torna um desastre. Então tudo isso, para mim, faz muito sentido”, explica.

Ao ser questionado sobre as críticas apontadas a respeito de um desfecho decepcionante em “O Agente Secreto”, Kleber confirma que já ouviu tais apontamentos negativos, mas justifica:

“Se eu tivesse ido por um caminho mais óbvio, eu acho que eu estaria, talvez, tendo que lidar com outras reações negativas ao fato de ter ido por um caminho mais óbvio. A história pode acontecer de diversas formas. No cinema você conta a história falando, mostrando, conta com pontuação. Tem todo tipo de reação, até de perplexidade e frustração, porque aquele personagem é muito especial e você se apegou muito a ele. Tenho recebido reações excelentes a todo o roteiro, inclusive para ser indicado, mas também entendo e aceito que algumas reações sejam de não entender a história ou de não aceitar”, pondera.

Kleber Mendonça Filho ainda analisa a corrida pelo Oscar de maneira contida, baseada na divulgação dos pontos de destaque do filme, sem fazer alarde nas redes sociais, tampouco dissociando fatos da verdade, e faz um balanço sobre suas conquistas profissionais até aqui. “Sendo bem franco, eu estou vivendo o que eu pedi a Papai Noel [risos]. Nunca tive um plano B”.

Confira a entrevista na íntegra:

IstoÉ Gente: O que mudou na sua percepção do público de “O Agente Secreto” lá em Cannes para agora, no Brasil?

Kleber Mendonça Filho: A gente está vindo de pré-estreias que começaram desde setembro. A primeira exibição no Brasil foi no Recife. E de lá para cá o filme passou de Manaus a Porto Alegre, Salvador, Festival do Rio, Curitiba, Mostra SP. É um filme brasileiro que está se comunicando muito bem com o Brasil, com o nosso jeito de falar. Eu tenho percebido, aliás, que depois que o filme começou a ser exibido no Brasil, evidenciou-se a polifonia brasileira de sotaques. Eu tinha pensado muito nisso já no roteiro e encontrando os atores. É muito importante a gente se ouvir no audiovisual brasileiro, seja na televisão, nas séries ou no cinema. Essa multiplicidade de sotaques que vai do pernambucano ao paulista, ou do paulista com acento italiano ao angolano, ao sertanejo, ao potiguar, ao gaúcho alemão falando português, a mineiro… É muito interessante e bate forte. É algo que não tinha surgido, é claro, nas reações do público fora do Brasil.

E a reação do público frente à história do filme?

KMF: É um filme que fala sobre a história do Brasil, isso é cristalino para os brasileiros. E a reação ao trabalho de Wagner [Moura] no filme é internacional, é universal. Ele tem uma admiração muito grande no Brasil como astro, como estrela, como ator. Entra o teatro que ele já fez, a televisão, o cinema. Ele tem personagens icônicos no cinema, como o capitão Nascimento. E agora, ele interpretando o Marcelo Armando, tenho certeza que é um dos grandes papéis da carreira dele. Então, eu acho que as reações são de muita força no nosso país.

A montagem chama bastante atenção, isto é, a forma como a história se desenrola. Quais suas inspirações para investir neste tipo de amarração que gera suspense?

KMF: A ideia da montagem do filme vem da minha percepção, que é algo muito pessoal meu. O filme, isso eu fui aprendendo já nas primeiras reações à leitura do roteiro, chama o espectador para um jogo, porque durante um tempo você não sabe como espectador o que está acontecendo, mas tem sempre uma informação nova ao longo da história. A pessoa está vendo o filme assim [sentado com as costas apoiadas na cadeira] e daqui a pouco a pessoa vai para frente, fica assim [feição de espanto e surpresa], e pensa: “Acho que eu entendi onde é que está o problema”. Esse jogo pode ser muito instigante para o espectador. E a partir de um determinado momento onde fica estabelecido o que se passa, aí o filme desembesta e ele segue não só para uma conclusão, mas também deixa o espectador completar várias outras linhas de pensamento do filme. Eu até achava que isso seria muito mais fácil para o brasileiro, mas eu acho que as lacunas são preenchidas muito bem em vários países.

Você recebeu esse retorno do público lá no exterior também?

KMF: Sim, eu acho que como todo filme, isso acontece com música também, com livro… Cada pessoa, pela maneira de pensar, pela bagagem, pela experiência de vida, pode sacar o filme imediatamente. Mas tem outras que talvez não saquem imediatamente e ficam refletindo. E tem uma recorrência de comentários sobre o filme, da crítica a pessoas na porta do cinema, que dizem que vão precisar ver uma segunda vez ou querem ver uma segunda vez. E o filme, na segunda vez, é tão denso, tem tanta coisa acontecendo que você vai: “Ah, isso aqui é muito interessante, eu não tinha percebido da primeira vez”. Obviamente eu nunca pensei em um game para esse filme, um PS5 [Playstation] do “O Agente Secreto” [risos], não é isso. Mas eu acho que é um quebra-cabeça.

Algumas pessoas disseram que esperavam mais do final do filme, se decepcionaram um pouco. Como você lida com as críticas?

KMF: Eu tenho visto algumas reações dessa forma também, mas são totalmente naturais. Se eu tivesse ido por um caminho mais óbvio, eu acho que eu estaria, talvez, tendo que lidar com outras reações negativas ao fato de ter ido por um caminho mais óbvio. A história pode acontecer de diversas formas. A gente está aqui, conversando, você está me contando uma história, e aí eu completo a história e posso, de repente, me calar, e você perguntar: “O que você ia falar?” Aí eu não falo nada e faço assim [gesto com a cabeça], e você responde, entendendo o que eu disse sem abrir a boca: “É sério?” Essa é uma maneira de contar a história, entendeu? No cinema você conta a história falando, você conta a história mostrando, conta a história com pontuação. Tem todo tipo de reação, até de perplexidade, de dizer: “Não, eu não acredito”. Tem reações de frustração também e essa frustração é emotiva, porque aquele personagem é muito especial, e você se apegou muito a ele, além, é claro, da violência, que é sempre muito chocante. Tenho recebido reações excelentes a todo o roteiro, inclusive para ser indicado [às premiações], mas também entendo e aceito que algumas reações sejam de não entender a história ou de não aceitar.

É possível comparar “O Agente Secreto” a “Bacurau”? Quem assistiu aos dois encontrou muita semelhança, no entanto achou “O Agente Secreto” mais ‘na medida’.

KMF: Poxa, mas o “Bacurau” é um western [Velho Oeste americano]. Aos poucos, o filme diz que não há mais regras, existe um ato de genocídio no filme, em algum momento ele se transforma em um filme de guerra, mas sem dizer isso filme [para o público]. As situações de invasão, de extermínio dizem por si só. Muita gente diz que “Bacurau” é massa porque é um filme de vingança. Eu não acho. Vingança é quando alguém passa por uma trauma, se recupera e depois vai friamente armar um ato de vingança. Em “Bacurau”, as pessoas estavam reagindo para se proteger. Muita gente, até hoje, fica chocada com algumas coisas que acontecem no filme. Eu até tenho dificuldade de aceitar o que muita gente falou, que o filme é “ultraviolento”. Eu acho que ele é violento, mas não ultra. E “O Agente Secreto” se passa em uma realidade muito mais palpável, que é o Brasil dos poderes, das perseguições. Algumas delas têm cunho pessoal. E a violência já é falha por si só, mas quando alguém tenta tirar vantagem, tem dois personagens que vêm de fora, contratados para terceirizar um serviço, que se torna um desastre. Então tudo isso, para mim, faz muito sentido — essa coisa de passar a violência para frente. A violência que tem no final do filme é forte, mas ela faz sentido, como também acho que faz sentido em “Bacurau”, eu acho foda! Mas também algumas pessoas disseram que queriam que tivesse mais tiroteio. Eu não sei se conseguiria fazer um tiroteio, sabe? Alguém se escondendo atrás de um aparelho, um cara cai de cima do telhado, em cima de uma carroça de feno, como geralmente acontece nos bang-bangs. Cada filme se resolve de uma maneira diferente.

Cena do filme “Bacurau”, de 2019 – Divulgação

Aproveitando que citou o tópico de violência, qual a importância de lançar esse filme em meio a tudo o que tem acontecido no país nas últimas semanas, sobretudo no Rio de Janeiro?

KMF: Os melhores filmes de cada país são os que não se esforçam muito para não ter nenhuma relação com a realidade. Isso às vezes é até feito como estratégia de mercado, mas eu acho que os melhores filmes, músicas, livros, peças, são retratos artísticos da sociedade onde a gente vive. Existe uma reação, inclusive, de quem não é brasileiro, mas muito forte no Brasil, de como esse filme consegue ser cinema, mas ao mesmo tempo ter alguma coisa muito honesta, muito franca sobre o Brasil – aconteceu com “Bacurau” e “Aquarius” também. E essa franqueza pode ser fascinante, ela pode ser um pouco ácida, um pouco dura, mas estabelece uma relação forte com a realidade do país. O Héctor Babenco fez o filme “Carandiru” (2003), que é uma revisão do que aconteceu em 1992 no Carandiru, um massacre, 111 presos foram massacrados. E todo mundo sabe que foi uma oportunidade utilizada pela polícia de São Paulo para massacrar, matar pessoas. Aquele filme é uma análise literal de uma tragédia brasileira. Eu, pessoalmente, admiro muito, mas não conseguiria fazer aquele filme, porque eu prefiro abordar não diretamente, mas de maneira circular, talvez, e ainda assim ser honesto, como o “Carandiru” é, mas não de maneira frontal, entendeu? “O Agente Secreto” se passa nos anos 1970 e desde que eu falei pela primeira vez, sempre me dizia: “Ah, ditadura”. Era difícil explicar que sim, mas não exatamente, porque o filme não tem os elementos que o cinema chileno, argentino e brasileiro geralmente usam para ilustrar a ditadura: homens fardados com aquele capacete verde, caminhões do exército, choques elétricos, assalto ao banco dos militantes de esquerda, que querem pegar dinheiro para bancar as ações, as palavras “aparelho”, “ditadura” e “tortura” não estão nesse filme, e muito menos em ações. Então, o filme é sobre aquele momento e é sobre, sim, o regime militar, mas não é exatamente sobre, entendeu? Essa franqueza pode se manifestar de outras maneiras e não de maneira tão frontal.

Você acha que esse estilo, essa linguagem podem atrair a parte do público que corresponde à massa da sociedade? Sem incluir cinéfilos, estudiosos da área, que naturalmente se interessariam pelo seu trabalho.

KMF: É difícil dizer, mas considerando toda a energia em torno do filme e os filmes que eu já fiz… O “Bacurau” é um filme que furou a bolha, Wagner Moura é um grande nome da cultura brasileira, um grande astro, além da forma surpreendente como muita gente já reagiu ao filme dizendo que não imaginava que seria tão engraçado, ou dizendo que adorou a Dona Sebastiana [papel de Tânia Maria], ou que elogiou a Alice Carvalho em apenas cinco minutos de filme, em que ela bota para lascar, a reconstituição de época, dos carros, eu acho que tem muitos elementos em “O Agente Secreto” que podem conquistar, como o uso de música, e a coisa de ser muito brasileiro. Gostando ou não gostando, esse filme é um retrato do Brasil bem interessante e eu estou muito curioso para ver o que vai acontecer a partir de agora.

E o Oscar? Vem aí ou prefere seguir a linha da Fernanda Torres de não se precipitar?

KMF: Eu vou seguir e adotar as palavras de Fernanda. Nós fomos muito felizes para o Festival de Cannes. Eu estava realmente muito feliz e eu não estava contando [com a vitória], eu esperava que tivesse uma boa reação ao filme, que é um filme muito peculiar, muito ele mesmo, e eu acho que muito bom. Mas eu estava esperando que a melhor coisa que pudesse acontecer era uma reação boa. E aí, [ganhou como] Melhor Diretor, Melhor Ator e Melhor Filme da Crítica Internacional. A partir daí, o filme começa a entrar em um sistema de prestígio internacional. Estávamos em campanha antes de saber que estávamos na campanha da temporada de prêmios da América do Norte e, hoje, o filme parece muito bem posicionado para essa temporada de prêmios. Fala-se muito em Wagner Melhor Ator, Melhor Filme Internacional, fala-se de ele ser um dos dez indicados para o Melhor Filme, fala-se de Melhor Direção, Melhor Roteiro, já falaram de Dona Tânia… Mas eu não sei, eu acho que a gente precisa ir semana por semana. O público brasileiro, que é maravilhoso e dá uma energia muito grande a essa coisa toda do Oscar, ajuda muito a gente a pensar: “Ok, vamos nessa”. Então, vamos conversar a cada semana, eu posso mandar uma atualização para você. Mas é bom seguir o que a Fernanda falou, não vamos nos precipitar. Já o clima de Copa do Mundo eu não tenho controle [risos]. Eu sou muito atuante nas redes sociais, mas eu não estimulo um clima de Copa do Mundo, eu estimulo a informação correta sobre o que está acontecendo com o filme, nada do que você vai ler do que eu postar é mentira ou é um exagero, é tudo correto. Às vezes, eu coloco um raiozinho e uma taça de vinho [risos]. Mas, além disso, não há exagero, não há mentira e não há falsa verdade, porque esse filme não precisa disso. Tudo o que tem acontecido com “O Agente Secreto” até agora é espetacular.

Deixando “O Agente Secreto” um pouco de lado, quais os próximos passos do Kleber? Você já até respondeu se tem planos de ir para a Marvel, né? Como tem lidado com essas especulações?

KMF: [Risos] Não vou para a Marvel, porque eles já devem ter aplicativos para dirigir os filmes e eu até agora tenho desenvolvido meus próprios roteiros e ideias [risos]. Eu não descarto a possibilidade de algo chegar para mim e eu dizer: “Uau, acho que eu poderia fazer algo com esse roteiro”, entende? Adoraria fazer um filme nos Estados Unidos ou um filme na França. Nos Estados Unidos, porque eu acho que eu me sentiria à vontade — não porque eu já morei nos Estados Unidos, eu nunca morei, mas porque eu tenho uma relação forte com a história do cinema americano. E na França, porque a minha companheira, Emilie [Lesclaux, produtora cinematográfica e cientista política], é francesa e eu, de fato, tenho uma relação com a França. Mas eu acho que eu poderia também fazer um filme no Rio de Janeiro, eu sinto uma conexão, e com São Paulo também, eu já fui a São Paulo vezes suficientes na minha vida para achar que eu poderia. Filmei três sequências para “O Agente Secreto” em São Paulo e me senti totalmente em casa. Então, sim, por que não? Mas, para mim, é um pouco estranho fazer um filme na Islândia, por exemplo, só vejo como locação de outro planeta, que é o que a Islândia funciona muito bem [risos]. Eu tenho amigos na Islândia, adoro aquele lugar, mas é muito estrangeiro para a minha experiência de vida.

E se você pudesse voltar no tempo e mandar um recado ao Kleber Mendonça Filho criança sobre o seu atual futuro e todas essas conquistas, qual recado você daria?

KMF: Sendo bem franco, eu estou vivendo o que eu pedi a Papai Noel [risos]. Eu realmente nunca tive um plano B, tudo o que eu fiz desde que saí da universidade foi tentar me aproximar do cinema, um adolescente querendo ver de perto como acontece um filme, forçar a barra em trabalhos da faculdade de jornalismo para tentar usar equipamentos de vídeo ou câmera, que naquela época era quase uma coisa mágica, escrever sobre cultura e depois escrever sobre cinema, me ver programando uma fala ainda nos meus 20 e poucos anos. Eu nunca tive um plano B… Tudo bem, eu ensinei inglês ainda durante a universidade e, depois de me formar, fiquei um ano desempregado como jornalista ensinando inglês. Esses foram planos B que nunca foram planos B, nunca me vi em dez anos ensinando inglês, mas foi um período muito bom de ganhar um dinheiro. E hoje eu faço filmes, sou um cineasta, desenvolvo ideias, continuo tendo o desejo e o amor de compartilhar filmes com pessoas em salas de cinemas que eu amo. Então, o que eu falaria para o Kleber criança é a mesma coisa que eu fiz desde então. E eu tive uma mãe que sempre apoiou muito, nunca ouvi nem do meu pai: “Deixa de besteira, rapaz, você vai fazer medicina, direito [risos]”, ou então, “Isso é hobby, hobby besta”, nunca ouvi isso, o que ajudou muito. Mas sei lá, se eu tivesse nascido na família errada e ouvisse isso, talvez fosse outro motivo para eu contrariá-los [risos].

Kleber Mendonça Filho e Wagner Moura nos bastidores de cena de “O Agente Secreto” – foto: Laura Castor