08/05/2020 - 13:43
Com uma boina vermelha de estilo militar e jaqueta de aviador de cetim, o voluntário de combate ao crime Arnaldo Salinas patrulha um bairro em Nova York, onde assaltos têm aumentado durante o confinamento devido ao coronavírus.
Salinas é membro do Guardian Angels, um grupo não armado que protege os moradores da cidade – e até executa prisões -, objeto de controvérsia há quatro décadas.
“Se vemos uma beligerância, um crime, intervimos”, explica esse robusto homem latino-americano de 58 anos.
Curtis Sliwa, um popular apresentador de rádio conservador, era gerente noturno de um McDonald’s em 1979, quando a alta taxa de criminalidade em Nova York o motivou a fundar os Guardian Angels. Eles começaram com 13 voluntários fazendo patrulhas de segurança pública no sistema de metrô imundo e perigoso da cidade.
– 5.000 anjos –
Hoje, a associação sem fins lucrativos, que recebe doações, opera em 130 cidades em 13 países.
Existem mais de 5.000 “anjos da guarda” homens e mulheres em todo o mundo, incluindo 150 em Nova York, segundo Sliwa, de 66 anos.
As insígnias do grupo estão bordadas em seus uniformes vermelhos: um olho que pode ver tudo entre um par de asas de anjo.
Eles monitoram o entorno da sinagoga após ataques antissemitas crescentes e intimidam homens acusados de abusar de mulheres no metrô com cartazes de “Procurados”, por meio de sua iniciativa “caçadores de pervertidos”.
Embora a crise causada pela doença COVID-19, que matou quase 20.000 pessoas em Nova York, tenha resultado em um menor número de crimes, assassinatos, furtos em lojas e roubos de carros registraram aumento.
Em abril, durante o auge da pandemia, o roubo de lojas aumentou 169%, segundo dados da polícia.
Os Guardian Angels têm seis equipes móveis que patrulham as áreas afetadas pelo aumento do crime, que inclui partes de Washington Heights, em Manhattan, além de áreas no Bronx, Queens e Brooklyn.
Sliwa diz que as equipes desempenham um papel essencial porque não há policiais suficientes. Cerca de 20% da força policial adoeceu com coronavírus ou teve que ficar de quarentena há um mês, no auge da pandemia.
Os voluntários conversam com os comerciantes e fornecem a eles um folheto com o número de telefone dos Guardian Angels. “Dizemos a eles que podem nos ligar se tiverem problemas”, disse Sliwa à AFP.
Sanjay Hodarkar, farmacêutico de 66 anos de Washington Heights, aprecia a presença os Angels nas ruas. “É um conforto saber que eles estão aqui”, diz.
Os Guardian Angels também estão ajudando os sem-teto que lotam o metrô vazio de Nova York. Mary Gethins, 48 anos, é uma das voluntárias que administra a linha E, entregando pacotes com lenços umedecidos, máscaras e sanduíches para os mais necessitados.
A lembrança de quando ela tinha cinco anos e viu sua mãe ser assaltada a levou a se juntar ao grupo duas décadas atrás.
“Me incomoda que tenhamos que fazer isso, mas isso os anima um pouco, por alguns segundos”, comenta depois de entregar um pacote.
Damon, um sem-teto de 67 anos, recebeu um dos pacotes. “Não há muita humanidade neste país, mas eles mostram que algo permanece”, desabafa à AFP.
Os Guardian Angels são um grupo multiétnico e cada novo recruta recebe três meses de aulas de autodefesa e treinamento em primeiros socorros antes de sair para as ruas.
Esses vigias têm, contudo, uma história controversa. A princípio, as autoridades os consideraram uma gangue e, em 1992, Sliwa admitiu ao The New York Times que o grupo havia inventado sucessos em sua luta contra o crime para atrair publicidade.
Nesse mesmo ano, Sliwa foi baleado cinco vezes por dois pistoleiros quando estava no banco de trás de um táxi. Os promotores federais acusaram John A. Gotti, filho do chefe da máfia Gambino, por tentativa de assassinato. Eles alegaram que o réu estava furioso com os comentários que Sliwa fez sobre seu pai no rádio, mas o júri não o considerou culpado e as acusações foram retiradas.
Críticos dos Guardian Angels afirmam que a polícia é quem deve se preocupar com o combate ao crime.
– “Mão de ferro” –
Seus detratores também se perguntam por que os Guardian Angels ainda permanecem ativos quando as taxas de criminalidade em Nova York estão em um patamar mínimo.
Sliwa ignora esses argumentos. “No momento, não há polícia suficiente”, argumenta.
“Precisamos que os cidadãos saiam e protejam aqueles que não podem se ajudar: os sem-teto, os doentes mentais, os idosos, as mulheres, as crianças, porque essas são as presas”.
Durante uma patrulha, Salinas admite que as táticas do grupo eram mais “pesadas” em seus primeiros dias na capital de homicídios dos Estados Unidos. Mas hoje os voluntários preferem “usar o cérebro e não a força”, explica.
Ele acredita que o trabalho da associação durante a pandemia ressalta sua relevância contínua. “A única razão pela qual estamos aqui há mais de 41 anos é porque temos a capacidade de mudar”, conclui.