A Justiça de São Paulo concedeu nesta segunda-feira, 11, liminar que determina a matrícula de mais um estudante autodeclarado pardo na Universidade de São Paulo (USP). Ele se inscreveu no vestibular pela reserva de vagas PPI (Preto, Pardo, Indígena), e foi aprovado para o curso de Engenharia de Produção. Sua entrada, porém, foi negada pela comissão de heteroidentificação da USP, que não o reconheceu como pardo.

As avaliações da banca de análise racial têm sido alvo de polêmica nas últimas semanas, após dois outros casos em que a instituição negou a matrícula de candidatos em condições semelhantes. Ambos acionaram os tribunais e um deles também conseguiu ordem judicial para ingressar na USP.

De um lado, defensores do modelo de bancas – entre eles a reitoria da USP – afirmam que o modelo visa a coibir fraudes decorrentes do ingresso somente pela autodeclaração racial, como ocorria no início da adoção massiva das cotas pelo País uma década atrás. Já os críticos veem risco de injustiças e apontam que as comissões funcionam como “tribunais raciais”.

A nova decisão é provisória e foi assinada pelo juiz Marcio Ferraz Nunes, da 16ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo. Ele cita que o jovem foi impedido de seguir no vestibular da Fuvest porque a maioria dos membros do Conselho de Inclusão e Pertencimento decidiu que o rapaz não cumpria os requisitos necessários para “usufruir o direito à vaga reservada ao grupo PP (Pretos e Pardos)”.

A defesa do rapaz apresentou à Justiça a certidão de nascimento do pai do estudante, que em 1957 foi registrado como alguém de cor parda. O documento foi usado pelo magistrado para justificar a liminar em favor da defesa do vestibulando.

“Posto isso, defiro a liminar para, até decisão final nestes autos, determinar que a parte requerida (a USP) proceda a reativação da matrícula da parte autora”, escreveu o juiz.

Segundo os critérios da USP, a análise não é feita com base na ascendência do candidato, mas pelo seu fenótipo (características físicas). O Supremo Tribunal Federal (STF), em 2017, definiu que os aspectos de pretos e pardos a serem consideradas pelas bancas em concursos e processos seletivos são:

– Textura do cabelo (crespo ou enrolado);

– Nariz largo;

– Cor da pele (parda ou preta);

– Lábios grossos e amarronzados.

A decisão determina que a USP garanta ao jovem a participação nas aulas, acesso aos sistemas educacionais “e dispor de todos os benefícios concedidos aos alunos regularmente inscritos.”

A reportagem procurou a USP para comentar a liminar, mas não obteve resposta até a publicação desse texto. O Estadão também não localizou a defesa do estudante.

Reitoria promete melhorar sistema com avaliações presenciais

O novo caso é semelhante ao do estudante Glauco Dalalio do Livramento, de 17 anos, que foi aprovado para Direito da USP, mas que também teve o seu ingresso negado porque a comissão de heteroidentificação afirmou que ele não cumpria com os requisitos para ser considerado pardo, conforme o jovem se autodeclara.

O estudante foi descrito pelos avaliadores com “de pele clara, boca e lábios afilados, cabelos liso” depois de um encontro virtual e remoto com o candidato. A defesa de Glauco alegou que o estudante não foi avaliado de forma adequada pela comissão de heteroidentificação e acionou a Justiça.

Na última segunda-feira, 4, o Juiz Randolfo Ferraz de Campos, da 14º Vara de Fazenda Pública de São Paulo, acatou o pedido da defesa e concedeu liminar em favor do estudante, ordenando a USP a reestabelecer a matrícula do jovem.

O reitor da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior, disse que pretende alterar o sistema de heteroidentificação de candidatos às vagas de cotas raciais da instituição, realizando as entrevistas com os candidatos apenas de forma presencial, para evitar distorções. Carlotti prevê que todas as entrevistas com os candidatos às vagas de cotas raciais passem a ocorrer de forma presencial, e não mais virtual com feito hoje. Ele avalia, inclusive, pagar as passagens para os candidatos que moram longe de São Paulo.