A Justiça do Trabalho condenou a Uber a registrar em carteira todos os seus motoristas ativos e os que vierem a trabalhar na plataforma, além de pagar multa de R$ 1 bilhão por danos morais coletivos. A decisão, emitida nesta quinta-feira (15/09) pela 4ª Vara do Trabalho de São Paulo, é assinada pelo juiz Mauricio Pereira Simões e tem abrangência nacional.

A plataforma informou que irá recorrer da decisão e que não irá adotar nenhuma das medidas exigidas pela sentença antes que todos os recursos sejam esgotados.

Na sentença é resultante de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho em São Paulo (MPT-SP). O MPT afirma que recebeu denúncia da Associação dos Motoristas Autônomos de Aplicativos (AMAA) sobre as condições de trabalho dos motoristas.

“Condeno a Ré [Uber] a obrigação de fazer, qual seja, observar a legislação aplicável aos contratos firmados com seus motoristas, devendo efetivar os registros em CTPS digital na condição de empregados de todos os motoristas ativos, bem como daqueles que vierem a ser contratados a partir da decisão, sob pena de multa diária de R$ 10 mil para cada motorista não registrado”, diz o texto da decisão.

Segundo a sentença, a plataforma digital deverá registrar os motoristas apenas após o trânsito em julgado da ação, ou seja, após o julgamento de todos os recursos. “A obrigação de fazer deverá ser cumprida no prazo de 6 meses, a contar do trânsito em julgado e intimação para início de prazo”, diz a sentença.

Relação de emprego

O MPT-SP ajuizou ação civil pública em novembro de 2021 solicitando à Justiça o reconhecimento do vínculo empregatício entre a empresa de transporte e seus motoristas. O Ministério Público do Trabalho afirmou que teve acesso a dados da Uber que demonstrariam o controle da plataforma digital sobre a forma como as atividades dos profissionais deveriam ser exercidas, o que configuraria relação de emprego.

O juiz do Trabalho acatou, na decisão, o argumento do MPT. “O poder de organização produtiva da Ré [Uber] sobre os motoristas é muito maior do que qualquer outro já conhecido pelas relações de trabalho até o momento. Não se trata do mesmo nível de controle, trata-se de um nível muito maior, mais efetivo, alguns trabalhando com o inconsciente coletivo dos motoristas, indicando recompensas e perdas por atendimentos ou recusas, estar conectado para a viagem ou não”.

Segundo o coordenador nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret) do MPT, Renan Kalil Bernardi, o processo que resultou na decisão é de grande importância para o debate sobre o tema no Brasil, em razão de revelar a dinâmica do trabalho via plataformas digitais. “A ação demandou análise jurídica densa e, sem sombra de dúvidas, o maior cruzamento de dados da história do MPT e da Justiça do Trabalho”, destacou.

Recurso

“A Uber esclarece que vai recorrer da decisão proferida pela 4ª Vara do Trabalho de São Paulo e não vai adotar nenhuma das medidas elencadas na sentença antes que todos os recursos cabíveis sejam esgotados”, afirmou a plataforma.

A empresa disse também que a decisão causa “evidente insegurança jurídica”. “A decisão representa um entendimento isolado e contrário à jurisprudência que vem sendo estabelecida pela segunda instância do próprio Tribunal Regional de São Paulo em julgamentos realizados desde 2017, além de outros Tribunais Regionais e o Tribunal Superior do Trabalho”.

A Uber afirmou ainda ter convicção de que a sentença não considerou adequadamente o “robusto conjunto de provas produzido no processo” e que a decisão se baseou em posições doutrinárias “já superadas, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal”.

Jurisprudência contrária

Juristas ouvidos pela imprensa acreditam que a decisão será derrubada em outras instâncias, devido à jurisprudência majoritária contrária ao reconhecimento do vínculo trabalhista de motoristas de aplicativos.

“Essa decisão não vai se manter da forma como está depois de esgotados os recursos. Nos tribunais superiores, há com muitas decisões não reconhecendo o nível de emprego. E o valor da indenização é muito diferente dos padrões usados nos tribunais superiores”, afirmou ao jornal O Globo o professor de direito do trabalho da Fundação Getulio Vargas (FGV) e sócio da GBM Law Luiz Marcelo Gois.

md/cn (EBC, ots)