21/10/2024 - 10:00
O Tribunal Superior de Justiça britânico examina, a partir desta segunda-feira (21), em Londres, se a mineradora australiana BHP, alvo de pedidos de indenizações de quase 47 bilhões de dólares (267 bilhões de reais), é responsável pelo desastre ambiental de 2015 em Mariana, Minas Gerais.
Em um processo que pode prosseguir até março 2025, e que começou no Tribunal de Tecnologia e Construção, em Londres, a ‘High Court of Justice’ analisará o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, em 2015, pelo qual 620 mil vítimas reclamam a quantia de 36 bilhões de libras (US$ 46,8 bilhões) à BHP.
“Aqui, a justiça será feita e eles serão punidos por seu crime. Não acredito que isto aconteça no Brasil”, disse Ana Paula Alexandre, 49 anos, à AFP pouco antes do início do julgamento.
O marido dela, Edinaldo Oliveira de Assis, trabalhava na barragem e foi uma das 19 vítimas fatais da tragédia.
Ana Paula aguardava muito pelo julgamento, que começou nesta segunda-feira às 10h30 locais (6h30 de Brasília), porque afirma “não ter a impressão de ser ouvida no Brasil”.
O rompimento da barragem de Fundão (Mariana, Minas Gerais) aconteceu em 5 de novembro de 2015 e liberou mais de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos minerais altamente poluentes.
A lama percorreu 650 quilômetros pelo Rio Doce, atingiu o Atlântico, devastou localidades, matou 19 pessoas e deixou mais de 600 pessoas sem suas casas, devastando a flora e a fauna.
O povo indígena krenak está entre os mais de 620 mil participantes, além de 46 municípios, na ação coletiva, a maior apresentada na história judicial britânica.
Oito vítimas, que viajaram a Londres para acompanhar o início do julgamento, estavam nesta segunda-feira na entrada do tribunal.
Algumas delas, com trajes tradicionais, utilizaram um megafone para exigir “justiça para Mariana”.
“No Brasil, as mineradoras são muito poderosas e têm grande influência na política. Espero que a justiça seja feita aqui. No Brasil, não há remédio”, disse Gelvana Rodrigues, 37 anos, que perdeu o filho de 7 anos na tragédia.
A BHP está no alvo do processo porque é coproprietária, ao lado do grupo brasileiro Vale, da mineradora brasileira Samarco, que administra a barragem.
Na época da tragédia, a BHP tinha duas sedes globais, uma em Londres, que a empresa não mantém mais, e outra na Austrália, onde está registrado seu domicílio atualmente.
Em julho, BHP e Vale concordaram em pagar cada uma 50% das eventuais indenizações nos processos abertos no Brasil, Austrália, Países Baixos e Reino Unido.
Em março de 2024, uma ação judicial foi apresentada nos Países Baixos contra a Vale e uma subsidiária holandesa da empresa, chamada Samarco Iron Ore Europe BV.
A BHP declara ser “consciente dos impactos” do desastre e afirma que mantém uma atitude “inabalável” no desejo de oferecer indenizações, mas ressalta que a ação britânica é “inútil”, por considerar que a questão “já está coberta” pelos processos no Brasil.
O grupo afirma que mais de 430 mil pessoas já receberam indenizações por meio da fundação Renova, que administra programas de indenização e reabilitação no Brasil, incluindo mais de 200 mil demandantes do julgamento em Londres.
“A maioria destes 200 mil recebeu apenas algumas centenas de libras”, disse Tom Goodhead, diretor do Pogust Goodhead, o escritório de advocacia londrino que defende os demandantes.
BHP e Vale elevaram na sexta-feira uma proposta de indenização global para 170 bilhões de reais (US$ 29,85 bilhões), com a esperança de encerrar a maior parte dos processos no Brasil. O valor ainda está em negociação.
“Não aceitei nenhuma indenização no Brasil”, afirmou Ana Paula Alexandre, que perdeu o marido na tragédia.
“Nenhuma quantia substituiria o que perdi. Mas o que me ofereceram estava longe de ser suficiente”, acrescentou.
Se o julgamento em Londres prosseguir até março, a decisão não deve ser anunciada antes do segundo trimestre de 2025, acredita a BHP.
Caso a responsabilidade da BHP seja reconhecida, outro julgamento será convocado, provavelmente no final de 2026, para avaliar o valor a ser pago a cada demandante.
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