O favoritismo do advogado-geral da União, Jorge Messias, à indicação do presidente Lula (PT) para a vaga aberta no STF (Supremo Tribunal Federal) com a aposentadoria antecipada do ministro Luís Roberto Barroso guarda similaridades e diferenças em relação à chegada de André Mendonça à corte, pelas mãos de Jair Bolsonaro (PL), em 2021, conforme juristas ouvidos pela IstoÉ.
A expectativa é de que o petista oficialize sua decisão nos próximos dias, dando fim à articulação de lideranças do Congresso pela candidatura do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), confirmando a preferência por nomes de sua estrita confiança para o cargo e, em caso de aprovação no Senado, garantindo o segundo evangélico do atual colegiado — ao lado do próprio Mendonça.
O ‘terrivelmente evangélico’
Em julho de 2021, Bolsonaro confirmou a promessa de campanha de levar ao Supremo alguém “terrivelmente evangélico” com a indicação de André Mendonça, que chefiou a Advocacia-Geral da União em duas oportunidades durante seu mandato e, no intervalo, foi ministro da Justiça.
Pastor da Igreja Presbiteriana de Pinheiros, Mendonça contou com a campanha de lideranças pentecostais influentes no governo, como Silas Malafaia, presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo (que ameaçou “queimar” o então presidente no mundo evangélico caso essa não fosse sua escolha), mas se cacifou ao conquistar a confiança do mandatário de que seria uma voz dissonante no colegiado.

Bolsonaro ao lado de André Mendonça, hoje ministro do Supremo: indicação incentivada por Malafaia
Bolsonaro sempre viu o STF com antipatia e, mais do que um evangélico — que a corte havia tido apenas uma vez na história, com Antônio Martins Villas Boas, nomeado em 1957 –, buscava um magistrado com quem concordasse. “As pautas conservadoras estarão com ele. O ativismo judicial, acredito, não será aprovado porque esse pastor tem o poder de pedir vista no processo. É o freio que colocamos lá dentro“, disse em 2022.
O homem de confiança
Católico como o antecessor, Lula tem buscado melhorar a relação com os crentes (que são 26,9% da população) com o projeto de reeleição em vista e, sem falar em ministro “terrivelmente evangélico”, já fez menções à fé de Jorge Messias, seu principal interlocutor com o segmento, e reuniu-se com ele e o bispo Samuel Ferreira, da Assembleia de Deus de Madureira, em meio aos questionamentos sobre quem escolherá para o lugar de Barroso.
Recebi hoje em meu gabinete o bispo Samuel Ferreira, da Assembleia de Deus de Madureira, que estava acompanhado do deputado federal Cezinha Madureira.
Um encontro especial, de emoção e fé, compartilhado com o advogado geral da União, @jorgemessiasagu e a ministra de Relações… pic.twitter.com/ByEyH5Oj97
— Lula (@LulaOficial) October 16, 2025
O advogado-geral da União está no cargo desde o início do mandato, foi subchefe para assuntos jurídicos da Casa Civil na gestão Dilma Rousseff (PT) e sempre orbitou o petismo. No atual governo, subiu na escala de confiança do chefe pela atuação considerada firme em defesa do STF e passou perto da vaga que se abriu na corte com a aposentadoria de Rosa Weber, em 2023, mas acabou nas mãos de Flávio Dino.
Escolhas sob análise
Para Ana Olsen, professora do mestrado acadêmico de direito da Uninter-PR, a única proximidade que pode ser estabelecida entre os dois governos é a “praxe de indicar pessoas de confiança [ao Supremo]“. “Os presidentes têm uma tendência, neste modelo de escolha, de buscar um ministro alinhado dos pontos de vista de interpretação constitucional, não necessariamente em termos partidários”, disse à IstoÉ.
“Ao indicar Mendonça, no entanto, Bolsonaro teve uma intenção muito clara de levar valores evangélicos à corte, ainda que eles não devam interferir nas decisões de um magistrado. Mesmo que possa ser interpretada como um aceno ao eleitorado cristão, a possível escolha de Messias não dá margem, por suas credenciais e preparo jurídico, para essa percepção“, concluiu.

Lula ao lado de Messias: advogado-geral da União tem confiança do presidente
Rubens Glezer, professor de direito da FGV-SP (Fundação Getulio Vargas) e coordenador do grupo de estudos Supremo em Pauta, da mesma instituição, divergiu. “Uma eventual confirmação de Messias é absolutamente semelhante à indicação de Mendonça. Ambas demonstram que, independentemente da ideologia do presidente da vez, as escolhas para o STF têm sido predominadas pela preocupação em manter uma espécie de garantia permanente de acesso à corte“, disse à IstoÉ.
Já Alessandro Soares, professor de direito constitucional do Mackenzie-SP, afirmou à IstoÉ que as indicações recentes de Lula refletem uma “preocupação com a defesa das instituições“. “Há uma procura por ministros que tenham um histórico de defesa institucional irrestrita e sem recuo, como é o caso do advogado-geral da União, para contextos em que a corte estiver sob ataque”, disse, lembrando que recentemente o Supremo julgou uma tentativa de golpe de Estado pela qual Bolsonaro foi condenado a 27 anos e três meses de prisão.
“Ambos [Messias e Mendonça] têm gabarito jurídico para ocupar o cargo, mas há uma distinção de partida com relação a uma indicação feita por um presidente [Bolsonaro] que atentou contra a Constituição”, concluiu.
Os indicados de Lula
— Cezar Peluso, em 2003 (aposentado em 2012);
— Ayres Britto, em 2003 (aposentado em 2012);
— Joaquim Barbosa, em 2003 (aposentado em 2014);
— Eros Grau, em 2004 (aposentado em 2010);
— Ricardo Lewandowski, em 2006 (aposentado em 2023);
— Cármen Lúcia, em 2006 (segue na corte);
— Carlos Alberto Menezes Direito, em 2007 (morto em 2009);
— Dias Toffoli, em 2009 (segue na corte);
— Cristiano Zanin, em 2023 (segue na corte);
— Flávio Dino, em 2024 (segue na corte).