O julgamento de um guatemalteco acusado de participar do assassinato, em 2020, do francês Benoît Maria, que realizava projetos de apoio a indígenas, começará na segunda-feira em Quetzaltenango, no oeste da Guatemala, sem que a motivação do crime tenha sido esclarecida.

Maria era diretor na Guatemala da ONG Agrônomos e Veterinários Sem Fronteiras (AVSF) e estava há mais de duas décadas apoiando comunidades indígenas maias em projetos agrícolas quando foi assassinado em 10 de agosto de 2020.

De 52 anos e conhecido por seus amigos como “Benito”, o francês dirigia uma caminhonete em uma estrada rural do povoado indígena de San Antonio Ilotenango, no departamento de Quiché, quando foi atacado.

O indígena Diego Tay comparecerá como acusado ao julgamento oral e público que será realizado em Quetzaltenango, segunda cidade mais importante do país, 200 km ao oeste da capital.

Estarão presentes a esposa da vítima e mãe de seus filhos, Anna Isern Sabria, que vive na Guatemala, assim como seus dois irmãos, Christophe e David Maria, vindos da França, junto com Frederic Apollin, o diretor-geral da AVSF.

“A família de Benoît Maria espera que os debates lancem luz sobre os motivos que levaram a esse assassinato”, afirmou à AFP, de Paris, a advogada Clémence Witt, que acompanha o caso na França ao lado de seu colega Alexandre Luc-Walton.

Segundo os advogados, está descartado um possível roubo.

A advogada comentou, por e-mail, em espanhol, que existe outro envolvido no crime por quem já se emitiu “a ordem de busca e prisão internacional (que) permita a prisão, o que poderia levar a um segundo julgamento”.

– Possível extorsão –

Em setembro de 2021, quando Tay foi preso, o Ministério Público apontou que uma das possíveis motivações do crime foi que Maria teria se negado a pagar um “direito de passagem” ou extorsão pela estrada comunitária. Mas as circunstâncias ainda não foram apuradas.

Witt disse que “a informação recolhida revelou que o acusado – membro do conselho municipal de desenvolvimento urbano e rural – pertencia a uma família que fazia parte de uma organização criminosa e frequentemente exigia somas importantes de dinheiro aos estrangeiros que circulavam pela localidade”.

A advogada indicou que os investigadores encontraram “objetos pessoais de Benoît Maria no interior do carro”, por isso que se “descartou imediatamente a hipótese de um latrocínio”.

Organizações de direitos humanos ressaltaram, em um comunicado, que o crime ocorreu uma semana depois que a máxima instância da Justiça ordenou o Estado a devolver terras aos indígenas xiles, apoiados pelo ativista, no município de Nebaj.

“Tendo em mente que Benoît Maria trabalhava como agente de direitos humanos, esse ponto pode ser debatido durante o julgamento”, acrescentou Witt.

Maria também participou da criação, em 2011, da Universidade Ixil em Quiché, dedicada ao conhecimento ancestral dos povos originários, entre outros projetos.

– Justiça francesa –

Segundo os advogados, a ONG segue de perto o processo e apoia a família de Benoît e o trabalho dos investigadores guatemaltecos e franceses.

Witt explicou que a Justiça francesa tem competência para investigar o caso devido à nacionalidade da vítima.

“Paralelamente às investigações na Guatemala, houve uma investigação preliminar na França e, em 24 de fevereiro de 2021, um juiz de instrução do tribunal de Paris foi nomeado”, afirmou.

As investigações realizadas na França permitem que suas autoridades judiciais recebam todos os elementos de prova reunidos na Guatemala e assegurem a possibilidade de um julgamento nesse país se for necessário.

A família de Maria e a AVSF se constituíram como partes civis no julgamento, e a Justiça francesa oferece apoio técnico às investigações guatemaltecas.

No momento do crime, o presidente francês, Emmanuel Macron, elogiou o “compromisso humanista, fraternal e solidário” de Maria, que, acrescentou, “foi covardemente assassinado”.

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