Uma juíza do Texas autorizou, nesta quinta-feira (7), o aborto a uma mulher que tinha uma gravidez que ameaçava sua fertilidade e sua vida, no primeiro caso desse tipo desde que, em 2022, a Suprema Corte americana eliminou o direito federal a esse procedimento.

“A ideia de que a senhora [Kate] Cox deseja desesperadamente ser mãe e que esta lei poderia fazê-la perder essa capacidade é chocante, e seria um erro judicial [não conceder seu pedido]. Assim, assinarei o pedido que será processado e enviado hoje”, disse a juíza Maya Guerra Gamble do distrito 459 do Condado de Travis, com sede em Austin, após escutar os argumentos em uma audiência virtual.

Kate Cox, de 31 anos e mãe de dois filhos, soube que seu terceiro bebê a caminho tem trissomia 18, uma condição genética que, de acordo com o processo contra o Texas, pode provocar aborto espontâneo, que o bebê nasça morto ou que sobreviva em difíceis condições por pouco tempo.

No Texas, o aborto é ilegal, e os requerentes alegam que as exceções médicas não são claras e deixam os médicos de “mãos atadas”. Por isso, Cox, com 20 semanas de gravidez, pediu a intervenção judicial por meio de um processo ao estado do Texas.

Seu caso é o primeiro do tipo desde que a Suprema Corte americana eliminou, em 2022, o direito à interrupção da gravidez em nível federal.

A juíza Maya Guerra Gamble, do Distrito 459 do Condado de Travis, com sede em Austin, ouviu os argumentos das partes em uma audiência virtual. “A ideia de que a senhora [Kate] Cox deseja desesperadamente ser mãe e que esta lei poderia fazer com que perca essa capacidade, é impactante e seria um erro judicial [não conceder sua solicitação]. Sendo assim, vou assinar o pedido que será processado e enviado hoje”, disse nesta quinta-feira.

Durante a audiência, Molly Duane, advogado do Centro de Direitos Reprodutivos (CRR, na sigla em inglês), que representa Cox, considerou que “a vida de Kate Cox e sua futura fertilidade correm um grande risco. E, segundo seu médico, o cuidado médico que ela necessita é um aborto”, afirmou.

Duane contou que no último mês Kate precisou ir quatro vezes à emergência do hospital, por complicações de saúde vinculadas à gravidez, e explicou que o que pediam era uma ordem judicial “que permita Cox ter acesso ao aborto que ela precisa agora para acabar com o seu sofrimento e proteger a sua fertilidade”.

Este estado conservador do sul dos Estados Unidos também tem uma lei que permite a qualquer cidadão processar outro que pratique ou auxilie em um aborto. Portanto, o processo de Kate também foi acompanhado por seu marido, Justin, para garantir que não será denunciado por ajudar sua esposa a fazer um aborto, assim como pela obstetra e ginecologista Damla Karsan, que disse estar disposta a atender Kate se o tribunal aprovar o procedimento.

– Consequências –

O CRR considerou que com esta decisão judicial, Cox ficará habilitada a realizar o aborto, o que planeja fazer em sigilo por razões de segurança.

No entanto, horas depois da decisão, o procurador-geral do Texas, Ken Paxton, enviou uma carta aos hospitais onde a doutora Karsan trabalha, para adverti-los das “implicações potenciais de longo prazo, se permitirem que esse aborto seja realizado em suas instalações”.

Segundo ele, a decisão da juíza Guerra Gamble, a quem chamou de “ativista”, “não eximirá os hospitais, médicos ou qualquer outra pessoa de responsabilidade civil e penal por violar as leis de aborto do Texas”. Paxton também questionou os procedimentos seguidos pela doutora para recomendar o aborto.

Os médicos do Texas declarados culpados de realizar abortos ilegais podem pegar até 99 anos de prisão, pagar multas de até 100 mil dólares (quase 490 mil reais) e ter suspensa sua licença profissional.

“O alarmismo tem sido a tática principal de Ken Paxton para fazer cumprir estas proibições do aborto. Ao invés de respeitar o Poder Judiciário, está deturpando a ordem do tribunal. Ataca a juíza, qualificando-a de ‘ativista'”, respondeu o advogado do CRR, Marc Hearron. Ele considerou que o procurador-geral quer “derrubar o sistema legal” para que Kate e as mulheres com casos similares “continuem sofrendo”.

Já o representante da Procuradoria-Geral do Texas, Johnathan Stone, disse que uma decisão favorável impediria o estado de “cumprir certas leis de aborto contra os demandantes devido à sua crença subjetiva de que a senhora Cox se qualifica para uma exceção médica”.

O CRR também lidera um processo em nome de 20 mulheres que tiveram o aborto negado, apesar de terem tido complicações similares às de Cox. Em alguns casos, seus filhos nasceram mortos ou sobreviveram a poucas horas após o nascimento. Quem pôde fazê-lo, viajou a outro estado onde o aborto ainda é legal.

Este caso está na Suprema Corte do Texas, que deve se pronunciar se as exceções são definidas de forma clara e se restringe algumas proibições ao aborto.

O Texas é um dos vários estados conservadores que declarou o aborto ilegal depois que, em junho de 2022, a Suprema Corte dos EUA anulou a decisão Roe v. Wade, que garantiu durante meio século a nível federal o direitos das mulheres de interromper suas gestações.

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