Seis jovens apresentaram uma ação judicial ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, na França, nesta quarta-feira, 27, contra governos da Europa, argumentando que eles não estão fazendo o suficiente para proteger a população das mudanças climáticas. Este é o maior caso de ação legal relacionada ao clima em todo o mundo e o primeiro deste tipo no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

Os ativistas climáticos movem a ação contra 32 países – que incluem os 27 países membros da União Europeia, o Reino Unido, a Suíça, a Noruega, a Rússia e a Turquia. Eles, que têm entre 11 e 24 anos de idade e não procuram compensação financeira, argumentam que os seus direitos humanos fundamentais, como à vida, à privacidade e à vida familiar, e à liberdade de discriminação, estão sendo violados.

Os ativistas afirmaram que as alterações climáticas afetam a sua vida cotidiana e os seus estudos, e prejudicam o seu bem-estar físico e psicológico. Eles deram início à ação judicial após uma série de incêndios florestais mortais no centro de Portugal em 2017, onde vivem quatro deles.

“Estão 43°C num dia, e no outro é granizo, e isso é perigoso porque não podemos prever o que vai acontecer”, disse André Oliveira, de 15 anos, acrescentando que a onda de calor que atingiu Portugal em May atrapalhou seus trabalhos escolares.

As equipes jurídicas dos países questionaram a admissibilidade do caso, bem como a alegação de que os demandantes são vítimas dos danos causados pelas alterações climáticas. Sudhanshu Swaroop, advogado do Reino Unido, disse que os governos nacionais compreendem a ameaça das alterações climáticas e os seus desafios e estão determinados a enfrentá-los através da cooperação internacional.

Swaroop disse que os demandantes deveriam ter passado primeiro pelos tribunais nacionais e destacou que, uma vez que não são cidadãos dos países que atacam, com exceção de Portugal, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos não pode ter jurisdição. “Não houve nenhuma tentativa por parte dos requerentes de invocar, muito menos de esgotar os recursos internos”, concordou Isabelle Niedlispacher, especialista jurídica da Bélgica.

Embora já houve casos bem sucedidos relacionados ao clima em níveis regionais e nacionais, a equipe jurídica dos ativistas disse que, porque jurisdições nacionais não foram longe o suficiente para proteger seus direitos, o grupo se sentiu compelido a levar a questão ao tribunal europeu.

“Apresentamos evidências que mostram que está dentro do poder dos estados fazer muito mais para ajustar suas emissões, e eles estão optando por não fazer isto”, disse o advogado Gerry Liston à Associated Press.

As decisões do tribunal são juridicamente vinculativas para os países membros e o incumprimento delas torna as autoridades responsáveis por multas pesadas decididas pelo tribunal. “Este julgamento funcionaria como um tratado vinculativo imposto pelo tribunal aos réus, exigindo-lhes que acelerassem rapidamente os seus esforços de mitigação climática”, disse Liston. “Em termos legais, seria um divisor de águas.

Liston disse que uma decisão a favor do grupo também ajudaria futuros casos climáticos julgados a nível nacional, fornecendo orientação aos tribunais nacionais. Para isso, os jovens terão de convencer os juízes de que foram suficientemente afetados para serem considerados vítimas.

Em representação de Portugal, o advogado Ricardo Matos questionou o “estatuto de vítima” dos jovens, argumentando que não estabeleceram uma ligação direta entre as emissões dos estados e os danos sofridos por causa dos incêndios florestais no seu país. Matos insistiu que, como as alterações climáticas têm impacto em todos, ninguém deveria ter o estatuto de vítima.

O grupo também terá de provar aos tribunais que os governos não tem cumprido o objetivo limitar o aquecimento global a 1,5°C, em linha com os objetivos do acordo climático de Paris de 2015.

“A UE está indo além das obrigações do Acordo de Paris”, afirmou Daniel Calleja Crespo, diretor do serviço jurídico da Comissão Europeia, citando o objetivo da UE de reduzir as emissões líquidas de gases com efeito de estufa em pelo menos 55% até 2030, e o objetivo de alcançar a neutralidade climática até 2050, onde a maior parte das emissões são cortados e os restantes são cancelados.

O mundo está longe de limitar o aquecimento a 1,5°C, dizem os cientistas, com as temperaturas médias globais projetadas para aumentarem entre 2 e 4°C até 2100, de acordo com as atuais trajetórias de aquecimento e planos de redução de emissões.LS