28/07/2024 - 11:41
A mineira Carolina Arruda, de 27 anos, que sofre de neuralgia do trigêmeo bilateral — condição que a garante a “pior dor do mundo” —, foi operada novamente no sábado, 27. Dessa vez, para a implantação de eletrodos neuroestimuladores que contêm a transmissão nervosa da dor ao cérebro.
O procedimento aconteceu em Alfenas, Minas Gerais, e durou cerca de seis horas. Quatro médicos e um cirurgião bucomaxilo atuaram na cirurgia.
“A cirurgia foi muito bem realizada. Ela seguiu todo o planejamento certinho. Embora tenha sido demorada, aconteceu sem surpresas”, garantiu Cristiano Assunção, cirurgião bucomaxilofacial, em seu Instagram.
Antes da cirurgia, estudante de veterinária se disse esperançosa, apesar de não querer criar expectativas. “Existem outras opções caso essa não dê certo, mas ainda não desisti da ideia da eutanásia”, pontuou a jovem, acrescentando que colocou a opção como um “plano B” para tentar outras possibilidades.
Em julho deste ano, Carolina, natural de Bambuí (MG), abriu uma vaquinha para arrecadar fundos no intuito de viajar a outro país para realizar a eutanásia — prática proibida no Brasil em que a morte indolor é proporcionada a um paciente para aliviar o sofrimento de uma doença incurável ou dolorosa. A meta é de R$ 150 mil e, até o momento, foram angariados R$ 137,4 mil.
Como funciona o tratamento com neuroestimuladores?
Segundo a estudante, o tratamento envolve o implante de neuroestimuladores na medula espinhal e acima de um gânglio do trigêmeo dos dois lados da face. A função do equipamento é emitir uma “anestesia” no nervo para controlar as dores. Em caso de falha ou funcionamento parcial do procedimento, Carolina explica que também há outras possibilidades.
Possibilidades de tratamento
“A segunda opção que temos para recorrer é o implante de uma bomba de morfina. Ela vai soltando e liberando morfina de forma controlada e eu tenho recurso de apertar um botão em um controle remoto”, conta a mulher. O uso de tal método, segundo Carolina, evita que ela tenha de ir a hospitais com tanta frequência.
Além disso, a estudante pode realizar um procedimento já feito por ela em que ocorre uma descompressão microvascular da estrutura responsável pela dor. Ainda, a mineira tem a possibilidade de realizar uma cirurgia considerada como muito arriscada para “desconectar” o nervo do trigêmeo do cérebro.
Na Santa Casa de Alfenas, a mineira informou que uma ressonância magnética determinou o ponto exato do conflito entre uma artéria na base do cérebro e o nervo do trigêmeo, contato que causa a condição.
Carolina Arruda também declarou que conseguiu contribuir com o tratamento gratuito da neuralgia do trigêmeo para outras 50 pessoas com a repercussão de seu caso.
Relembre o caso
Nas redes sociais, a mulher compartilha sua rotina com a enfermidade. Após a viralização do caso, Carolina pediu mais respeito à sua decisão e a seus familiares. “Eu agradeço a preocupação de todo mundo e a esperança que vocês têm, mas eu quero esclarecer que já passei por inúmeros tratamentos […] Para aqueles que dizem que minha doença é falta de Deus, peço que respeitem minha jornada. Não é falta de fé”, declarou a mineira.
Em outro vídeo, Carolina relatou que seu caso é muito raro e não deveria servir como referência a outros pacientes que sofrem com neuralgia do trigêmeo. “A maioria das pessoas respondem bem aos tratamentos disponíveis […] A eutanásia não é a única saída”, explicou.
O que é a Neuralgia do Trigêmeo
De acordo com Vinícius Boaratti Ciarlariello, neurologista do Departamento de Pacientes Graves do Hospital Israelita Albert Einstein, a doença é caracterizada por dores excruciantes na região da face que seguem o trajeto de um nervo conhecido como trigêmeo, que vai da orelha ao meio do rosto e está presente nos dois lados da cabeça. “Ela (dor) definitivamente é uma das piores que existem e têm caráter de choque ou queimação, acontecendo diversas vezes ao longo do dia”, explica o médico.
No caso de Carolina, por ser bilateral, a enfermidade afeta os dois lados da face.
Segundo o especialista, as crises podem ser desencadeadas por movimentação da boca ao falar ou comer, presença de alimentos gelados, ato de escovar os dentes e até por um toque na face. “Não há uma causa única para esta condição, podendo ser secundária a uma série de outras doenças”, pontua Boaratti.
Segundo o médico, pode haver um conflito neurovascular em que um vaso sanguíneo entra em contato direto com o nervo e causam disparos similares a um curto-circuito. As causas também podem incluir lesões no trigêmeo ou em alguma parte do cérebro, doenças inflamatórias de meninges e nervos e doenças autoimunes como a Esclerose Múltipla.
Diagnóstico
“O diagnóstico da doença é clínico e deve ser feito através de consulta médica com neurologista, associado a investigação complementar de exames de imagem do cérebro e, em alguns casos, com coleta de líquido cefalorraquidiano [fluido que ocupa parte do encéfalo]”, explica Boaratti, acrescentando que qualquer neurologista pode realizar o diagnóstico, mas determinados pacientes podem necessitar de um especialista em dor.
Tratamento
De acordo com o neurologista, a doença não é curável na maioria dos casos, mas as dores do paciente podem ser controladas a partir de medicamentos ou cirurgias. Apesar disso, não é incomum pessoas com a condição voltarem a ter tais sensações intensas em algum momento futuro.
“De forma geral, o tratamento se baseia no uso de medicamentos contínuos que controlam o disparo inapropriado do nervo e as vias centrais da dor”, esclarece Boaratti, acrescentando que procedimentos cirúrgicos podem ser realizados para tentar controlar a enfermidade. “É importante salientar que os pacientes submetidos a cirurgias ainda podem continuar com dor, e que não os faria necessariamente deixar de usar medicamentos.
Realidade com a dor
Na sua página da arrecadação, Carolina relatou que, durante crises de dor, já tentou suicídio duas vezes, devido a intensidade da sensação. “Infelizmente, a depressão que eu enfrento é decorrente de anos vivendo com dores crônicas e, por isso, não pode ser curada”. Segundo a mulher, a doença é tão severa que se torna impossível realizar tarefas diárias simples ou manter relacionamentos.
Depois de todas as opções médicas se esgotarem, Carolina optou por realizar a eutanásia. Entretanto, o procedimento só poderia ser realizado na Suíça. “A estimativa é que o total necessário, incluindo os custos de viagem e médicos, ultrapasse os R$ 150 mil”, explicou a mulher.