O historiador e jornalista paulistano Jorge Caldeira, de 62 anos, está vivendo o que ele chama de a fase de maior sucesso em uma carreira de mais de 30 anos, durante a qual vasculhou eventos e personagens do Brasil. O êxito se deve à “História da Riqueza no Brasil — Cinco Séculos de Pessoas, Costumes e Governos”, lançada em outubro pela Estação Brasil. O título permaneceu por quatro semanas nas listas dos mais vendidos e acaba de chegar à quarta edição, atingindo uma tiragem total de 30 mil exemplares.

“Descobri que tinha leitores atentos e que minhas ideias eram levadas em conta”, afirma Caldeira a ISTOÉ. “Pela primeira vez, estou sendo convidado para palestras em todos os cantos.” Ele nota que as pessoas sentem necessidade de referências racionais em um momento conturbado da história do País. “O livro é um resumo do meu trabalho. Talvez faça sucesso por ter sido escrito em linguagem não acadêmica.” O motivo do êxito vai além da leitura saborosa. O estudo altera noções adquiridas sobre a evolução econômica do país. Segundo o jurista Celso Lafer, a abordagem terá repercussão também no meio acadêmico: “É uma revolução copernicana na análise e interpretação da história do Brasil”.

Alterar a história é uma questão de tempo, assim como a forma de narrá-la. Consciente desse fato, Caldeira conta que se libertou lentamente dos obstáculos da pesquisa e do impressionismo característicos dos historiadores clássicos. Aprendeu a usar métodos e softwares que o ajudaram a subverter mitos e explicações acumuladas por várias gerações de estudiosos do assunto. Apoiou-se na antropologia e na econometria, a análise quantitativa da vida econômica. “É preciso mudar a interpretação da história do Brasil porque a base de dados disponíveis mudou”, afirma.“Os historiadores antigos não tinham culpa de ser imprecisos. Hoje o pesquisador têm acesso a informações que eles nem sonhavam em possuir.”

Encalhados

Com novas ferramentas, Caldeira derrubou “verdades”. Sobre o período colonial, afirma que o Brasil não gerava riqueza com os escravos e a exportação de produtos agrícolas — e não dependia da metrópole, ao contrário do que ensinaram os mestres da área. “O Brasil tinha uma economia mercantil baseada na propriedade familiar, em que os escravos eram usados de forma difusa”, diz. “As famílias observavam a ordem matriarcal indígena.” O Segundo Reinado como uma era próspera também cai por terra. “Foram anos de estagnação econômica quando a monarquia virou as costas para a revolução industrial”, diz. O tabu segundo o qual a República Velha (1889-1930) marcou um recuo econômico é igualmente falso. “Houve ma explosão econômica na Primeira República”, diz Caldeira. “E isso se deve ao fato da nova Constituição de 1891, na qual Ruy Barbosa liberou a livre-iniciativa.” A visão tradicional coincide com a sua no que se refere à Era Vargas e aos governos democráticos até a ditadura: “A centralização estatal produziu riqueza, sobretudo a industrial”, afirma. Da ditadura de 1964 em diante, os dados evidenciam períodos de atraso: “Os militares isolaram o País da globalização e não nos livramos desta situação, apesar dos esforços. Os números informam que continuamos encalhados.”