O início do terceiro governo Lula trouxe de volta ao seio da República algo de enorme importância simbólica: o respeito ao sincretismo religioso. O retorno do quadro Orixás, da pintora brasileira Djanira da Motta e Silva, à parede do Salão Nobre do Palácio do Planalto (ele foi retirado em 2019) demonstra que a nova administração tem uma visão de que é necessário ter respeito por todas as religiões existentes no Brasil.

A pintura é uma bela homenagem a divindades do candomblé e a ordem para a sua remoção foi da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro que, assim como o ex-presidente, é “terrivelmente evangélica” e jamais proferiu uma só palavra respeitosa sobre as religiões de matriz africana. A decisão de recolocar a pintura em seu devido lugar foi da atual primeira-dama, Rosângela Lula da Silva, a Janja. A socióloga, aliás, ordenou mudanças, inclusive, no Palácio da Alvorada. O casal presidencial, por enquanto, não está morando na residência oficial. Entre os motivos, está a preocupação com o estado de conservação dos elementos no interior da futura moradia. E é nesse ponto que ela tem demonstrado ter olhos de lince por perceber detalhes no Palácio que necessitam de atenção urgente: danos nos estofados, paredes que precisam de nova pintura e móveis que têm de ser reformados ou trocados. Janja pontuou, e, com razão, que nos últimos quatro anos faltou zelo com as coisas do Palácio da Alvorada.

Não é a primeira vez que um governo faz da obra de arte Orixás alvo de seu racismo religioso. O ditador Ernesto Geisel, luterano, que exerceu a Presidência entre 1974 e 1979, fez com o quadro o que, na época, os militares faziam com gente: “desapareceu” com a tela. Coube a antropóloga e, naquele momento, também primeira-dama, dona Ruth Cardoso, devolver a obra à parede da sede do poder Executivo. Agora, o salutar cuidado de Janja com as diversas religiões no País, é demonstrado com apenas um gesto: recolocar Orixás em exibição é uma ação positiva para toda a Nação. Eleva o debate nacional e traz à tona o que já deveria ter sido compreendido por todas as esferas de poder: a religiosidade está na base da formação nacional e as muitas etnias que aqui se constituíram têm a sua própria fé, e é dessa forma que devem ser respeitadas.