Quem vê Jackie, do chileno Pablo Larraín, se impressiona com o perfeccionismo de Natalie Portman. Comparando-se às imagens de Jacqueline Kennedy disponíveis (algumas no YouTube), nota-se que Nathalie incorpora o gestual, o modo de andar, a voz e o ritmo de fala de Jackie; é tudo tão verossímil que raramente nos lembramos de que a semelhança física entre a primeira-dama e a atriz não é tão grande assim. Importa a interpretação e esta não é mero mimetismo.

E há a escolha de Pablo Larraín ao ingressar em terreno mítico da história recente dos Estados Unidos (os Kennedys foram o que mais se aproximou, nos EUA, de uma família real). Ele não se ocupa em traçar uma biografia em linha reta de Jacqueline; concentra-se num período preciso – e trágico – que vai do assassinato de John Kennedy até seu enterro.

É, por outro lado, um filme de bastidores. E balizado entre dois acontecimentos jornalísticos que têm Jacqueline como protagonista. Um é um programa de TV sobre a Casa Branca, de 1961, que tenta mostrar como a nova inquilina transforma a vetusta morada presidencial em um lar. É dirigido por Franklin J. Schaffner. O segundo é uma entrevista concedida por Jackie ao repórter Theodor H. White, em novembro de 1963. Ela suspeita que todas as perguntas têm por fim chegar ao foco real de interesse – o que ela viu e sentiu no momento em que o disparo atingiu o cérebro do marido naquele 22 de novembro de 1963 em Dallas, Texas.

Portanto, Jackie é, também, e de maneira sutil, um estudo sobre a nascente sociedade do espetáculo, através de uma de suas protagonistas. Jacqueline sabia da importância de apresentar a Casa Branca como um lar. Era, provisoriamente, o seu lar (uma de suas falas é “a primeira-dama deve estar sempre com as malas feitas”). Mas também o lar de todas as norte-americanas. Signo de humanização do poder, para um presidente tão midiático quanto Kennedy.

Jackie tinha essa consciência do espetáculo. Contra a opinião da segurança, bate o pé e consegue enterro digno de um rei. Em sua última batalha como primeira-dama, sabe que a solenidade da ocasião, viúva e filhos juntos do caixão, comporia uma imagem guardada pela História. O significado das cerimônias relaciona-se com o poder.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.