Dois meses e meio depois das eleições legislativas, o Movimento 5 Estrelas (M5E) e a ultradireitista Liga propuseram nesta segunda-feira (21) de forma conjunta o acadêmico Giuseppe Conte para chefiar o primeiro Executivo antissistema da Itália.

A proposta foi oficialmente apresentada ao presidente da República, Sergio Mattarella, que tem a competência, de acordo com a Constituição, de designar o primeiro-ministro, e surge depois de uma semana de negociações sobre o programa de governo estipulado entre os dois partidos ganhadores das eleições de 4 de março.

Conte, de 54 anos, um advogado e professor de Direito Privado, com uma prestigiosa carreira acadêmica, é uma personalidade sem experiência política, discreta e séria para representar uma nova era.

“É um momento histórico. Entregamos ao presidente o nome do candidato a primeiro-ministro”, anunciou Luigi Di Maio, o jovem líder dos antissistema, ao final de uma rápida reunião com Mattarella.

“Antes de nos criticar, deixem-nos começar”, pediu, dirigindo-se à imprensa, ao se referir às críticas feitas na Europa contra o programa antiausteridade aprovado no fim de semana pelas bases das duas formações.

Após ser recebido separadamente pelo presidente Mattarella, o líder da Liga, Matteo Salvini, de 45 anos, confirmou o nome de Conte como candidato no Facebook.

“Que ninguém tenha medo, ao contrário”, disse Salvini, ao tentar acalmar os mercados e a União Europeia (UE) por suas posições contra a imigração e fortemente eurocéticas.

“A Itália respeitará suas obrigações, os acordos, as normas, os vínculos, mas com a condição de crescer economicamente. A Itália vem primeiro”, acrescentou.

Conte, professor de Direito Privado em Florença e Roma, é especialista em justiça administrativa.

– O desafio de Conte –

Nascido em 1964 em Volturara Appula, minúscula localidade de 500 habitantes na região de Pulla (sul), Conte havia sido apresentado antes das legislativas de 4 de março pelo M5E como possível ministro encarregado de “desburocratizar” a administração pública.

Os dois líderes o consideram um “político” e não um técnico, apesar de não ter experiência neste setor.

Sem um partido por trás, terá que mediar, possivelmente, com duas personalidades poderosas: Di Maio, que segundo comentários quer ser o ministro do Desenvolvimento Econômico; e Salvini, que aspira à pasta do Interior.

Ao final de nove dias de reuniões, Di Maio e Salvini concluíram um acordo, validado por 90% de suas bases, e um “contrato de governo”, que prevê deixar para trás a austeridade e combater as determinações de Bruxelas.

Esta perspectiva preocupa os mercados financeiros: a bolsa de Milão fechou nesta segunda-feira em baixa de 1,5%, enquanto o spread – o diferencial entre as taxas da dívida italiana e a alemã com dez anos de prazo – subia lentamente, situando-se a 186 pontos, com um aumento de mais de 50 pontos em menos de uma semana.

Tanto Di Maio quanto Salvini eram candidatos para comandar este primeiro governo antissistema em um país fundador da União Europeia. Mas uma disputa feroz de egos e resultados individuais insuficientes nas legislativas os forçaram a eleger uma terceira pessoa para governar.

“Entramos em acordo sobre o chefe e os ministros de governo e esperamos que ninguém ponha um veto a esta escolha, que representa a vontade da maioria dos italianos”, advertiu no domingo Salvini, alfinetando os governos da França e da Alemanha, que reagiram com preocupação às mudanças políticas na Itália.

Apesar de não ter nenhuma chance, o líder do Forza Italia, o ex-premiê Silvio Berlusconi, que agora enfrenta Salvini, que foi seu aliado nas legislativas, se ofereceu para voltar ao poder.

O bilionário italiano, de 81 anos, que liderou a direita italiana durante 25 anos e acaba de recuperar sua elegibilidade após ser condenado por sonegação, não vê com bons olhos os capítulos do programa de governo comum sobre justiça e conflitos de interesse.

Mattarella também vai examinar o programa de governo acordado pelo M5E e a Liga, que promete crescimento, limitar a idade de aposentadoria, mão de ferro contra a corrupção e uma guinada em matéria de segurança, com um viés anti-imigração e anti-Islã.

Segundo pesquisa publicada no domingo pelo jornal La Repubblica, seis em cada 10 italianos são favoráveis a um governo Liga-M5E. Só um quarto dos eleitores pensa que este projeto vai fracassar.